Quem me acompanha há mais tempo sabe que considero a Anvisa uma das entidades mais fascistas do Brasil atualmente, e que abomino essa cruzada pela “saúde perfeita” que tomou conta da sociedade cada vez mais histérica. Sua face mais evidente é a luta política contra o cigarro. É a face de Dráuzio Varella (não sei quanto ao leitor, mas não me parece a face da saúde perfeita).
Com base nesse paternalismo, os engenheiros sociais, tutores de nossas almas, seguem avançando sobre liberdades básicas individuais. Não respeitam mais a propriedade privada, o direito de cada um escolher como viver a própria vida, desde que o direito de terceiros seja respeitado. Isso é muito pouco para os “fascistas do bem”: eles precisam salvar cada um de suas próprias “fraquezas”.
Reinaldo Azevedo falou sobre o assunto no dia do combate ao tabaco, e João Pereira Coutinho volta a ele hoje, endossando os alertas de Azevedo. Em sua coluna na Folha, Coutinho chama a atenção para onde vamos chegar: no mesmo caos paranóico da União Europeia. Só importamos o que há de pior dos países desenvolvidos, é impressionante. Diz o colunista português:
Os médicos podem “desaconselhar” o tabaco. Os cientistas podem provar os malefícios do fumo para a saúde do fumante (ativo), embora ainda esteja por provar qualquer relação consequente entre fumo (passivo) e câncer, por exemplo. Depois, em liberdade, cada um escolhe o modo de vida que entende com a informação de que dispõe.
Coisa diferente é afirmar que o fumo também pertence ao mundo do poder político. Não pertence. Se, como escreve Reinaldo Azevedo, os cigarros não são ilegais, não compete ao governo tratá-los como substâncias ilícitas. Sobretudo quando esse governo cobra impostos sobre o consumo, beneficiando os cofres do Estado com um vício que publicamente condena.
A hipocrisia do gesto fura os olhos de qualquer um: sob a capa da virtude, o governo rejeita os pulmões dos fumantes mas não o dinheiro deles.
Além disso, e mesmo que as proibições sejam em nome da saúde, não compete ao governo ser o “babysitter” de ninguém. Tentar aprimorar a qualidade da raça é coisa de regimes totalitários, não de democracias pluralistas.
Em democracias pluralistas, os indivíduos têm todo o direito de arruinar a própria saúde. Fumando. Bebendo. Transando sem camisinha. Rejeitando o “jogging” e abraçando o “zapping”.
Aliás, não é apenas o direito de cada um dispor da sua saúde que deve ser respeitado. Existe um direito ainda mais básico que a proibição do fumo em lugares fechados viola clamorosamente: é o direito à propriedade privada.
Levar uma “vida saudável” deve ser uma escolha individual, não algo imposto pelo estado. Essa “reeducação” forçada é típica de regimes totalitários. O fumante hoje é tratado como um “verme”, um “pária” da sociedade, um fraco incapaz de cuidar da própria saúde.
O argumento de que custam caro ao próprio estado não se sustenta e é muito perigoso. O ócio faz mal à saúde: será que o governo vai obrigar exercícios físicos também? Fritura, gordura, sal: tudo pode ser veneno dependendo da dose. Teremos cardápios de dieta obrigatórios também?
Todos pagamos impostos, e os hospitais públicos existem para todos. “Os hospitais não existem para tratar gente saudável. Relembrar o óbvio é o melhor retrato do ‘fascismo light’ em que vivemos”, diz Coutinho. Se o SUS é o problema, então o modelo coletivista é o problema, não o que cada um faz com sua liberdade individual.
No mais, pelo puro utilitarismo, pela conta estritamente monetária, o argumento seria o contrário: como o fumante tende a viver menos na média, ele custa menos ao erário, pois a Previdência Social é o maior custo disparado. Será que o governo deveria incentivar o fumo para cortar custos de aposentadoria?
Rodrigo Constantino
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