Por Erick Silva, publicado pelo Instituto Liberal
Nos últimos dias, a França vem sendo acometida por uma onda de protestos violentos comandados pelos “Gilet Jaunes” (Coletes Amarelos), que barbarizaram a cidade de Paris, causando dezenas de feridos e centenas de prisões. A onda de protestos é o resultado da crise política que a França enfrenta, com uma rejeição alta do presidente Emmanuel Macron, rejeitado por 68% da população, e dos graves problemas que a cidade enfrenta há alguns anos, como falta de segurança, formação de “guetos” em várias áreas, depredação do patrimônio público, entre outros.
Esse tipo de rebelião não é uma novidade. A França é considerada um exemplo de como fazer revoltas violentas. Foi dela que surgiu a Revolução de 1789, que deu origem a um dos movimentos mais sanguinários da história humana, o período do “Terror Jacobino”, que, comandado pelo revolucionário Maximilien de Robespierre, causou a morte por guilhotina de milhares de opositores, incluindo pessoas que antes apoiaram os jacobinos, como Danton.
Infelizmente, uma época que deveria ser motivo de reflexão para que a humanidade nunca mais cometesse o mesmo erro acabou sendo “glamourizada” e o jacobinismo, em maior ou menor grau, ainda inspira mentes e corações de militantes. Uma mentalidade revolucionária, que busca a destruição de todo um sistema ou modelo político na esperança de um “mundo melhor”.
Foi através dessa mentalidade que surgiram as manifestações que ficaram conhecidas como as do “Maio de 1968”, uma onda de protestos que influenciou vários países do mundo e que deu o pontapé inicial para a “Nova Esquerda”. O Maio de 1968, inicialmente um protesto estudantil, acabou generalizando-se para uma onda de protestos que buscavam mudar a ordem social na França, uma reestruturação cultural que alterasse valores que fizeram a França se tornar uma grande nação.
Os movimentos de 1968 aconteceram há 50 anos, mas o impacto desastroso na cultura francesa encontra um forte eco nos dias atuais. A França atualmente enfrenta uma crise que assemelha-se a um câncer em metástase: descrédito na política, uma profunda crise moral, desinteresse pela história e cultura… Grande parte dos valores que identificavam a França são fortemente solapados em plena luz do dia, com a conivência e até mesmo apoio da própria população.
Não sou contrário ao multiculturalismo. Acredito que ele pode tornar-se muito benéfico a um país se bem integrado. Um dos melhores exemplos é o Brasil, que é uma nação multicultural: possuímos uma cultura riquíssima e bastante variada, desde a cultura indígena, que proporciona eventos culturais magníficos como o Quarup e o Festival de Parintins; a cultura nordestina, que nos brindou com a sua culinária, a sua história de lutas e o xote e baião; a cultura afro-brasileira, que nos proporcionou o samba, o jongo, as religiões como o candomblé e a umbanda; as culturas ítalo-alemãs; entre várias outras que fizeram com que o Brasil fosse uma nação com uma produção cultural riquíssima e altamente diversificada. O multiculturalismo é algo sadio e benéfico.
O problema começa no fato de que, para abraçar uma nova cultura, você tenha que renunciar aos valores e à história que fizeram uma nação se constituir. Suas glórias, seus feitos, valores que levaram séculos para ser consolidados, mas que correm o risco de desaparecerem em um curto período de tempo. Quando isso acontece, é algo que pode ser irreversível. Uma crise econômica pode ser resolvida em dois ou três anos. Mas uma crise cultural, em grandes proporções, leva muito mais tempo para ser consertada.
O historiador inglês Arnold J. Toynbee disse, em sua grande obra Um Estudo da História, que as nações não são assassinadas: são suicidadas. Essa frase cabe muito bem ao estado atual da França: um país com um passado glorioso, mas que sucumbe pela destruição da sua própria população, que defenestra aqueles que poderiam salvar a França em questões econômicas e culturais e aplaude aqueles que querem ver tudo queimar em chamas. Deixo aqui um poema em forma de canção: “Sous le ciel de Paris”, da grande cantora Edith Piaf, em versão no português brasileiro. Que a França consiga se recuperar dessa escuridão que renega o passado, destrói o presente e ameaça o futuro.
Sob o Céu de Paris
Sob o céu de Paris
Voa uma canção
Ela hoje nasceu
No coração de um rapaz
Sob o céu de Paris
Caminham os apaixonados
A felicidade se constrói
Sob um céu feito para eles
Sob a ponte de Bercy
Um filósofo sentado
Dois músicos, alguns curiosos
e também milhares de pessoas
Sob o céu de Paris
Vão cantar até de noite
O hino de um povo apaixonado
Por sua velha cidade
Perto da Notre Dame
Por vezes se trama um drama
Sim, mas, em Paname
Tudo se arranja
Alguns raios do sol de verão
O acordéon de um marinheiro
A esperança floresce
No céu de Paris
Sob o céu de Paris
Corre um alegre rio
Ele adormece à noite
os mendigos e os esfarrapados
Sob o céu de Paris
Os pássaros do Bom Deus
Vêm do mundo inteiro
Para conversar entre eles
E o céu de Paris
Tem seu próprio segredo
Há vinte séculos ele está apaixonado
Por nossa Ilha Saint Louis
E quando ela lhe sorri
Ele veste sua roupa azul
Quando chove em Paris
É porque ele fica infeliz
Quando fica ciumento demais
Dos milhões de amantes dela
Ele faz sobre nós ribombar
Seu trovão retumbante
Mas, o céu de Paris não fica por muito tempo cruel
Para se fazer perdoar, ele oferece um arco-íris
Link para ouvir a música: https://www.youtube.com/watch?