Por Lucas Berlanza, publicado pelo Instituto Liberal
Antes de qualquer coisa, trago mais algumas reflexões sobre os últimos acontecimentos que nos jogaram naquele que é talvez o estágio mais confuso da enorme crise que vivemos.
Em primeiro lugar, importa entender que não existem soluções mágicas e uma sociedade deve perseguir, não o Paraíso, mas a configuração de poderes e interesses que se choquem e controlem uns aos outros – os pesos e contrapesos. No Brasil, todos os poderes estão bastante combalidos moralmente, uns mais do que outros; nesse jogo, incluímos também a imprensa. Por que dizemos isso? Pelo seguinte: setores da direita estão disseminando que há interesses claros da Globo e da JBS – inclusive suspeita por se beneficiar da turbulência no mercado decorrente do estardalhaço político-midiático que ajudou a gerar – em fazer barulho e derrubar Temer, interesses supostamente ligados aos do PT e de Lula (muito embora estes últimos passem longe de estar ilesos nas delações da JBS). Ressaltaram também estranhezas na conduta de Janot e dos procuradores de Brasília.
Tudo isso pode ser verdade e, se for, que se apure e todos sejam punidos; deduzir disso, porém, que Temer é inocente, é vão. Numa sociedade doente, de interesses doentes, seus pesos e contrapesos também acabam sendo doentes, mas nem por isso deixam de levar a efeito essa função. Eduardo Cunha nos ajudou a derrubar Dilma Rousseff, acolhendo o pedido de impeachment. Hoje, seja qual for o motivo que tiver levado à delação ou à divulgação midiática, o presidente da República, chefe de Estado e de Governo em um sistema presidencialista, foi pego em flagrante e está moralmente maculado com evidências consistentes contra ele. Em qualquer país civilizado, ele se retiraria, para o bem nacional. É mesmo um utilitarismo questionável em seus próprios termos acreditar que sua permanência seja mais interessante. Mantenho: Temer deve sair.
Reconheço, é claro, que NENHUMA escolha que o país faça nesse momento está isenta de riscos. A permanência de Temer em um governo que corre riscos de sangrar tende a ser prejudicial ao país. As eleições diretas, que já condenamos e seguiremos condenando, representam uma alteração constitucional por casuísmo que é interessante para a narrativa dos petistas, usando o slogan das “Diretas Já” como se estivéssemos saindo do regime militar dos anos 80. É uma tentativa de armação para proteger o maior canalha que já governou este país, Lula, do peso da justiça.
A melhor solução de todas, em nossa opinião, e que defendemos, é a retirada de Temer o mais depressa possível e a realização de eleições indiretas, conforme manda a Constituição. Contudo, também aí, é claro, contando com os congressistas deploráveis que temos, há riscos potenciais; nada que, frisamos, nos convença a abandonar os limites constitucionais, única maneira que ainda temos de nos agarrar a alguma normalidade e buscar alguma previsibilidade. Haveria condições de, usando os meios de que dispomos, sob a forma de redes sociais e movimentos organizados, pressionar nossos políticos para que não elejam um presidente comprometido, quer nas investigações da Lava Jato, quer com os interesses que pretendem travá-la.
Assistimos à última edição do programa Painel, de William Waack, da Globo News. Um dos convidados foi José Eduardo Faria, pós-doutor em Direito e especialista da FGV de São Paulo. Com respeitável e lúcida participação ao longo de todo o programa, ele deu uma escorregada feia na reta final. Disse que o candidato ideal a ser encontrado para eleições indiretas seria uma “reserva moral” da nossa classe política, sem menções na Lava Jato, algum estadista experimentado que não tivesse mais ambições de poder notórias e que pudesse conciliar o nosso Congresso com uma agenda sensata de reformas. Tendo sido perguntado quem seria essa figura mítica e que nos parece impossível de ser encontrada, ele consentiu em admitir o nome do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.
Só pode ser piada. Em primeiro lugar, porque FHC tem algumas citações na Lava Jato, embora a maioria das irregularidades associadas a seu nome já possa estar criminalmente prescrita. Em segundo lugar, porque não é possível, em plena evidência dos escombros em que se encontra a Nova República, alçar ao poder novamente um senhor que tem totais ligações com a consumação da identidade assumida por essa fase de nossa trajetória política. Uma figura que volta e meia se apieda dos infames protagonistas contemporâneos de nosso drama, a ponto de sair em defesa de Lula e ser a personificação mais perfeita da pusilanimidade no combate ao histrionismo do partido da estrela vermelha. A personificação mais perfeita do PSDB, atingido em cheio nas últimas delações, o ícone de um Brasil que, a despeito de seus acertos – que existiram -, deve acabar. Deixem, pois, que acabe.
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