Antes de mais nada, uma questão conceitual: para liberais, censura é quando o estado intervém para impedir uma manifestação. Se um veículo da mídia se nega a publicar sua opinião, isso não é censura, mas uso de seu direito de propriedade. Você continua livre para emitir sua opinião em outros canais, ou para criar o seu próprio. Cientes disso, os liberais condenam o uso abusivo do termo “censura” por todo aquele que gostaria que sua voz tivesse mais peso.
Dito isso, é inegável que os grandes grupos de Internet viraram os locais de expressão por excelência. Google e Facebook são, hoje, os maiores instrumentos de comunicação no mundo, e como pretendem manter uma imagem de imparciais ou neutros, o uso do termo censura aqui parece fazer algum sentido. O fato preocupante é que esses gigantes têm bancado a polícia do pensamento, e imposto uma conduta politicamente correta que persegue “discursos de ódio”, julgados com uma seletividade assustadora.
Zephyr Teachout escreveu um artigo no Washington Post acusando especificamente o Google de perseguir acadêmicos e jornalistas. Ela cita Tim Wu, o professor de direito da Colômbia, que criou o termo de neutralidade da rede, e fez há uma década esse comentário: “Para amar o Google, você precisa ser um pouco monarquista, você tem que ter fé na maneira como as pessoas tradicionalmente se sentiam sobre o rei”.
Wu, diz ela, estava certo. E agora o Google concentrou enorme poder, chegando a um ponto perigoso comum a muitos monarcas: o momento em que já não quer permitir a dissidência.
Neste verão, revela a autora, uma pequena equipe de pesquisadores e jornalistas respeitados, a equipe do Open Markets no “think tank” da New America, ousou criticar o Google, da maneira mais suave. Quando a União Européia multou o Google por preferir suas próprias empresas subsidiárias às empresas concorrentes nos resultados de pesquisas, era natural que o Open Markets, um grupo dedicado a estudar e a expor distorções nos mercados, incluindo o poder de monopólio, comentasse.
Os pesquisadores publicaram uma declaração de 150 palavras, elogiando as ações da União Europeia. Eles escreveram: “Ao exigir que o Google ofereça o mesmo tratamento aos serviços rivais em vez de privilegiar o seu próprio, [a UE] está protegendo o livre fluxo de informações e comércio de que dependem todas as democracias”.
O Google vem financiando a New America há anos em níveis elevados. Dentro de 24 horas após a declaração, os representantes do Google ligaram para os líderes da Nova América expressando seu descontentamento. Duas alocações planejadas para a equipe do Open Markets foram repentinamente canceladas. Três dias depois, o chefe da equipe do Open Markets, o jornalista Barry C. Lynn, recebeu uma carta do chefe do “think tank”, exigindo que toda a equipe saísse da Nova América.
O motivo? A declaração que elogiava a decisão da UE contra o Google estava, de acordo com a presidente da New America, Anne-Marie Slaughter, “ameaçando a instituição”.
Quando o Google foi fundado em 1998, lembra Zaphyr, ele se comprometeu com o lema: “Não seja mau”. Parece que o Google pode ter perdido de vista o que o mal significa, como acontecia com a maioria dos monarcas: uma vez que você alcança tanto poder, você começa a acreditar que todas as ameaças à sua autoridade são vilões e que você tem o direito de encerrar a dissidência.
Como Lord Acton disse: “O poder despótico é sempre acompanhado de corrupção da moral”. Aqueles com muito poder não podem deixar de ser maus. O Google, a empresa dedicada à livre expressão, escolheu silenciar a oposição, aparentemente sem qualquer senso de ironia.
Quando você é uma start-up idealista, você pode ser revolucionário, atacar o “sistema”. À medida que tem sucesso na empreitada e se torna grande, depois gigante, vira um incumbente que pretende preservar o sistema, impedindo novos concorrentes desafiadores. Isso explica porque o Google já é a empresa que mais investe em lobby no país, gastando mais do que Exxon Mobil, Lockheed Martin ou os irmãos Koch.
É hora de chamar o Google do que ele é, afirma a autora: um monopolista de site de busca, vídeo, mapas e navegador, e um tirano sensível quando se trata de ideias. E, de fato, é escancarado o viés da “censura” aos mais conservadores, como desabafa Leandro Ruschel num texto cuja chamada já faz um alerta grave:
O fim da liberdade na Internet
Nas últimas semanas, tem ocorrido o maior assalto à liberdade de expressão em décadas. As grandes empresas que controlam a Internet estão suprimindo qualquer conteúdo conservador, enquanto nas ruas americanas o direito à reunião pacífica na prática acabou, pois há grupos violentos que impedem qualquer ato.
O primeiro passo de qualquer ditadura é a supressão de informações e de opiniões. Como objetivo hoje é a criação de uma ditadura global, a censura também precisa ser global.
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