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Frederick Douglass foi um importante ativista americano, que saiu da escravidão para a fama internacional ao defender os valores da liberdade com base na Constituição americana, alegando que a mesma era incompatível com a escravidão. Sem saber ao certo a data de seu nascimento, ele mesmo atribuiu o dia 14 de fevereiro, por lembrar vagamente de sua mãe o visitando na plantation com um bolo neste dia, falando que ele era seu “valentine”. Segue, portanto, um texto meu antigo em sua homenagem, assim como o podcast de hoje do Cato sobre esse guerreiro da liberdade:

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Da escravidão à liberdade

Da escravidão à liberdade

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“Não devemos acreditar nos muitos que dizem que só as pessoas livres devem ser educadas, deveríamos antes acreditar nos filósofos que dizem que apenas as pessoas educadas são livres.” (Epíteto)

Frederick Bailey já nasceu escravo em 1818, em Maryland. Ele foi separado de sua mãe antes de completar um ano. Era apenas uma das inúmeras crianças escravas cujas perspectivas de uma vida promissora eram nulas. Seres humanos eram comprados como objetos, somente por causa da cor da pele. A escravidão era a regra em todas as sociedades praticamente.

 

A crença era de que os escravos deveriam continuar analfabetos, pois, como colocou o próprio Bailey, “é necessário obscurecer a sua visão moral e intelectual, e, na medida do possível, aniquilar o poder da razão”. A leitura e o pensamento crítico eram perigosos, subversivos. Mas nada disso seria obstáculo suficiente para impedir o caminho da liberdade de Bailey, que mais tarde ficou conhecido como Frederick Douglass, um dos mais famosos abolicionistas americanos.

Bailey foi trabalhar na casa do capitão Hugh Auld, e quando tinha uns 12 anos, a esposa do capitão, Sophia, quebrou as leis e ensinou o escravo a ler, impressionada com sua inteligência e aplicação, e movida pelo cristianismo. O capitão mais tarde descobriu, e, furioso, mandou Sophia parar com as lições. Na presença de Frederick, ele explicou que “um preto deve saber apenas obedecer ao seu senhor, deve cumprir ordens”. Caso ele aprendesse a ler, ficaria inutilizado para sempre como escravo.

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Mas o capitão havia revelado o segredo a Bailey, que agora compreendia o poder do homem branco de escravizar o negro. Mais tarde ele escreveu: “A partir daquele momento, eu compreendi qual era o caminho da escravidão para a liberdade”. Ele encontrou outras formas para aprender a ler, inclusive conversando com os colegiais nas ruas, e durante toda a sua vida, ele teve certeza de que a alfabetização fora o caminho para a liberdade. Quando ele completou 20 anos, conseguiu fugir. Tornou-se um grande orador americano, e chegou a auxiliar o governo do presidente Lincoln. Foi um dos grandes nomes na luta pela abolição dos escravos americanos.

Após a publicação em 1846 do livro The Unconstitutionality of Slavery, de Lysander Spooner, Frederick Douglass passou a ver a Constituição americana como anti-escravidão, mudando sua opinião anterior. Vários abolicionistas famosos usaram a Declaração de Independência americana para atacar a escravidão. O famoso caso Amistad de 1839 foi o primeiro no qual se apelou para a Declaração, e o ex-presidente americano John Quincy Adams fez uma defesa eloqüente dos africanos presos. Seu longo discurso diante da Suprema Corte contou com o seguinte argumento: “No momento em que se chega à Declaração de Independência e ao fato de que todo homem tem direito à vida e à liberdade, um direito inalienável, este caso está decidido”.

Abraham Lincoln foi outro que apelou constantemente à Declaração para defender a causa abolicionista. O texto foi uma vez mais invocado por outro grande defensor da igualdade perante a lei, Martin Luther King Jr. Seu mais famoso discurso, sobre seu sonho de viver numa nação livre, faz alusão direta ao trecho da Declaração onde todos os homens são criados iguais, uma verdade evidente por si mesma. Outro abolicionista conhecido, David Walker, escreveu em 1823 um texto usando os trechos da Declaração, e questionando se os americanos compreendiam o que estava sendo dito ali. Apesar de alguns “pais fundadores” terem tido escravos, numa época onde isso era comum, eles plantaram as sementes da abolição, levantando a bandeira da igualdade de todos perante as leis, como um direito natural.

A luta pela liberdade feminina iria também se apoiar na própria Declaração de Independência, defendendo o direito de igualdade entre os sexos. Em 1848, na Convenção de Seneca Falls, quando Elizabeth Cady Stanton teve a coragem de pedir o empenho de todos para assegurar o voto das mulheres, Frederick Douglass foi o único homem de qualquer grupo étnico a se levantar para dar seu apoio. Ele dizia que se uniria a qualquer um para fazer o que fosse certo, e a ninguém para fazer algo errado. Elizabeth escreveu depois palavras duras contra a Bíblia, na mesma linha de Douglass, afirmando que não conhecia “nenhum outro livro que ensine tão cabalmente a sujeição e a degradação das mulheres”. Douglass não tinha boas coisas a dizer sobre os crentes:

“Afirmo sem a menor hesitação que a religião do Sul é uma simples capa para os crimes mais terríveis – uma justificativa da barbárie mais estarrecedora, uma consagração das fraudes mais odiosas e um abrigo escuro onde os atos mais sombrios, imundos, grosseiros e diabólicos dos senhores de escravos encontram a mais forte das proteções. Se eu fosse de novo submetido às cadeias da escravidão, a par dessa escravização, consideraria ser escravo de um senhor religioso a pior calamidade que poderia me acontecer. […] odeio o cristianismo hipócrita, parcial, corrupto e escravizador desta terra, defensor do chicote para as mulheres e saqueador de berços.”

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Para ser justo, vale notar que grande parte do fermento abolicionista surgiu nas comunidades cristãs, especialmente entre os quacres do Norte. O livro “sagrado” em si, como se nota, não é garantia para nada, pois pessoas imorais conseguem justificar sua imoralidade com ele. No final das contas, o que importa é o caráter dos indivíduos, seus princípios e valores morais, independente do credo, da “raça”, do sexo ou da renda.

Justamente por isso a educação é tão fundamental. Não qualquer “educação”, mas uma postura crítica diante da vida, a vontade de questionar e conhecer. É preciso aprender a aprender. Deve se evitar qualquer tipo de doutrinação, de dogmas seguidos sem reflexão e questionamento. Como escreveu Carl Sagan, “os tiranos e os autocratas sempre compreenderam que a capacidade de ler, o conhecimento, os livros e os jornais são potencialmente perigosos”. Afinal, eles “podem insuflar idéias independentes e até rebeldes nas cabeças de seus súditos”. Lênin e Trotski consideravam as ideias como armas letais, e todas as nações comunistas buscaram o total controle sobre os jornais. A Inquisição católica contou com o Index dos livros proibidos.

Os senhores de rebanhos temem o pensamento independente, a grande ameaça ao seu poder. O controle sobre os corpos dos escravos não é suficiente. É preciso controlar as suas mentes também. Na verdade, controlando as mentes, nem é preciso coerção para comandar os corpos. A maior escravidão de todas, como Frederick Douglass descobriu, é a ignorância. A chave para a liberdade é o conhecimento.

Podcast do Cato Institute:

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Rodrigo Constantino