A tal “terceira via” tem um apelo emotivo forte. Romper com a bipolaridade, oferecer um caminho alternativo a dois extremos, eis uma bandeira e tanto. Mas antes de mais nada é preciso compreender melhor o que representa a “terceira via” e se ela é, de fato, uma rota melhor.
Em sua coluna de hoje na Folha, Marcos Troyjo resgata um pouco da história do conceito:
A confusão vem de que, na maior parte do mundo, o “recall” da expressão “Terceira Via” não é o de surgimento de alternativa a suposto duopólio político-partidário.
Tal conceito remete à tentativa, sobretudo centrada nos anos 90, de implementação de uma filosofia de governança que conjuga a inegável eficiência do jogo de mercado na geração de riqueza a um papel corretivo-regulatório do Estado. Os expoentes políticos da Terceira Via teriam sido Bill Clinton e Tony Blair.
Tal espinha dorsal de políticas públicas teria levado a economia dos EUA à sua maior expansão desde o fim da 2ª Guerra Mundial. No caso do Reino Unido, à combinação exitosa entre o legado econômico thatcherista e a aplicação homeopática dos princípios europeus de welfare state.
Não concordo com a questão do êxito dessa via, mas sem dúvida foi melhor do que o socialismo. A “terceira via” surgiu como refúgio para as viúvas do socialismo que, incapazes de negar o retumbante fracasso de sua ideologia colocada em prática, tiveram de criar um “caminho do meio” entre o capitalismo de livre mercado, que seria eficaz para criar riqueza, mas “desumano” e “insensível”, e o próprio socialismo, aproveitando seu lado bom (?).
Nascia o “welfare state” europeu, hoje praticamente falido por ter engessado o dinamismo das economias de mercado. Acabou se mostrando um caro luxo que países já ricos puderam se dar, sem com isso conseguir efetivamente fazer mais pelo social. Nem sempre o meio é o ideal, pois pode ser uma mistura do pior de cada extremo. Misture sorvete com lama e veja se a combinação fica boa…
Mesmo assim, vale notar uma peculiaridade do Brasil, que comprova nosso imenso atraso no debate político: essa “terceira via” social-democrata europeia, hoje em crise pelo excesso de intervencionismo estatal, é vista aqui como “neoliberalismo”. Isso mesmo! Bill Clinton e Tony Blair, vistos como de esquerda em seus respectivos países, ainda que melhores do que a esquerda tradicional mais raivosa, no Brasil seriam tratados como ultra-liberais, comprovando como nosso “centro” se deslocou para a esquerda.
Por essa ótica, a “terceira via” brasileira seria justamente o PSDB, “acusado” de neoliberal pelos petistas. Os tucanos representam essa social-democracia nos moldes de Clinton e Blair, que eu critico por ser ainda muito afastada do liberalismo que julgo, de longe, a melhor alternativa para colocar nosso país na rota do progresso – social e econômico (pois não são excludentes, ao contrário). Ao menos há capacidade de diálogo com essa esquerda, que demonstra algum bom senso econômico.
Logo, quem acha que Marina Silva representa uma “terceira via” está redondamente enganado. Marina representa o velho esquerdismo, extremamente intervencionista e que deposita no estado um papel preponderante em tudo. Foi do PT por 30 anos, e seu marido até ontem ainda era do partido de Lula e Dilma no Acre. Pode ser menos pior do que Dilma, o que não é difícil, mas não é uma “terceira via” de fato.
Marina Silva quer mostrar que faz uma “nova política” e que não depende do “capital”. Por isso chamou para perto de si a ex-petista Luiza Erundina, o socialista Roberto Amaral e a herdeira do Itaú Neca Setubal? Seria essa a tal “terceira via”? Não convence ninguém mais atento e racional. Troyjo conclui batendo no personalismo representado por Marina nessa eleição:
A experiência daqueles países que aceleraram seu desenvolvimento apresenta mais do que partidos a se eternizarem no poder ou personalidades carismáticas. Nações que constroem atalhos na História trazem liderança capaz de construir consensos e impor sacrifícios. Competente condução dos assuntos de Estado. Visão estratégica do modelo de economia política em face a uma nova fase da globalização. São tais marcas que perfazem a boa via.
Devemos abandonar essa visão romântica de “terceira via” e escolher a melhor via, a alternativa mais eficaz dentre as existentes. Reinaldo Azevedo, em sua coluna de hoje também na Folha, desfere outro duro ataque a Marina, lembrando alguns pontos inconvenientes para seus seguidores:
Quem faz política para salvar a humanidade não negocia, mas impõe. Marina, agora candidata do PSB à Presidência, não aceitou assinar compromisso nenhum, rejeitou acordos políticos firmados por Campos e impôs um nome para a coordenação da campanha. Ela se considera, por exemplo, pura demais para apoiar a reeleição de Geraldo Alckmin (PSDB) em São Paulo, que tem como vice Márcio França, do PSB, ex-braço direito de… Campos, aquele cujo retrato a agora presidenciável brandiu à beira do caixão.
Faço aqui um desafio a Marina. Ela é governo no Acre há 16 anos. Seu marido deixou nesta semana o cargo de secretário de Tião Viana (PT), mas seu grupo continua no poder. É um fato. Então que se comparem dois padrões de governança: um que ela aprova, desde 1999, e outro que ela reprova, o de São Paulo. Vamos ver em qual deles os indicadores sociais e econômicos avançaram mais nesse tempo. É óbvio que me refiro a avanço relativo, já que o Acre não chega a ter 800 mil habitantes, e São Paulo tem 43 milhões. O petismo e o marinismo governam, há quatro mandatos, uma população igual à da soma do Grajaú com o Jardim Ângela, dois dos 96 distritos da capital paulista. O grupo poderia ter operado uma verdadeira revolução na qualidade de vida, não é mesmo? Mormente porque, nos 12 anos recentes, tem um aliado no governo federal. Por alguma estranha razão, na eleição de 2010, Marina só venceu no Distrito Federal, que tem a renda per capita mais alta do país, e ficou em terceiro no Acre. Pobres têm a mania de não saber o que é melhor para si. Os ricos sempre sabem.
Na hora de votar, tente avaliar qual candidato tem as melhores propostas factíveis, a estrutura partidária mais organizada, os melhores quadros técnicos, o melhor histórico de gestão, enfim, procure usar mais a cabeça e menos o coração. E cuidado com os misticismos. Como lembra Reinaldo Azevedo, são o novo ópio – ou a clorofila – dos intelectuais.
Rodrigo Constantino
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