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Desde o fim de março, quando assumiu o comando do estado, Francisco Dornelles prefere se definir como “interino”. Porém, após críticas vindas dos próprios aliados de que estaria engessado na função, o governador em exercício anunciou na quinta-feira um plano para reduzir gastos e gerar receitas que amenizem a crise estadual, chamada por ele de trágica. Entre as medidas antecipadas, estão a migração de até dez UPAs controladas por organizações sociais para a Fundação Estadual de Saúde, cortes de até oito secretarias (começando pela fusão da pasta da Fazenda com a do Planejamento) e a venda de dois mil imóveis do governo, inclusive o Palácio de Brocoió, na ilha de mesmo nome, na Baía de Guanabara. Defensor de privatizações, Dornelles quer ainda fazer concessões para a iniciativa privada das redes de água e esgoto de áreas hoje exploradas pela Cedae na Barra, em Jacarepaguá e bairros da Zona Sul. O anúncio foi feito durante visita do governador ao GLOBO.

Sereno, Dornelles adotou um tom realista ao tratar do enxugamento da máquina administrativa. Adiantou que vai fazer um ajuste de até 30% no custeio e/ou nos cargos comissionados das secretarias, para chegar a uma economia de R$ 700 milhões anuais. Frisou que, com essas medidas, pretende aumentar a eficiência e a produtividade das pastas, mas que o valor terá pouco efeito diante do rombo de R$ 20 bilhões previsto para este ano nas contas públicas.

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Defensor de concessões e parcerias com o setor privado, Francisco Dornelles anunciou que pretende privatizar o abastecimento de água e o serviço de esgoto na região da Barra e na Zona Sul. Hoje, o saneamento nessas áreas é feito pela Cedae. Segundo o governador, se a decisão dependesse apenas dele, o sistema seria concedido imediatamente:

— O que puder ser privatizado vai ser privatizado, inclusive a Cedae. Nós temos a intenção de fazer um sistema de concessão, transferindo para o setor privado a distribuição de água e a exploração de esgoto na Barra e na Zona Sul.

No entanto, Dornelles reconheceu que o “martelo não está batido” nem na cúpula do governo nem na própria Cedae:

— Eu estou dizendo que é o caminho que eu queria seguir. Tem posições muito contrárias a esta, sob o fundamento de que a receita que a Cedae recebe para a exploração da água na Barra e na Zona Sul é importante para que ela possa fazer realmente investimentos em áreas mais pobres do Rio, como a Baixada Fluminense. Contudo, acho que muitas vezes o que receberíamos, caso a concessão fosse feita, daria para fazer investimentos nessas áreas com mais eficiência. Se dependesse de mim, faria isso hoje — ressaltou.

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Infelizmente, no Brasil as coisas são assim: só andam na direção certa quando há crise e faltam alternativas. Como o Brasil é um país com mentalidade predominante de esquerda, estatizante, antiliberal, as privatizações raramente são feitas por convicção ideológica, e sim por necessidade de caixa. Whatever. O importante é transferir a gestão para a iniciativa privada, mais eficiente.

No caso do saneamento, isso é possível. Há exemplos mundo afora, e no próprio Brasil. Foi tema do meu Privatize Já, quando mencionei o caso de Niterói:

O setor de saneamento básico é visto por quase todos como uma típica função estatal. Entretanto, cerca de 10% dele é operado por empresas privadas no Brasil. O melhor exemplo de saneamento básico privado é a cidade de Niterói, no Rio de Janeiro.

Desde 1999, o saneamento da cidade é administrado pela Águas do Brasil. Em uma década de gestão privada, a posição da cidade passou de 79º para o 9º lugar no ranking organizado pelo instituto Trata Brasil, com base nos dados do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS).

Quando o grupo assumiu o serviço, apenas 70% da população tinha rede de água e 20% tinham rede de esgoto. Os dados mais recentes mostravam um salto para 100% e 90%, respectivamente.

