A pauta prioritária do novo governo é a reforma previdenciária em particular e a retomada econômica em geral. Mesmo os que se enxergam como templários numa cruzada moral para salvar o Ocidente do marxismo cultural precisam entender isso. Bolsonaro não teve quase 58 milhões de votos porque leram Olavo de Carvalho, porque temem o Foro de SP, porque desejam resgatar a civilização judaico-cristã.
Aspectos morais pesaram sim, mas de forma bem mais simples: a corrupção do PT criou demanda por mais ética, e a imagem de honesto do ex-capitão o ajudou bastante. Mas o povo não está realmente comprometido com essa agenda, ao menos não a ponto de ignorar questões mais comezinhas, como o emprego e a segurança. Sem a retomada econômica, portanto, o apoio de boa parte da população poderá se reverter rapidamente.
Tenho repetido isso: mesmo os que dão importância às questões dos costumes precisam entender que Paulo Guedes, hoje, é o homem mais crucial do novo governo. As falas retóricas de Ernesto Araújo, que pelo visto já se empolgou com o petismo no passado, podem produzir suspiros de emoção nas redes sociais, mas exportar para a China continua sendo mais relevante. Infelizmente tem muita gente do núcleo duro do governo mais preocupada com “mitada” em rede social do que com resultado efetivo e duradouro do governo.
A nova controvérsia que rachou (ainda mais) a direita desorganizada foi a ida de alguns parlamentares do PSL, partido do presidente, a China. Olavo de Carvalho declarou guerra pública a eles, citando em especial Carla Zambelli, do movimento Nas Ruas. Ela respondeu, a intriga tomou conta dos grupos de WhatsApp, e uma clara tentativa de assassinato de reputação entrou em curso pelos pitbulls da direita. Até o presidente Bolsonaro se manifestou, condenando a viagem, com razão (em minha opinião). Até porque basta ver esse vídeo do rapaz que festeja o sistema de monitoramento chinês da população, “que dá certo”, para ter calafrios.
Não me interessa tanto aqui, porém, quem está com a razão em termos de conteúdo. A forma é toda muito tosca, os ataques parecem exagerados, a estupidez de quem foi também merece destaque, e a roupa suja lavada em público expõe uma direita incapaz de focar nas prioridades do país. Martim Vasques da Cunha resumiu bem: “Enquanto os olavettes e os bolsominions continuam com seus expurgos lúdicos (a lá Stalin), os assuntos que realmente importam são decididos nos corredores do poder desta Nova Era”.
Ele se referia a essa reportagem de O Antagonista:
A Folha diz que Jair Bolsonaro enfrenta um “lobby da caserna” contra a reforma da Previdência. O grupo egresso das Forças Armadas, segundo o jornal, trava uma forma de ficar de fora da proposta que deve ser apresentada em fevereiro ao Congresso Nacional. O ministro da Defesa, Fernando Azevedo e Silva, foi escalado pelos militares para negociar o assunto.
Os liberais da equipe econômica estão trabalhando duro, nos bastidores, para aprovar reformas estruturais e permitir o avanço da nossa economia. Mas há sabotagem de todo lado, de dentro do governo mesmo, das alas política, militar e olaviana. Tem gente que acha que o sucesso do governo Bolsonaro depende mais mesmo de uma aproximação ideológica com a turma de Steve Bannon, o malucão que nem Trump aguentou manter em seu governo, do que da aprovação das reformas estruturais?
Até o jornal O GLOBO, com seu viés “progressista”, tem comprado as brigas certas, talvez por rejeitar a pauta conservadora moral do novo governo. Mas seu foco tem sido colocado no lugar adequado, como a necessidade de uma reforma previdenciária abrangente que inclua os militares. Em seu editorial de hoje, o jornal carioca deixou isso bem claro:
Segundo o jornal “O Estado de S.Paulo”, o déficit do sistema das Forças Armadas, acumulado de janeiro a novembro do ano passado, foi o que mais cresceu: 12,85%, de R$ 35,9 bilhões para R$ 40,5 bilhões, em comparação com o mesmo período de 2017. Por sua vez, o saldo negativo da previdência dos servidores públicos civis da União (R$ 43 bilhões), também de janeiro a novembro, aumentou 5,22%, e o do INSS (Regime Geral, dos assalariados do setor privado), 7,4%, ao atingir R$ 200,9 bilhões.
[…] Levantamento de quanto o Tesouro teve de contribuir, em 2017, por aposentado, para cobrir os respectivos déficits, é impactante: R$ 6.100 por segurado do INSS; R$ 71.500 para cada funcionário público federal; e R$ 126.000 no caso de cada militar da reserva.
[…] Dados do Tribunal de Contas da União (TCU) mostram que 55% dos militares se aposentam entre 45 e 50 anos. Muito cedo, portanto. E continuam a receber na reserva remuneração integral. Não há paralelo em Forças Armadas de países desenvolvidos, alguns dos quais atuam em conflitos pelo mundo.
Já a direita militante prefere dedicar tempo e esforço para picuinhas nas redes sociais. É tanta falta de visão, de senso de prioridade, que chega a desanimar. Se o lado de cá gostasse de uma teoria da conspiração como o lado de lá, poderia até dizer que jacobinos de direita agem para impedir o sucesso do governo Bolsonaro. Tem gente que garante uma boa fonte de renda se a ameaça comunista for constante e iminente. Mas o povo brasileiro quer segurança e emprego. Não quero dizer que a agenda moral seja irrelevante. Longe de mim! Já cansei de destacar aqui que a economia não é tudo, nem de perto. Mas é preciso um mínimo de bom senso.
Se ao menos os neófitos da política eleitos pelo PSL na esteira do bolsonarismo fossem capazes de compreender a urgência das reformas propostas pela equipe de Guedes, talvez o Brasil tivesse uma chance de sucesso. Mas com uma direita dessas, acho que nem precisamos da oposição da esquerda e dos grupos de interesse que conspiram contra as mudanças…
Rodrigo Constantino
Inteligência americana pode ter colaborado com governo brasileiro em casos de censura no Brasil
Lula encontra brecha na catástrofe gaúcha e mira nas eleições de 2026
Barroso adota “política do pensamento” e reclama de liberdade de expressão na internet
Paulo Pimenta: O Salvador Apolítico das Enchentes no RS