Ainda na onda dos 26 anos da queda do Muro de Berlim, seguem trechos sobre o assunto no livro de memórias A Era da Turbulência, de Alan Greenspan:
“Como os Chevrolets 1957 nas ruas de Havana, aquela relíquia (um trator a vapor da década de 1920) representava a diferença fundamental entre sociedades sob planejamento central e sociedades capitalistas: lá não havia destruição criativa, não existia o ímpeto para construir melhores ferramentas.”
“Sem mercados eficientes para determinar a oferta e a demanda, as conseqüências quase sempre são enormes excedentes de produtos que ninguém quer e enormes faltas de produtos que muita gente quer, mas que não são produzidos em volumes adequados.”
“Sem a ajuda de mecanismos de formação de preços, o planejamento econômico soviético não contava com a orientação constante do feedback eficaz. Igualmente importante, os planejadores não contavam com os sinais das finanças para ajustar a alocação das poupanças para investimentos reais produtivos, que acomodassem as mudanças nas necessidades e nos gostos da população.”
“Depois da Segunda Guerra Mundial, as democracias européias se deslocaram para o socialismo e o equilíbrio se inclinou na direção do controle governamental central, mesmo nos Estados Unidos – afinal, todo o esforço de guerra da indústria americana fora obra, na verdade, do planejamento central.”
“Em economia, experimentos controlados raramente são possíveis, mas, com esse propósito, não se poderia desenvolver nada melhor que a comparação entre a Alemanha Oriental e a Alemanha Ocidental, nem mesmo em laboratório. Ambos os países começaram com a mesma cultura, com a mesma língua, com a mesma história e com o mesmo sistema de valores. Então, durante quarenta anos, competiram em lados opostos de uma linha, com muito pouco comércio entre si. A grande diferença sujeita a teste eram os sistemas político e econômico: capitalismo de mercado versus planejamento central.”
“A queda do muro expôs um grau de decadência econômica tão devastador que surpreendeu até os mais céticos. A força de trabalho da Alemanha Oriental, constatou-se, apresentava apenas um terço da produtividade da força de trabalho da Alemanha Ocidental, bem aquém dos 75% a 85% supostos até então.”
“’Fim da União Soviética – Gorbachev, último líder soviético, renuncia; EUA reconhecem independência das repúblicas’, foi a manchete do New York Times de 26 de dezembro – ao deparar com ela, lamentei que Ayn Rand não estivesse viva para vê-la. Ela e Ronald Reagan foram duas das poucas pessoas a prever, algumas décadas antes, que a URSS acabaria implodindo.”
“O colapso do planejamento central não estabeleceu imediatamente o capitalismo, ao contrário das previsões róseas de muitos políticos conservadores. Os mercados ocidentais se erguem sobre vasta base de cultura e de infra-estrutura, que evoluiu ao longo de gerações: leis, convenções e comportamentos, além de profissões e práticas de negócios, que não eram necessárias nas economias sob planejamento central. Forçados a fazer a mudança da noite para o dia, os soviéticos alcançaram não o sistema de livre mercado, mas o do mercado negro. (…) Falta a certeza do direito de propriedade, pino mestre da economia de mercado. (…) Poucas pessoas arriscarão o próprio capital se as recompensas estiverem sujeitas à apreensão arbitrária pelo governo ou pelas massas.”
“Marx de modo algum foi o primeiro a condenar a propriedade privada; a noção de que a propriedade privada é pecaminosa, assim como a obtenção de lucro e o empréstimo a juros, tem raízes profundas no cristianismo, no islamismo e em outras religiões. Apenas com o Iluminismo surgiram princípios opostos, que forneceram a base moral da propriedade, do lucro e do juro. John Locke, grande filósofo britânico do século XVIII, escreveu sobre o ‘direito natural’ de todos os indivíduos ‘à vida, à liberdade e à propriedade’. Essa reflexão exerceu profunda influência sobre os Pais da Pátria americana, e contribuiu para fomentar o capitalismo de livre mercado nos Estados Unidos.”
“A confiança na palavra alheia, principalmente de estranhos, era outro elemento que notoriamente faltava na nova Rússia. Quase não pensamos nessa faceta do capitalismo de mercado, mas ela é crucial. (…) Nas sociedades livres, quase todas as transações são, portanto, inclusive por necessidade, espontâneas. Esses intercâmbios voluntários, por sua vez, exigem confiança. (…) Mas a confiança precisa ser conquistada; a reputação é, em geral, o ativo mais valioso de uma empresa.”
“Por fim, ainda persiste certo protecionismo latente, nos Estados Unidos e alhures, que pode emergir como força poderosa contra o comércio e as finanças internacionais, debilitando o próprio capitalismo de livre mercado, mormente se a economia mundial de alta tecnologia, hoje predominante, perder o viço. Entretanto, o veredicto contra o planejamento central já havia sido proferido, e fora inequivocamente adverso.”
Infelizmente, grande parte do povo brasileiro ainda não acordou para esse fato!
Rodrigo Constantino