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Os dados do censo feito pelo IBGE confirmam a tendência: o índice de saneamento da cidade teria saltado de 73% em 2000 para 87% em 2010. Nos próximos quatro anos, a empresa pretende investir R$ 700 milhões para universalizar o serviço de esgoto.

Por que tanta vontade em melhorar a cidade? Certamente não é porque seus diretores sonham com um mundo mais limpo, mas porque querem ganhar dinheiro. A empresa privada ganha mais se coletar mais esgoto. Como já está ficando repetitivo neste livro, essa lógica é bem diferente de uma estatal, em que diretores e proprietários vão ganhar a mesma coisa (ou até mais) se realizarem um serviço ruim. Assim como os empresários privados não são necessariamente bondosos por oferecer um bom serviço, os funcionários da estatal não são necessariamente pessoas malignas: apenas não enxergam incentivos para servir com rapidez.

A Companhia Estadual de Águas e Esgotos do Rio de Janeiro (Cedae), por exemplo, viu sua posição despencar no ranking de saneamento básico. De acordo com os dados do SNIS, o nível de atendimento da população fluminense por coleta de esgoto caiu da faixa de 82% em 2003 para 69% em 2009. A assessoria de imprensa da Cedae se recusou a comentar a queda, divulgada pelo jornal Valor Econômico em junho de 2012.

Em sua tese de mestrado na USP de 2005, Victor Toyoji de Nozaki analisou o setor de saneamento brasileiro. Para ele, “os resultados apresentados demonstram que os prestadores dos serviços de saneamento básico privados obtiveram uma performance melhor do que os públicos, tanto em questões administrativas, financeiras, operacionais e técnicas”. E mais: “são obtidas evidências de que a privatização está associada com uma significativa redução na mortalidade infantil”.

O fato é que o setor púbico não tem condições nem competência para investir o necessário neste fundamental serviço. Em 2009, a coleta de esgoto chegava a apenas 45% dos domicílios brasileiros e somente um terço dessa parcela é tratada, segundo dados do SNIS. Segundo os dados do censo do IBGE, a rede coletora de esgoto chegava a 56% em 2010, e o tratamento a 40% dos domicílios. É muito pouco mesmo assim. Mais da metade da população brasileira vive sem o básico da higiene.

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O dinheiro investido pelo governo no setor tem sido sistematicamente abaixo do necessário. Segundo especialistas, o governo tem investido a metade do que seria preciso para universalizar o serviço. Cálculos apontam para a necessidade de R$ 20 bilhões por ano em investimentos no setor, durante 15 anos, para resolver de vez o problema de coleta de esgoto.

Será inviável o governo atingir tais metas sem a participação da iniciativa privada. O pior é que a iniciativa privada precisa da licença estatal para operar o serviço. Logo, é preciso fazer concessões o mais rápido possível. Outros países mais desenvolvidos já foram por este caminho, abrindo espaço para maior participação privada no setor.

Vidas são perdidas todo ano e milhares ficam doentes por conta da falta de saneamento básico. Diarreias, disenterias, dengue, febre amarela, malária e leptospirose são algumas das doenças relacionadas à falta de rede de esgotos.

Para o cidadão, pouco importa se o serviço é prestado por uma estatal ou uma empresa privada de olho no lucro, desde que chegue até ele o tratamento do esgoto a um preço acessível. E, principalmente, que ele possa ter orgulho ao olhar para os rios de sua cidade.

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Quanto desperdício já poderia ter sido evitado se a privatização tivesse ocorrido? Quantas pessoas teriam saneamento básico decente se a Cedae fosse privada? Quantas pessoas evitariam doenças fatais? Enfim, o estado legou a gestão do saneamento para o esgoto! Já passou da hora de reverter esse quadro, salvar vidas, economizar recursos públicos. Privatize já!

Rodrigo Constantino