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A esquerda avançou nas últimas eleições na Espanha, pois a crise econômica sempre será um ambiente fértil para aventuras populistas. Isso desperta a esperança nos utópicos de sempre, aqueles que não conseguem aprender com a história. Um exemplo claro está no artigo publicado hoje no GLOBO da professora de Relações Internacionais da Universidade Federal de São Paulo, Esther Solano Gallego. Ainda que tentando mascarar a empolgação infantil com um tom de “cautela”, a autora não consegue esconder a felicidade com as conquistas da esquerda radical socialista:

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Opções políticas de lado, devemos olhar para a Espanha com a avaliação de quem sente a necessidade do novo. Os jovens, tão longe da política, recuperaram entusiasmos que pareciam muito distantes. Os parlamentos autônomos, em preto e branco, agora passam a ter uma mistura cromática que era urgente. Os movimentos cidadãos, em especial os nascidos do 15M, estranhos à política institucional, se inserem nela como turbilhões.

Claro, não convém cair em romantismos ou glamourizações. A próxima etapa não será fácil. Afastados da comodidade das maiorias absolutas, os partidos deverão formar coalizões e pensar estratégias mais flexíveis e inclusivas. Lideranças novas, com pouca trajetória prévia, serão testadas e já sabemos que a política é implacável.

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Otimismo contido, porque as garras de um sistema caduco, mas ainda em pé, são muito profundas e porque, frente ao desconhecido, devemos optar pela cautela. Otimismo, porque quando o velho sufoca o novo, traz uma esperança que revigora.

Otimismo, ainda que “contido”, quando o velho socialismo obtém mais espaço político num país? Quando o partido Podemos, acusado de ligação com o tráfico de drogas latino-americano, ameaça chegar ao poder? Isso não faz o menor sentido, ao menos não para quem respeita o aprendizado da experiência. Romantismo e glamourização, que a professora diz querer evitar, são justamente as armas usadas por esses socialistas radicais para chegar ao poder. “Intelectuais” e artistas que acham “bonitinho” grupos revolucionários contra o “sistema”, e nunca ligam para os efeitos concretos dessas ideias utópicas.

A professora Esther já procurou justificar os black blocs por aqui também, que não deveriam ser vistos como simples mascarados truculentos e criminosos, mas como uma voz da sociedade contra as injustiças. Não vamos cair em romantismos, claro, mas vamos retratar vagabundos em busca de adrenalina como justiceiros na luta pela liberdade! Já quando a “elite” protesta com panelaços contra o governo de esquerda, a professora acha tudo patético demais. É tão previsível…

Ironicamente, o editorial do GLOBO de hoje, na página ao lado, trazia com muito mais sobriedade uma análise sobre a vitória da esquerda radical na Espanha. Esta sim, uma análise sem romantismo ou glamourização, e por isso mesmo sem espaço para um “otimismo cauteloso” de quem, no fundo, está saltitando com o avanço dos radicais. Diz o jornal:

O quadro eleitoral espanhol, portanto, revela o risco de um impasse político à la grega. Vitorioso nas eleições da Grécia, o partido radical de esquerda Syriza, do premier Alexis Tsipras, chegou ao poder com um discurso antiausteridade e a promessa de renegociar o acordo que permitiu ao governo receber € 240 bilhões em assistência financeira de parceiros europeus e o Fundo Monetário Internacional (FMI). Em troca, Atenas havia se comprometido a aplicar um rígido ajuste fiscal, que trouxe aperto e demissões, mas reorganizou a economia a ponto de o país passar a crescer, após anos de encolhimento.

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No poder, o Syriza se vê, hoje, confrontado pela realidade: abandonar a austeridade, sair da UE e mergulhar de volta na incerteza do dracma; ou permanecer no bloco, aplicando os ajustes, visando ao equilíbrio de suas contas. As últimas pesquisas de opinião mostravam que a população grega prefere a segunda alternativa. Por mais dolorosa que seja, ela se configura como um caminho seguro rumo à estabilidade, por meio da redução do endividamento público, do crescimento sustentável e de uma economia competitiva. Apesar disso, as negociações com os credores têm se mostrado tortuosas, com ameaças de calote e discursos contraditórios no Syriza, ora defendendo uma ideologia delirante, ora submetendo-se ao princípio de realidade.

O crescimento do Podemos como força política na Espanha revela o impacto eleitoral do ajuste feito por Rajoy, em meio à chamada crise da dívida que atingiu a zona do euro. Resta saber se, nas eleições gerais do fim do ano, a população espanhola optará por uma solução mágica para a agonia econômica do país, ou continuará no trilho da recuperação sustentável.

A Grécia também despertou a esperança de muitos românticos de esquerda, mas quem escolhe aprender com a experiência não pode adotar esse mesmo “otimismo cauteloso”, pois sabe muito bem que o socialismo nunca, jamais, em canto algum do mundo, funcionou. Os socialistas são bons em explorar o romantismo dos “intelectuais”, em capturar a esperança dos incautos com suas soluções mágicas e utópicas. Só não são bons em uma coisa básica: entregar os resultados prometidos.

Quem ainda se deixa alimentar por uma esperança renovadora quando socialistas radicais avançam, quem ainda se deixa levar por um otimismo, ainda que “cauteloso”, quando os discursos raivosos e igualitários, eivados de inveja, conquistam os corações dos desesperados com a crise econômica, assina um atestado de que não aprendeu absolutamente nada com as experiências passadas. E quando essa pessoa é professora de Relações Internacionais numa universidade federal, sabemos como a situação de nosso ensino público está ruim em nosso país. Defender o socialismo em pleno século XXI é mesmo um espanto!

Rodrigo Constantino

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