Sim, eu já tinha lido aquele troço. Como já disse, tenho meu lado masoquista. Mas não pretendia nem comentar. É que dessa vez o homem passou de todos os limites mesmo. Mas leitores me pedem. Fazer o quê? São os ossos do ofício. Então vamos lá, uma vez mais, refutar as bobagens e perfídias de Verissimo, o filho de Érico que, em sua coluna de hoje, compara a revolta com o PT à barbárie nazista contra os judeus, seguindo na mesma linha de um vídeo tosco já comentado por mim aqui e por Igor Wildmann aqui.
Às vezes imagino como seria ser um judeu na Alemanha dos anos vinte e trinta do século passado, pressentindo que alguma coisa que ameaçava sua paz e sua vida estava se formando mas sem saber exatamente o quê. Este judeu hipotético teria experimentado preconceito e discriminação na sua vida, mas não mais do que era comum na história dos judeus. Podia se sentir como um cidadão alemão, seguro dos seus direitos, e nem imaginar que em breve perderia seus direitos e eventualmente sua vida só por ser judeu. Em que ponto, para ele, o inimaginável se tornaria imaginável? E a pregação nacionalista e as primeiras manifestações fascistas deixariam de ser um distúrbio passageiro na paisagem política do que era, afinal, uma sociedade em crise mas com uma forte tradição liberal, e se tornaria uma ameaça real?
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A preocupação em reconhecer o ponto pode levar a paralelos exagerados, até beirando o ridículo. Mas não algo difuso e ominoso se aproximando nos céus do Brasil, à espera que alguém se dê conta e diga “Epa” para detê-lo? Precisamos urgentemente de um “Epa” para acabar com esse clima. Pessoas trocando insultos nas redes sociais, autoridades e ex-autoridades sendo ofendidas em lugares públicos, uma pregação francamente golpista envolvendo gente que você nunca esperaria, uma discussão aberta dentro do sistema jurídico do país sobre limites constitucionais do poder dos juízes… Epa, pessoal.
Se está faltando um monólito para nos avisar quando chegamos ao ponto de reconhecimento irreversível, proponho um: o momento da posse do Eduardo Cunha na presidência da nação, depois do afastamento da Dilma e do Temer.
Então Verissimo acha que o Brasil se aproxima da barbárie nazista porque o PT é odiado? Então Verissimo coloca os petistas no papel de vítimas como os judeus dos nazistas? Então o ódio, segundo Verissimo, é disseminado pelos antipetistas, e não pelos próprios petistas, que há décadas segregam a população entre “nós e eles”, jogando uns contra os outros? Então a maior evidência de aproximação da barbárie que Verissimo consegue citar é o ex-ministro Guido Mantega ser xingado num restaurante?
Vejamos: para Verissimo, não é barbárie um partido ser do Foro de São Paulo ao lado de ditaduras assassinas e de terroristas comunistas. Isso é civilização. Para Verissimo, não é barbárie o PT montar esquemas de corrupção nunca antes vistos na história deste país, e fazer tudo isso de cima de seu discurso que monopolizava a ética. Mensalão, petrolão, eletrolão, nada disso é sinônimo de barbárie, e sim a revolta popular contra o governo que jogou o país na maior crise das últimas décadas.
O cinismo dos petistas, suas mentiras infindáveis, o estelionato eleitoral em curso, nada disso incomoda Verissimo. Mas se as pessoas indignadas começam a atacar o PT nas redes sociais, então o Brasil está a um passo do nazismo. O problema, para Verissimo, não é o fato de uma quadrilha liderada pelo PT ter tomado de assalto a Petrobras, maior empresa do país, e sim o juiz Sergio Moro, já que o cronista claramente insinua ver sinais de barbárie no sistema jurídico do país e no poder dos juízes. É preciso dar um basta, dizer “epa!”, para que a “civilização” possa seguir em paz, com o petrolão e o PT no poder.
E como símbolo maior do risco totalitário e da barbárie, não pense o leitor que Verissimo cita a defesa que Dilma faz da tirania venezuelana ou da ditadura cubana. Não! Para ele, o momento crítico seria a posse de Eduardo Cunha na presidência da nação. A chegada de Lula e Dilma à presidência não é sinal de barbárie ou atraso; pelo contrário: o autor festejou! Mas Eduardo Cunha é transformado no Capeta em pessoa pelo esquerdista.
Roubar, mentir, se aliar a tiranos, ser parceiro de terroristas e sequestradores traficantes, bancar invasores de terra, nada disso incomoda Verissimo, e está perfeitamente de acordo com a civilização. Agora, se um deputado que defende a redução da maioridade penal, bandeira em linha com o desejo de quase 90% da população brasileira, concentra mais poder no Congresso, então estamos na barbárie nazista!
Verissimo, faço apenas duas perguntas objetivas: 1) canalhice não tem limites? 2) você acha que a estupidez dos leitores do GLOBO também não tem limites, para escrever tanta porcaria com tanta cara de pau?
Rodrigo Constantino