• Carregando...
Dos que amadurecem e dos que jamais avançam: FHC x Lula
| Foto:

Sou daqueles liberais que têm certa raiva dos tucanos, primeiro por serem confundidos com os liberais, algo que eles mesmos negam, já que são social-democratas de esquerda, mas não adianta perante a máquina de propaganda petista; segundo, por serem “educados” demais, “finos” demais e covardes demais com o PT, sem fazer uma oposição verdadeira a esse partido com DNA totalitário que tanto mal fez a nossa democracia.

Mas hoje é sexta-feira, acordei cedo e vejo um belo dia ensolarado lá fora, então vamos tentar ser o mais cordial possível com os tucanos. FHC acabou de ganhar um prêmio importante em Nova York, e ele até merece. Tirando seu grave erro de escolher deixar Lula “sangrar” em 2006 com o mensalão para que fosse derrotado nas urnas, não posso negar a postura de estadista que o ex-presidente tem tido nesses 13 anos longe do poder.

FHC soube ser discreto, passou a escrever artigos interessantes focando nos grandes temas, lutando pelo fortalecimento de nossas instituições republicanas. Nunca entrou na disputa infantil que o PT sempre fomentou, de “nós contra eles”, que enxerga o oponente como inimigo mortal. Mostrou-se mais preocupado em ver, de fato, um país mais maduro, com uma democracia mais sólida.

Enquanto isso, Lula nunca saiu do palanque, sempre circulou perto do poder, e jamais deixou de ser aquele velho agitador das massas. O contraste é chocante, e é o tema da coluna de Reinaldo Azevedo na Folha hoje. Se FHC ganhou temperança com a idade, Lula ainda parece aquele jovem rebelde e irresponsável que nunca foi capaz de olhar para os interesses nacionais de verdade – e nunca foi capaz também de superar suas duas derrotas humilhantes, em primeiro turno, para o próprio FHC.

A máquina de destruição de reputações do PT sempre esteve voltada para desconstruir a imagem do tucano, retratado como um elitista insensível para com os pobres. E aqui vem o pior, apontado por Reinaldo: “Ao longo de 12 anos, o PT elegeu como adversário preferencial o que havia de mais moderno nos tucanos: o seu viés –não mais do que viés– liberal. Cavalgando o jumento do nacional-estatismo, a companheirada satanizou à vontade os adversários, desmoralizou-os, acusou-os de inimigos dos pobres”.

Quem diz que o PSDB é liberal prova sua ignorância política, não sabe do que está falando. Em qualquer país desenvolvido do mundo os tucanos seriam vistos pelo que são: um partido da esquerda moderada, social-democrata. Mas foi esse singelo viés liberal, no fundo uma imposição das necessidades mais do que alguma convicção ideológica, que permitiu um legado positivo de sua passagem pelo poder.

Coisas que o simples bom senso aplaudiria, como a Lei de Responsabilidade Fiscal, as privatizações, a autonomia operacional do Banco Central com uma meta de inflação a ser perseguida, o câmbio flutuante, foram essas conquistas que marcaram favoravelmente o governo tucano. E justamente elas que foram demonizadas pelo PT como “neoliberais”. Os petistas condenam os tucanos pelo que eles têm de melhor!

Fernando Henrique foi um intelectual marxista, defensor da tese (esdrúxula) da dependência, depois se transformou num socialista fabiano, e por fim entendeu que era inócuo e equivocado tentar usar o estado para substituir os mercados. Ou seja, passou pela típica evolução das esquerdas europeias, como os trabalhistas britânicos liderados por Tony Blair. Continua sendo de esquerda e merecendo críticas dos liberais, mas evoluiu, deixou o velho ranço marxista para trás.

Já Lula é o mesmo de sempre, o velho “sapo barbudo”, como diria Brizola, que só sabe bradar bravatas populistas de cima de um palanque, usar os “movimentos sociais” seduzidos pelas verbas públicas para obstruir o progresso, fazer barulho. É um agitador das massas, um agitador irresponsável, que só consegue enxergar as próximas eleições e pensar na permanência no poder. Não conseguiu desenvolver nenhum espírito civilizado, como coloca Reinaldo de forma mordaz:

Como Cícero recomendava em “De Senectude”, FHC, 84 anos no mês que vem, descobriu os prazeres da maturidade. O espírito de alguns livros, de alguns vinhos e, acrescentaria eu, de alguns uísques requer um repertório que é dado pela experiência, não pelo ímpeto. Nota à margem: o próprio Cícero, coitado!, se foi bem antes, aos 63, com cabeça e mãos literalmente cortadas.

E Lula? Ah, Lula… À beira dos 70 anos, poderia ele também estar pacificado. Embora repudie a sua obra, reconheço-lhe a trajetória invulgar. Por que não faz do prateado do rosto e da cabeça o retrato da temperança? Se não o socorre outro saber que não a disputa pelo poder –e assim é por escolha, não por determinação; é ele que foge dos livros, não o contrário–, que as virtudes do conselheiro se sobreponham às do guerreiro. Mas não!

Agora ele anuncia uma cruzada para mobilizar as esquerdas e os movimentos sociais em defesa do PT. A agitação sindical que promove, e não alguma suposta conspiração de Eduardo Cunha, derrotou o governo na votação sobre o fator previdenciário. O chefão petista vaga por aí como alma penada, sem se dar conta de que a sua militância já é coisa do passado. Só sobrevive o que consegue se adaptar às novas circunstâncias; só se conserva o que é capaz de mudar. Não é lei dos homens, mas da natureza.

Volto ao começo para terminar: sou daqueles liberais que sentem raiva da pusilanimidade do PSDB na luta contra o petismo. Às vezes ficamos com a clara impressão de que muitos tucanos olham até com alguma admiração para a trajetória petista. Velhos ranços demoram a morrer de forma definitiva, e podem ficar lá, latentes, aguardando uma oportunidade para emergirem novamente.

Mas é inegável que, mesmo assim, o PSDB em geral e FHC em particular são dignos de alguns elogios. Souberam amadurecer com o tempo, usar a experiência para tirar lições importantes. Foi justamente essa evolução que passou a ser utilizada pelo PT para “acusar” o partido de “liberal”. O PT, por outro lado, mostra-se incapaz de aprendizado, de evolução, de mudança. Continua, sob a liderança de Lula, o velho partido revolucionário.

Diante de tudo que produziu de escândalos de corrupção, incoerências entre discurso e prática e resultados terríveis por incompetência ideológica, essa velha postura soa um tanto patética, como aqueles velhos carcomidos e decadentes que ainda se acham os jovens rebeldes dos anos 60. Acabam deslocados, fora de lugar, causando uma sensação de asco nos outros. É assim que nos sentimos ao vermos Lula bancando o sindicalista que vai liderar uma revolta contra as reformas propostas pelo governo… de sua criatura e seu partido!

Rodrigo Constantino

0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]