Fonte: Folha| Foto:

A esquerda tem a hegemonia da cultura e da política no Brasil há décadas, mas tem uma coisa que mudou – e mudou muito! – de poucos anos para cá, graças em parte às redes sociais, em parte aos movimentos liberais: a direita perdeu o medo de confrontar de forma direta essa esquerda hegemônica.

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Durante décadas, ficou parecendo que o PSDB era a oposição a essa esquerda, sendo o próprio PSDB um partido de esquerda. Estava implícito e explícito que os tucanos – os tucanos! – eram o contraponto aos petistas. Que piada!

Durante esse tempo, a esquerda fez a festa. E ficou mal acostumada, negligente, preguiçosa. Não a culpo: se seu “oponente” de esgrima é um tucano, treinar para quê? Qual o intuito de melhorar as técnicas se do outro lado tem um “adversário” que pede desculpas quando lhe acerta um toque, oferecendo o corpo para uma “recompensa”?

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E foi com tucanos que essa esquerda radical “debateu” por tanto tempo. Até chegar a verdadeira direita, até os liberais conseguirem preparar o terreno para jovens destemidos, corajosos, com embasamento teórico, dispostos a partir efetivamente para a briga.

Os “moderados”, ou “isentões”, reclamam: querem a volta do status quo, do tempo em que o “liberalismo” fazia tantas concessões ao socialismo que ambos pareciam indistinguíveis a olho nu. Não vai acontecer. A mudança veio para ficar, e para o desespero da esquerda.

Dou dois exemplos com base em artigos publicados hoje na Folha de SP (ela mesmo um jornal do tipo “isentão”). O primeiro é de Fernando Holiday, vereador de SP e líder do MBL, em resposta a um artigo de Alessandra Orofino. O jovem detona a moça esquerdista sem dó nem piedade, sem medinho de ser acusado de “machista”, sem acender vela para o politicamente correto ou para os movimentos de “minorias” (até porque ele é negro, gay e pobre). Diz Holiday, sem rodeios:

Os devaneios de Orofino, obviamente, não teriam sentido sem elementos comumente usados pela esquerda em suas teses: mentira, distorção e omissão.

O pano de fundo era me colocar como alguém que fugiu de suas lutas iniciais para se aventurar em pautas culturais. Desde o início da minha militância, defendo pilares fundamentais da civilização ocidental, por acreditar ser este dever de qualquer liberal.

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Não me importo em ser chamado de conservador por isso. Na verdade, muitos conservadores me inspiram, como Nelson Rodrigues (1912-1980) e Edmund Burke (1729-1797). Essa defesa sempre esteve alinhada com medidas que reforçam minha austeridade e respeito ao dinheiro público.

[…]

Contudo, boa parte da pantomima da moça se dedica a tentar refutar a importância do projeto Escola Sem Partido, que avançou na Câmara de São Paulo. Fica evidente, pois, que a esquerda ignora completamente contundentes denúncias divulgadas ao longo de anos, vindas de alunos que foram prejudicados, humilhados, ou até mesmo traumatizados por simplesmente dizerem o que pensavam em sala de aula.

E conclui, da forma mais direta possível: “Eu sinto muito, Alessandra. Sua arrogância de esquerdista de butique não cola mais. Essa juventude já se cansou dos falsos movimentos estudantis, inundados com o dinheiro público”.

O segundo caso é de Alexandre Schwartsman, ex-diretor do Banco Central, rebatendo as falácias cafajestes do ex-ministro Nelson Barbosa. Eis alguns trechos:

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O ex-ministro da Fazenda Nelson Barbosa lamenta, em coluna publicada aqui na Folha, a baixa velocidade de recuperação do país na saída da crise, aquela mesma recuperação que afirmava não ser possível sob a política econômica adotada depois de sua saída do ministério, e aquela mesma crise que resultou das escolhas de política econômica que subscreveu durante sua longa estadia como secretário também na Fazenda.

Considerando que em janeiro de 2015 ele previa uma saída rápida da recessão, projeção que voltou a repetir em setembro daquele ano, ecoando, aliás, promessa de 2013, deve estar mais do que claro que não levo a sério nenhum pronunciamento seu. De qualquer forma, sua conhecida honestidade intelectual serve de mote para entender o que vem acontecendo com o país.

Por exemplo, entre os lamentos de Barbosa, destaca-se sua “surpresa” com a lentidão, dado que “o cenário internacional se tornou bem mais favorável ao Brasil desde 2016”. […] A verdade é que o cenário global, de maneira geral positivo, não é tão distinto daquele vigente durante a recessão.

[…]

Isto dito, é óbvio que a retomada da economia tem sido lenta, ponto que tenho feito repetidas vezes aqui neste espaço, bem como em outros. Em boa parte isso de seve à própria profundidade da crise, que criou imensa capacidade ociosa, fenômeno que deve manter o investimento baixo ainda por alguns anos.

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A outra questão é a incerteza fiscal. Ao contrário, porém, do que Barbosa argumenta (o medo da austeridade renovada seguraria o investimento), é o receio do abandono prematuro do ajuste fiscal à luz do quadro eleitoral para 2018 que leva investidores a evitar se comprometer em prazos mais longos.

Se gasto público gerasse crescimento, o Brasil seria uma nação próspera, e Barbosa, o ministro da Fazenda. Tolerar Barbosa como ministro seria preço baixo a pagar pela prosperidade, mas a realidade costuma prevenir esse tipo de absurdo. 

Como fica claro nos dois exemplos, ambos citam o nome de seus alvos, apontam suas falácias, mentiras, desonestidade, e tudo isso sem rodeios, sem concessões, sem tentar parecer “moderado” ou “isentão”. Não é agressividade; é objetividade, clareza e coragem para dar nome aos bois.

Comparem isso às “críticas” de Míriam Leitão, premiada jornalista da mídia mainstream – e ícone da esquerda “moderada” -, ao PT. Para atacar petistas, Míriam quase pede desculpas, inclui direitistas na lista para soar mais “imparcial”, e mal consegue citar o nome dos alvos, fica mais nas abstrações.

Quando a esquerda radical tinha que “enfrentar” só gente do tipo de Míriam Leitão era moleza! Como a vida era mais fácil, não é mesmo? Mas a moleza acabou. A “onda conservadora”, que tanto apavora FHC, é real, e um de seus grandes méritos é esse: o confronto mais direto com a esquerda jurássica.

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Se Alckmin pediu desculpas ao ser “acusado” de privatista, e colocou broches e boné com logos de estatais, a “nova direita” aponta para os fracassos do estatismo, defende com orgulho a privatização de todas as estatais e esfrega a corrupção petista possível por conta dessas estatais na cara de pau desses críticos.

O mundo mudou. O monopólio da virtude da esquerda acabou. Sua hegemonia confortável desapareceu. E é melhor já ir se acostumando, pois não voltará a época em que a esquerda “debatia” apenas com ela mesma, simulando uma pluralidade inexistente.

Rodrigo Constantino