Por Bernardo Santoro, publicado no Instituto Liberal
Há algum tempo atrás escrevemos sobre a questão da politização da matriz energética brasileira, onde a matriz hidroelétrica perdeu a capacidade de armazenamento de água em longo prazo por pressão ambiental, a matriz nuclear não é usada por preconceito (mesmo com o Brasil dominando a técnica de enriquecimento do urânio e tendo a sexta reserva mundial do minério), e se investe maciçamente em energias limpas caras e de baixa eficiência.
Além disso, já denunciamos também o rígido controle estatal da produção de energia no país, através da ANEEL (Agência Nacional de Energia Elétrica) e do ONS (Operador Nacional do Sistema), fazendo com que todas as decisões relativas à produção de energia estejam atrelados ao Governo, mesmo com algum investimento privado no sistema.
Portanto, as digitais do Governo estão por toda a parte na gravíssima crise energética pela qual passa o país. Fechamento do mercado, subsídio de preços e falta de investimentos não poderiam resultar em outra coisa que não fosse essa catástrofe. A decisão da Presidente Dilma de reduzir artificialmente a conta de luz no ano retrasado estimulou o consumo desenfreado de um produto escasso, resultando no seu quase esgotamento, refletindo-se em um aumento gigantesco no início deste ano. A crise da energia é o estatismo brasileiro na sua glória, para alegria dos seus profetas petistas.
O que sobra de estatismo, no entanto, falta em estadismo, especialmente no atual Governo. Vou usar a definição de estadismo, e seu principal operador, o estadista, a partir da visão de Aristóteles, que argumenta ser o estadista aquele líder político que lidera com sabedoria e busca exercer seu governo a partir de padrões éticos e visão de longo prazo. Se, para liberais, os estatistas são abjetos e avessos à sua doutrina, com os estadistas a desconfiança é quase tão grande quanto. Liberais acreditam em um Estado de Direito isonômico, mas que os processos de produção e distribuição de bens e serviços devem estar praticamente todos atrelados à iniciativa privada, entendendo esse Estado, e seu estadista ético e com visão de longo prazo, como males necessários.
Dentro dessa estrutura, o mínimo que se espera do Governo é que ele não minta acerca dos problemas sócio-econômicos enfrentados pela sociedade brasileira, mas não é isso o que aconteceu no caso da crise de energia. Ao longo de todo o ano passado, o que se ouvia dos candidatos ligados ao Governo, em especial da presidente Dilma, é que não havia o menor risco de ocorrer apagões. Mesmo após o apagão de ontem, onde empresas que repassam a energia declararam que foram obrigadas pelo ONS a cortar serviços, o Governo continuou negando que tivesse ocorrido problemas relacionados à falta de energia.
Uma atitude estadista, bem diferente da postura estatista do atual Governo, foi a tomada pelo ex-Presidente Fernando Henrique Cardoso, onde, com coragem, veio a público falar sobre a crise e apresentou um plano de redução do consumo, penalizando quem gastasse mais e bonificando quem gastasse menos, em um esforço nacional para ultrapassar os períodos difíceis enquanto os novos investimentos não surtiam efeito.
A atitude de Fernando Henrique não foi a ideal, pois o ideal seria a abertura de mercado, a desburocratização, a total liberdade de preços refletindo a escassez e a utilidade do serviço de energia e o desmonte das agências do setor, mas dentro de uma visão interventora, a diferença de padrão moral e política entre os dois governantes foi gigantesca.
Para o cidadão comum, preso na briga entre os estatistas e o estadistas, só resta lamentar o nível da falta de infraestrutura do país, que nos impede de produzir e montar uma economia mais próspera e justa. Ninguém mais investe e a fuga de capitais já é inegável. O último que sair apague a luz, se já não estivermos no escuro.
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