Por Thiago Kistenmacher, publicado pelo Instituto Liberal
Tenho certeza de que você já ouviu alguém se referir negativamente aos altos salários recebidos pelos grandes jogadores de futebol. Por isso o presente artigo, além de fazer uma reflexão acerca desse “mimimi”, tem como finalidade auxiliar sua conversa com aquele chato que se acha super “do bem” ao criticar os salários dos craques.
Dado que estamos em época de Copa do Mundo, é comum que o assunto venha à tona. Assim, podemos dividir os sujeitos que criticam a remuneração dos jogadores em três personagens que compõem a tríade do “mimimi”: o desinformado, o “bonzinho” e o ressentido.
O desinformado é aquele que critica os salários dos jogadores porque acredita que ali há, de fato, uma injustiça. Ele não compreende porque trabalhadores braçais ganham menos; não entende a razão pela qual um médico ganha muito menos do que um semi-analfabeto que “só” sabe correr, driblar e fazer gols. Este, contudo, é aquele que, exatamente por ser desinformado, pode mudar de opinião ao entender a lógica do mercado, ou, claro, mesmo assim, talvez ele queira parecer “bonzinho” e continuar criticando.
O “bonzinho” é aquele que quer parecer ou realmente acredita ser “do bem”. Ele critica a cifra recebida pelos craques porque quer que os outros vejam como ele está preocupado com a África, com a Síria etc. Diz que os euros gastos em contratações milionárias poderiam acabar com a fome e seriam mais bem utilizados na construção de escolas e hospitais – e se ele fosse o dono da Nike ou da Coca-cola? Ele o faria? Duvido.
Este é do tipo que, num domingo à tarde em família, tenta suprir sua carência dizendo que acha um absurdo o valor investido no futebol. O “bonzinho”, em síntese, é um carente vaidoso.
O ressentido, por sua vez, é aquele que pode ou não entender o modus operandi do mercado. Não obstante, este é daquele que condena o pagamento dos jogadores porque não recebe o mesmo. É a pessoa que, caso tivesse a oportunidade, trocaria de vida com os jogadores sem pensar duas vezes. O ressentido não suporta que rapazes com pouco mais de vinte anos tenham um patrimônio que ele não conseguiria adquirir nem com cem encarnações e que “peguem” as mulheres que quiser. Por esse motivo o ressentido fala mal. Ele, logo, é a encarnação da frase “quem desdenha quer comprar”.
Apresentado os personagens, nos detenhamos agora nas “angústias” que fazem a tríade do “mimimi” maldizer a Copa do Mundo e o salário dos jogadores.
No que se refere ao desinformado, é importante que ele entenda que os jogadores não ganham o que ganham a partir do nada. Seus salários não são decididos por meia dúzia de burocratas como se o clube fosse uma estatal que não precisasse medir seus gastos. (Veja o artigo: Por que lixeiros e professores ganham menos que artistas e grandes jogadores de futebol )
Quando assistimos a um jogo de futebol, lá estão diversos anúncios de grandes empresas. Lá está a propaganda da marca de tênis que o desinformado muitas vezes veste para ir à academia; lá está o anúncio da operadora de celular que o desinformado contratou porque preza por uma comunicação de qualidade; lá está também a marca de refrigerante que ele adora; o banco no qual ele guarda seu dinheiro; a empresa pela qual ele voa nas férias; a universidade na qual estuda; seu plano de saúde; a marca do carro que dirige etc. E assim como ele, há milhões que usufruem dos mesmos serviços.
Assim, se você é alguém que acha “injusto” que os jogadores recebam o que recebem, pare para pensar na receita que eles geram. Se você pensar logicamente, vai ver que não há como ser diferente. Portanto, não é preciso indignar-se. Se os jogadores ganham o que ganham, não é sem razão. Ademais, se eles recebem milhões, seus patrocinadores empregam milhões; esses empregados, por sua vez, contratam outros serviços que contratam outros serviços que contratam outros serviços… E assim numa cadeia infinita. No fim todo mundo sai ganhando.
No que tange ao personagem “bonzinho”, mais efetivo do que suas críticas aos salários dos jogadores, seria ele entender que o mercado do futebol faz mais pelos meninos das periferias do que os movimentos “sociais” de classe média que ele apóia. O mercado futebolístico, preocupado com o lucro que o “bonzinho” tanto condena, não quer saber se o jogador é negro ou se nasceu numa comunidade pobre. Aliás, se dependesse do “altruísmo” desse “bonzinho” esses rapazes jamais iriam a uma Copa do Mundo nem conheceriam a riqueza.
Afinal, como já ressaltado por Fernando Holiday (https://www.youtube.com/watch?v=wGqpx1q4wnY), em projetos desse tipo de “bonzinho” o negro e o morador de periferia sempre estão lá “com seu Black Power pichando muro”, como se ser negro implicasse necessariamente em cantar rap e dançar break.
O “bonzinho” também não leva em consideração a quantidade enorme de projetos filantrópicos financiados pelos próprios jogadores milionários sem qualquer obrigação.
Relativamente ao ressentido, é importante que ele entenda que não está sozinho. Como ele existe milhões. Dessa forma, extremamente angustiado porque não pode andar de carro de luxo, morar em mansão nem sair com as mulheres com as quais os jogadores saem, ele pode, quem sabe, aproveitar a oportunidade para tentar gerar mais receita do que aqueles jogadores “ignorantes”. Ou, claro, pode também apelar para medicamentos, caso não suportar sua pequenez. No entanto, não é impossível que esses medicamentos tenham sido produzidos ou distribuídos por uma farmacêutica que patrocine algum time nacional, jogador ou seleção de Copa do Mundo. E aí, como faz?
Antes de terminar, cabe um esclarecimento: é evidente que no futebol também há falcatruas, esquemas de conspiração, conluios pérfidos etc. E aqui não estou me referindo aos elefantes brancos feitos na Copa do Mundo do Brasil. O foco é sobre o salário dos jogadores, só isso. E outra: não sou inocente para crer que as transações internacionais e seus contratos milionários sejam de todo imaculados. Todavia, se estes são pontos obscuros aos quais dificilmente teremos acesso, com a tríade aqui abordada é diferente. Duvido muito que, em relação à Copa do Mundo e aos salários dos jogadores, o leitor nunca tenha se deparado com um desinformado, com um “bonzinho” ou com um ressentido.