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Por que Bolsonaro foi eleito? São vários fatores, claro. Entre eles, o antipetismo, a facada de Adélio, a Lava-Jato, a economia, a indignação popular contra o establishment, o desejo de mudança na parte cultural, o liberalismo econômico de Paulo Guedes, o cansaço com o partidarismo da imprensa etc. Cada um votou por uma razão, e o somatório de causas explica a vitória.

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Mas a ala ideológica do governo, liderada pelos filhos Eduardo e Carlos, juram que foi Olavo de Carvalho quem garantiu a vitória do pai. Eles menosprezam todos os outros fatores, e acreditam que quase 58 milhões votaram em Bolsonaro porque desejam reverter a “guerra cultural” contra o “globalismo”.

Com mapa de fundo tão equivocado, os filhos do presidente depositam no guru um poder que, na prática, ele nunca teve. Serve para alimentar o ego do filósofo, e para reforçar uma narrativa de constante combate contra terríveis forças do mal. Essa mentalidade tribal atende aos interesses de quem vive em campanha, não de quem precisa governar um país.

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Infelizmente, o próprio presidente é muito influenciado pelos filhos e pelo guru. Passou um pito recentemente em Olavo de Carvalho, mas não é capaz de efetivamente desautorizar os filhos, que, logo depois, dedicaram inúmeras postagens contra o vice-presidente Mourão. Carlos está prestes a completar 40 horas de ataques ininterruptos ao vice do pai, e seu irmão endossou o coro: “função de vice não é dar opinião!”

Mourão foi eleito junto com Bolsonaro numa chapa, assim como Dilma e Temer (e muitos bolsonaristas alegaram exatamente isso quando os petistas disseram que não elegeram Temer). Não nego que Mourão tem feito declarações que podem ser consideradas antagônicas à agenda do governo, mas em parte seu papel tem sido o de moderação e contemporização num ambiente de batalha constante.

Para os filhos do presidente, isso é ato de traição. O próprio Bolsonaro, em áudio vazado, disse que Mourão terá uma “surpresinha” em 2022. Olavo de Carvalho declarou guerra aberta ao vice, tratado como um pústula traidor. O clima é de bagunça geral, e a postura dos filhos de Bolsonaro tem tudo a ver com isso.

A pesquisa CNI/Ibope mostra que Bolsonaro tem aprovação baixa, de apenas 35%, enquanto aqueles que consideram seu governo ruim ou péssimo já chegam a 27%. É a economia, estúpido! “Templários” podem brincar de revolução no Twitter ou passar o dia atacando o vice-presidente escolhido por Bolsonaro e eleito pelo povo na mesma chapa, mas o povo, aquele real, quer mesmo é emprego!

O projeto de Eduardo e Carlos, porém, parece ser outro. Mais preocupados com o clã do que com o país, a narrativa, produzida pelo guru e disseminada pela militância, é a de que Bolsonaro é um “mártir” em meio a traidores. O presidente seria “amado pelo povo”, mas todos tentam boicotar seu governo. É um discurso claramente personalista e populista, até mesmo fascista. Congresso não presta, Judiciário não presta, militares não prestam, o vice não presta: só o presidente, adorado pelo povo, presta!

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Essa tática de constante combate, que já foi chamada de “presidencialismo de colisão”, em vez de presidencialismo de coalizão, tem sido prejudicial ao extremo para o governo. Mas eis um corolário dessa mentalidade: toda crítica, por mais construtiva que seja, será tratada como ataque de inimigo. Essa turma só aceita bajuladores, aqueles que abaixam a cabeça e dizem “amém” para tudo.

Quem vê a coisa degringolar diante dos seus olhos e quer ajudar o governo a dar certo acaba tratado como inimigo ou traidor também. O governo não precisa de oposição da esquerda ou da imprensa: ele cria suas próprias intrigas e confusões. Mas quem demonstra receio, quem teme que essa conduta vá atrapalhar as reformas, recebe pedradas. É a eterna campanha, e dane-se o governo!

O próprio Eduardo Bolsonaro, rebatendo um texto meu que foi publicado pelo cantor Roger Moreira, demonstra como ainda vive preso na mentalidade de campanha eleitoral:

O pior é que essa ala baderneira nacional-populista, seguidora de Olavo e Bannon, está quase conseguindo fazer com que isso seja desejável. A insatisfação com a postura dos filhos do presidente é crescente nos bastidores da direita, entre liberais e conservadores. Cada vez restam apenas os bajuladores incondicionais ao lado deles, aqueles conhecidos como “minions”. Alguns já chegam a questionar se não seria melhor mesmo um tucano – até um tucano! – ou Mourão como presidente. É o custo de se eleger um “meme” ambulante.

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Repito: Bolsonaro venceu por várias razões, e a militância virtual aguerrida é uma delas, mas nem de perto a única. E o que serve para vencer eleição não necessariamente é o que serve para governar uma nação. Agora Bolsonaro é governo, está no poder, e o PT foi derrotado. A prioridade é outra. A pauta é outra. Mas os filhos do presidente parecem não ter se dado conta disso. E pior: o próprio presidente às vezes demonstra o mesmo.

O bolsonarismo precisa de inimigos terríveis como ameaça constante, e de pensamento binário de torcida de futebol: está comigo ou contra mim! Nesse processo, não há espaço para liberais e conservadores que detestam o PT e também os tucanos, que reconhecem o viés esquerdista da mídia, que desejam uma guinada à direita, mas que nem por isso fazem vista grossa para a postura autoritária e reacionária do nacional-populismo.

É por isso que pessoas como eu, com longa trajetória de combate ao petismo e à social-democracia tucana, que sempre condenou a imprensa “progressista”, que deseja uma guinada conservadora nos costumes, acabam sendo vistas como “comunistas” pela ala jacobina. É tudo ou nada! Eduardo pode “casar” com uma figura como Steve Bannon, que Trump colocou para escanteio, pode paparicar governos autoritários da Europa, e ninguém deve criticar, pois isso significaria a volta do PT ao poder.

Eduardo pode não querer escutar meus conselhos. Tem todo direito de preferir escutar aqueles de Olavo e Bannon que, para ele, foram responsáveis pela vitória do seu pai. Mas depois não poderá reclamar se o governo naufragar. Bannon pode até ter sido importante para a vitória de Trump, mas o presidente soube avaliar a diferença entre campanha e governo, e por isso Bannon foi chutado da Casa Branca. É essa lição preciosa que Bolsonaro precisa aprender com Trump.

Rodrigo Constantino

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