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Por Hiago Rebello, publicado pelo Instituto Liberal

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Em alguns comentários na página do Facebook do Instituto Liberal, recebo certas críticas bem infundadas ou, até mesmo, bem infantis sobre meu trabalho neste site. Alguns de meus artigos tratam de economia (de fato são apologéticos ao liberalismo econômico), mas se comparados aos que se referem à cultura – onde sou, de modo bem evidente, um conservador –, são minoritários.

As críticas podem se resumir em uma frase: o que um conservador está fazendo em um site liberal? Para marinheiros de primeira viagem, essa pergunta pode parecer desconcertante, mas, para minha pessoa, ela possui uma incoerência extrema. Se olharmos a História do Liberalismo econômico, vemos que ele está necessariamente atrelado aos paradigmas morais e culturais do tempo que o cria. Não nos esqueçamos de que a primeira proposta sistematizada e racionalizada de liberalismo surge na Universidade de Salamanca, no meio de monges e padres procurando uma via moral para a economia; mesmo com os britânicos, esta regra não se perde. John Locke e Adam Smith eram também filósofos da moral, e esta moral, esta cultura da moralidade, é o que matem as bases civilizacionais necessárias para o liberalismo.

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Do mesmo modo, é conhecido o fato de o conservadorismo contemporâneo ter laços indissociáveis com o liberalismo. Edmund Burke e David Hume não eram estatistas ferrenhos, mas liberais. O ceticismo do conservadorismo (embora o ceticismo de Hume seja autocontraditório até a última potência) anda de mãos dadas com um liberalismo que não aceita mudanças abruptas vindas de ideologias sem laços com o concreto. Mas o que seria do liberalismo sem a noção desse concreto, isto é, da realidade social? Sem saber da existência de um terreno fértil para ser espalhado? O liberalismo econômico perderia a razão de ser, passaria a ser uma imposição administrativa e interventora, como infelizmente ocorreu no século retrasado, na Europa, com o liberalismo continental. O caso do Reino da Espanha, no golpe que os liberais aplicaram contra o rei, pode ser muito útil para entender a questão.

Em 1820, ocorreu a Revolução Liberal na Espanha. Os liberais, com a desculpa de terem em suas mãos receitas de governos melhores, tomaram o governo absolutista espanhol e iniciaram uma guerra civil no país. Poucos anos depois, com o auxílio da França, a Espanha recupera sua monarquia e o rei absolutista tem seu trono devolvido. A Revolução Liberal enfrentou gravíssimas resistências por parte da nobreza, do povo e da Igreja. Quiseram, com seus ideais liberais, estabelecer um Estado mais livre, mas, ao tentar fazê-lo, acabaram por agigantar o próprio aparelho estatal.Se um rei absolutista não teria esse poder, sem ser acusado de tirano e de dar legitimidade para ser destronado, o Estado liberal teve, ao exercer seu domínio para vilipendiar os nobres, a Igreja e, com isso, o próprio povo.

Se não fosse a força da monarquia, talvez o ano de 1820 fosse o 1789 de roupagem liberal. Por que os liberais espanhóis do século XIX fracassaram? Suas críticas ao absolutismo, podemos dizer, estavam corretíssimas em diversos pontos. Um monarca absoluto, como o pilar e a cabeça de todas as instituições do Estado, é realmente perigoso, embora esteja muito longe de qualquer ditador do século XX, em termos de poder. A verdade em suas críticas ao absolutismo não foi o que impediu o governo liberal, mas sim a forma que tais críticas foram aplicadas pelos liberais, forma esta que transformou o governo liberal em um algo criminoso e ilegítimo desde seu início. A política da Espanha do século XIX não podia ser solapada, em nome de uma verdade econômica. Suas estruturas políticas estavam embasadas por uma mentalidade, por uma cultura, que, se fosse mudada de modo rápido e inclemente, geraria um caos político no país.

Os liberais espanhóis cometeram os mesmos erros que os revolucionários franceses: em nome de ideias, ignoraram a realidade que os cercavam. Caos, destruição e morte são o que se consegue, quando se ignora a realidade do mundo, e ao mesmo tempo tenta-se muda-la.

A cultura, o modo de ver as coisas, os valores e os costumes devem ser considerados, logo, preservados em qualquer processo de modificação. Um Estado absolutista é perigoso? Ruim? Sem dúvidas, portanto vamos muda-lo, mas sem jogar fora o bebê com a água do banho.

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Quem só pensa em economia, quem só considera o fator econômico, ou ainda acredita que este é o que predomina, não passa de um reducionista, alguém afogado em um pensamento metonímico, incapaz de ver o todo. E quando não se tem sequer um vislumbre, ou uma ideia de um todo social multiforme, plural, antigo e com bases tradicionais que necessitam ser respeitadas, nada além da injustiça e do caos pode ser gerado.

Querem consertar este país? Então façamos isso de modo lento, pela cultura, pelo resgate dos bons valores do passado, modificando-os, sem destruí-los, conservando-os para evitarmos o caos. Necessitamos mudar a mentalidade brasileira, se quisermos ter um liberalismo econômico, mas o próprio liberalismo não passaria de um mero detalhe, se o compararmos com outros setores de nosso país que necessitam ser urgentemente reerguidos do pó: a segurança pública, a volta da decência no judiciário, o fim de leis imbecis e, também, a caça à cleptocracia que comanda o Brasil – fora os problemas derivados do progressismo de esquerda que assolam as universidades e os maiores meios midiáticos da nação. Necessitamos resgatar nossa decência, nossos valores, nossas concepções de certo, errado, sagrado e profano, belo e feio, bem e mal. Esse resgate, essa conservação, necessariamente estarão no âmbito religioso, político, filosófico, pois têm ligações com a moral, com os hábitos e costumes, noções gerais e específicas dentro da cosmovisão do brasileiro. É claro que ninguém, com o mínimo de inteligência possível, deve esperar derrotar o legado de um Gramsci com um livro de Mises explicando o fracasso econômico do socialismo. É preciso ir além da economia, além do liberalismo.

Querem um Brasil economicamente liberal? Comecem a melhorar a cultura brasileira. O liberalismo não germinou em culturas libertinas (ele nasceu em culturas puritanas e/ou altamente religiosas, vale lembrar), em um caos civilizacional e moral, e ele não crescerá ou se manterá na cultura atual do nosso país.