Por Hiago Rebello, publicado pelo Instituto Liberal
É do magnífico romance distópico de George Orwell, 1984, que se espalha o conceito de “duplipensamento”, sendo este, nada mais nada menos que a quebra do princípio da não-contradição nos meios sociais e políticos. Se A não for apenas A, mas também B ao mesmo tempo, pode-se chegar à conclusão de que, num dado momento, uma opressão de fato ocorre, mas que, também, não ocorre.
Como se a contradição fosse um princípio de vida, mas também de conduta política, o duplipensar domina a distopia de Orwell e permite que a macroditadura da Oceania controle tudo e todos em seu domínio, uma vez que a Verdade se dá a partir do que a ordem vigente estabelece… se 2 + 2 foi igual a 4, será 4, mas se o partido disse que é igual a 5, será o que o partido disser. “Certo”, “errado”, “belo”, “feio”, “bem”, “mal”… se tudo é definido pela ordem social vigente, o Partido é que controla a realidade.
O segredo do duplipensar é que este não depende do chão da realidade para se sustentar – caso contrário, ver-se-ia que pelo que se milita, acredita ou se sustenta é, na realidade, uma falsidade. O poder vem quando não se deve prestar contas à realidade e, portanto, a ninguém. E isso permeia a esquerda desde sempre.
Quando vemos os esquerdistas fazendo festa por conta doas áudios de Aécio Neves e do grampo feito ao presidente Temer, não assistimos senão outra coisa que não ao duplipensamento. Até semana passada, era crime ter um grampo que chegasse ao líder máximo da nação, a Lava-Jato era uma armação feita pelo PSDB e o PMDB para ir atrás de quem fazia um governo para os pobres, oprimidos e para as minorias… era. Atualmente, se transformou em algo legítimo, que mostra quem são os verdadeiros ladrões, os inimigos da nação.
Percebam: não foi feita uma crítica interna, dentro das esquerdas, para mudarem tanto. Se está imprimido, na mente esquerdista, um FORA TEMER, caso algo proporcione isso… será válido. Pouco importa se até ontem acreditavam na parcialidade criminosa da Polícia Federal e do Ministério Público: se atingiram meus inimigos, então estão certos; não é importante se a validade da Lava-Jato, antes, era dúbia, pouco confiável, ou até mesmo totalmente censurável…
E também pouco importa se a saída de Dilma foi um golpe de Estado. Não interessa se, antes, defendiam com unhas e dentes, com toda a sua moral, coração e sinceridade a ordem e a lei… porque agora querem eleições diretas que não são previstas pela Constituição… e sem alterá-la de acordo com as normas para tal!
Quebrar a Constituição pode ser golpe, mas também pode não ser; a Lava-Jato pode ser controlada pela oposição ao PT, mas também não é; 2 + 2 é igual a 4… mas se o partido disser que é 5, será 5.
Mas isso não é novidade. Orwell escrevia pensando na União Soviética, mas também sabia que isso se aplicava à teoria comunista. A New Left atual, embora sem um partido único, nada mais, nada menos, segue um “partido” ideológico geral, onde tenta defender um estamento de esquerda, ainda que não seja propriamente uma facção partidária própria. Quando vemos a juventude do PSOL, além dos movimentos estudantis, mudarem da água para o vinho, não estamos assistindo senão um fenômeno de poder bem velho e conhecido: o duplipensar.
Não duvidem: quando o Lula for preso, a Lava-Jato irá virar, também, uma conspiração para acabar com os representantes “do povo”, uma vingança das “elites”.