Terminei a primeira temporada de “Sons of Anarchy”, série criada por Kurt Sutter que fez sucesso em 2008. Mostra uma gangue de motoqueiros com suas Harley-Davidsons em uma cidade da California chamada Charming. O protagonista é Jackson Teller, ou Jax, que vive dilemas morais ao ter um filho doente com uma viciada em crack e ao mesmo tempo encontrar escritos antigos de seu pai, fundador do grupo. Neles, seu pai lamenta os rumos que a coisa tomou. O que era um sonho utópico de construir uma grande família acabou virando um caminho sem volta ao crime.
A série é interessante para contrastar os ideias românticos de uma época com seus efeitos concretos. A rebeldia dos anos 1960, o clima de heroísmo dos “foras-da-lei”, daqueles que ousavam questionar e atacar o “sistema”, levando vidas mais “livres” com suas motos sem destino certo, o espírito selvagem e libertário dos que não aceitavam se enquadrar no modelo “pequeno-burguês” tido como normal: tudo isso parecia tão charmoso no papel! Mas o que pariu na prática?
Claro que nem tudo é desgraça. Claro que sempre é possível aproveitar algo de bom. Mas também é verdade que sentimos as consequências negativas daquela rebeldia irresponsável até hoje. Jax tem um bom coração, amava sua namorada da escola, tinha tudo para construir um lar feliz, uma família de verdade, daquelas vistas como “caretas” pelos anarquistas. Mas vai sendo levado, dragado pelo destino, sem força ainda (na primeira temporada) para impedir a conversão total do velho sonho de seu pai em nada mais do que um bando de assassinos e traficantes de armas.
Parar para refletir e questionar o que vem sendo feito dos velhos sonhos é sinal de amadurecimento. Às vezes é preciso ter um duro choque com a realidade para tal despertar. É necessário olhar para trás e comparar os objetivos traçados com os caminhos efetivamente tomados, para verificar se há conexão entre eles, ou se um abismo cada vez mais intransponível se abre entre ambos. Os sonhos idealistas fazem parte da juventude, mas até quando podem mascarar um simples desejo pela violência ou ganho fácil? Será que não servem muitas vezes de desculpa, para a própria consciência, para uma espécie de salvo-conduto para o crime?
Os “Sons of Anarchy” nasceram para confrontar o “sistema”, para oferecer uma alternativa, um estilo de vida diferente, comunitário. Assim como certo partido político brasileiro nasceu para resgatar a ética, para superar os velhos caciques, para jogar para escanteio os “trezentos picaretas” do Congresso. Não nego que muitos, lá atrás, acreditaram no sonho romântico, na utopia revolucionária, com toda a sua boa-fé. Mas pergunto: quem pode fingir que aqueles ideais ainda sobrevivem, em vez de servirem somente como uma licença para todo tipo de crime comum?
Rodrigo Constantino
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