Por Bernardo Santoro, publicado no Instituto Liberal
Será votado hoje projeto que pode legalizar o ato de terceirização do trabalho no Brasil, sendo particularmente assustador pensar que até hoje a terceirização é um assunto obscuro na nossa ultrapassada legislação trabalhista. Já falei anteriormente sobre o tema, e pode parecer repetitivo para quem já leu meu texto anterior, mas ele merece ser reeditado com pequenas alterações em virtude da votação de hoje.
O projeto de lei 4330/2004 prevê a contratação de serviços terceirizados de empresas para qualquer atividade e não estabelece limites ao tipo de serviço que pode ser alvo de terceirização. Além disso, prevê a forma de contratação tanto para empresas privadas como públicas.
A princípio parece que a terceirização vai quebrar o vínculo entre empregadores e empregados, que é a grande reclamação das entidades sindicais, mas não é verdade. A terceirização só é economicamente viável para o que se chama “atividade-meio” de uma empresa, e não sua “atividade-fim”. Exemplifico:
A atividade-fim da escola é o ensino. Portanto, seu material humano básico é o professor. Terceirizar os professores a princípio é economicamente inviável, pois se existisse uma empresa prestadora de serviço de professores, seria mais interessante para essa empresa que ela própria prestasse o serviço, já que ela é a possuidora do principal conhecimento.
Já atividades-meio da escola, como limpeza e segurança, que não são o cerne da atividade empresarial, mas que servem de apoio para o objeto principal, possuem viabilidade de terceirização.
A economia ensina que a especialização de mão-de-obra e comércio entre agentes especializados aumentam a riqueza geral dos envolvidos e a produção social, pois cada agente especializado em um serviço produz muito mais do que se tivesse que produzir várias coisas diferentes ao mesmo tempo.
Portanto, se a escola se preocupasse em se especializar não somente em ensinar, mas também em limpar e se proteger, seus custos seriam muito maiores. Daí entra a terceirização de atividades-meio.
E essa terceirização acaba por beneficiar a todo mundo, inclusive aos terceirizados, pois esses empregados também vão consumir produtos e serviços de empresas que terceirizaram suas atividades-meio e baratearam seus produtos.
Outro argumento das entidades sindicais contra o projeto é a teoria de que a terceirização prejudicará a todos os brasileiros, pois irá acabar com direitos trabalhistas conquistados, em benefícios de empresários que terão custos baixos.
Primeiro precisamos discutir se a terceirização acaba com direitos trabalhistas. Isso é uma mentira. Os direitos trabalhistas se manterão todos, mas os empregados estarão vinculados a outra empresa, a prestadora de serviço especializada. O que ocorre hoje é que há uma disfunção no direito trabalhista que diz que empregados terceirizados podem cobrar seus créditos trabalhistas da empresa tomadora de serviço.
Ora, isso rompe com toda e qualquer lógica comercial. Como é que alguém pode ser obrigado a pagar por um débito trabalhista de um empregado que não é seu? E não é mesmo, pois caso a escola dada como exemplo vier a falir, o empregado continua vinculado ao prestador de serviço de limpeza, e será prontamente deslocado para outra empresa que vier a contratar o serviço junto ao seu patrão.
É lição básica e clássica de Direito que uma pessoa só pode ser obrigada a pagar por uma obrigação sua. Hoje em dia, infelizmente, esse novo Direito distorce isso, criando uma série de situações em que alguém é obrigado a pagar pelo prejuízo causado por outras pessoas.
Na prática, a lei também é levemente intervencionista nesse caso, pois o artigo 10 do projeto de lei em questão diz que, durante a prestação do serviço, a empresa tomadora do projeto fica responsável, subsidiariamente, pelos créditos trabalhistas do empregado. Se o contratado, por exemplo, for um profissional da atividade-fim com empresa própria, basta requerer a equiparação com relação de trabalho na justiça. Ou seja, o projeto de regulamentação da terceirização é até tímido.
Obviamente que esse raciocínio não se aplica ao estado. De acordo com a lei de licitações (art. 71), o estado não responde por dívidas trabalhistas de empresas terceirizadas que lhe presta serviços. Pro estado hoje pode, mas para o empresário é errado. Por quê?
E deixemos bem claro a principal falha de argumentação das entidades contrárias à terceirização. De acordo com folheto da CUT, a terceirização foi feita para baratear a produção. Ora, se a produção de produtos e serviços está sendo barateada, isso é bom para a sociedade e para os pobres! São mais produtos e serviços acessíveis para quem tem menos poder aquisitivo.
Por fim, nem merecia ser citado esse argumento, por tão absurdo que é, mas como é função nossa abordar todas as questões, lá vai: a esquerda defende que a terceirização pode esconder uma relação de escravidão.
Mas o que garante que em serviços não-terceirizados não haja escravidão também? Isso simplesmente não é parâmetro válido de discussão, pois escravidão é ilegal em qualquer situação de trabalho, direta ou terceirizada, pois está na constituição, que está acima de qualquer lei brasileira.
Em suma, esse projeto, embora não seja o ideal, é bom para o Brasil e para os brasileiros. De fato, é a melhor reforma de liberalização da legislação trabalhista já feita neste país. Se o Congresso aprovar esse projeto de lei, estará fazendo história e sedimentando uma real mudança de mentalidade do poder legislativo nacional.
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