Por João César de Melo, publicado pelo Instituto Liberal
Foro privilegiado, caixas exclusivos para idosos, auxílio passagem, aposentadoria com menos de 65 anos, prioridade nos estacionamentos de órgãos públicos, licença maternidade, cartão corporativo, 13° salário, auxílio telefone, Bolsa Família, super-salários, meia entrada no cinema, acúmulo de salários, Lei Rouanet, estabilidade de emprego, carros oficiais, abono de férias, apartamentos funcionais, indenização por demissão sem justa causa, pensão vitalícia… Tudo isso são direitos adquiridos.
Além de alimentação, moradia e educação, a constituição brasileira promete a todos os cidadãos o direito à saúde. Não importa seu estilo de vida. Não importa seu hábito alimentar. Não importa a herança genética. O estado se compromete a lhe oferecer saúde.
Em 2010, foi aprovada a PEC da Felicidade de autoria de Cristóvão Buarque, que inclui na constituição o direito à felicidade. Sim, o estado também se compromete a nos fazer pessoas felizes.
Entende-se como “direitos” um conjunto de palavras reunidas num papel que dizem que todo cidadão, apenas por existir, deve ter sua dignidade garantida por terceiros. Não importa a história, o caráter e o merecimento de cada um. Se fulano existe, fulano merece casa, comida e ser feliz. O estado existe para viabilizar isso, porque só ele é capaz de saber o que as pessoas precisam – é o que tentam nos fazer crer.
O governo promete tudo a todos sabendo que não pode cumprir, mas sabendo também que a expectativa do cumprimento dessas promessas faz com que o povo conceda cada vez mais poder e pague cada vez mais impostos, criando o ambiente perfeito para que políticos e burocratas concedam a si mesmos todo tipo de privilégio.
Para cada direito criado, cria-se também um órgão para administrá-lo e distribuí-lo. Para cada órgão, criam-se dezenas, centenas, milhares de cargos; e para coordená-los, criam-se diretorias, secretarias e ministérios. Prover a felicidade das pessoas é uma grande responsabilidade, portanto, nada mais justo do que agraciar os funcionários desses órgãos com alguns privilégios e seus chefes com gordos salários. Tudo isso para mover a máquina que tira dinheiro de todas as pessoas para devolver uma fração desse dinheiro para as mais pobres. Eis o estado.
Mesmo que muitos dos “direitos” não estejam devidamente amparados na lei e sejam vistos como absurdos, a simples concessão lhes torna indissolúveis do ponto de vista dos beneficiários. A intenção de retirá-los causa insatisfações coletivas que limitam qualquer modernização da relação estado-sociedade.
Quase 1,5 milhão de cadastros do Bolsa Família são irregulares, mas se Michel Temer ou qualquer outro presidente reduzir o programa, será acusado de tirar direitos adquiridos pelos mais pobres.
Ao longo dos 13 anos de governo petista, foram criados mais de 107 mil cargos comissionados apenas na esfera federal, o que na prática significa mais de 107 mil militantes dos partidos que os nomearam, todos que agora se unem para garantir seus empregos como “direitos adquiridos”.
Quem terá interesse e coragem para demitir esse povo todo?
Na semana passada, o congresso concedeu aumentos de até 41% a certas categorias de servidores federais. Categorias que já desfrutavam de salários superiores aos do setor privado. Tais aumentos foram amparados pela constituição, seguindo a ideia de que toda categoria tem direito a reajustes periódicos independentemente da situação econômica do país. A partir disso, outras categorias exigirão reajustes semelhantes, afinal, elas também têm direitos. Todos têm direito porque algumas pessoas em Brasília decidiram que teriam. Mesmo procedimento que define o valor do salário mínimo, as leis trabalhistas, as regulações do mercado, os direitos das mulheres, dos gays, dos negros, dos jovens, dos viciados em crack, dos delinquentes etc. Quem mudará isso? Aliás: a sociedade quer que alguém mude isso? Não.
O fato é que a sociedade espera que um milagre faça as contas fecharem todos os anos, com todos vivendo à custa de todos; e ninguém confessa que vive tentando adquirir do governo um direito maior, raramente assumido como privilégio.
A maior parte das pessoas que reclama dos altos salários dos parlamentares aceitaria sem pudor privilégios semelhantes.
O PT transformou em direitos adquiridos tantos os programas sociais quanto os programas de incentivo à economia.
A Previdência Social está quebrando o país. Todos sabem que o atual formato não se sustenta, mas Michel Temer terá coragem de propor uma reforma realmente eficiente? Se tiver, quantos deputados terão coragem para aprová-la? Por mais necessário que seja, sindicatos e partidos de extrema-esquerda permitirão?
Sejamos francos: o Brasil é um país condenado.
Aos olhos da grande maioria da população, político bom é aquele que diz que todos têm direito a tudo e político ruim é aquele que manda a pessoa trabalhar.
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