Hoje, sexta-feira 13, o Brasil comemora o Dia Mundial do Rock. Segundo a Wikipedia, eis o motivo: “A data celebra anualmente o rock e foi escolhida em homenagem ao Live Aid, megaevento que aconteceu nesse dia em 1985. A celebração é uma referência a um desejo expressado por Phil Collins, participante do evento, que gostaria que aquele fosse considerado o “dia mundial do rock”. O evento também ficou conhecido por contar com grandes artistas do gênero, como Queen, Mick Jagger, Keith Richards, Ronnie Wood, Elton John, Paul McCartney, David Bowie, U2 entre outros”.
Ainda que a maioria da lista seja considerada mais pop do que rock de fato, tudo bem: celebremos o rock & roll. E aproveito a ocasião para uma breve digressão sobre a ligação entre o rock e a liberdade. Em Esquerda Caviar, dediquei algumas linhas à reflexão da influência do rock na cultura, especialmente nos jovens:
Também não pretendo falar desse ímpeto juvenil na busca pelas “verdades absolutas” em um tom totalmente negativo. Acredito que os questionamentos ousados, os desafios às tradições estabelecidas e até esse espírito revolucionário possuem suas vantagens. Diria mais: podem ser fundamentais para o contínuo progresso da civilização.
O movimento de Maio de 68, ícone da juventude por excelência (“não confie em ninguém com mais de trinta anos”), merece inúmeras criticas, e seu saldo é claramente negativo, origem de muitos problemas sociais existentes hoje, entre os quais o relativismo moral, o consumo desenfreado de drogas e o afrouxamento dos limites que educam e servem até para a “castração” do sujeito, crucial ao desenvolvimento de sua singularidade.
Creio, porém, que não podemos ignorar outro lado, o do grito rebelde contra certa hipocrisia, contra o excesso de hierarquia patriarcal, contra os podres do sistema. São os jovens que, com rebeldia e perguntas incômodas, não raro com um ponto de vista mais fresco, forçam novas reflexões sobre o mundo. Aplaudo essa postura, mas não posso ignorar seus riscos.
Essa ambiguidade é bem retratada quando analisamos o impacto do rock nas culturas. Roger Kimball, em The Long March, destaca a importância daquela modalidade musical na revolução cultural da nova esquerda desde os anos 1960, levando vários jovens às drogas, disseminando o ideal libertino, hedonista, liderado por bandas como os Rolling Stones e os Beatles, entre outros.
Já Tom Stoppard mostra o outro lado em sua peça Rock ‘N’ Roll, dedicada a Václav Havel. Stoppard, concordando com Havel, argumenta que o rock foi um ato de rebeldia contra o regime comunista na Tchecoslováquia. Jovens que não aceitavam ser manipulados pelo regime encontraram na música uma válvula de escape. Ir a um show de rock já poderia ser visto como um ato rebelde.
No Brasil, o rock era visto como submissão “imperialista”, pois vinha dos Estados Unidos (pouco importa que o futebol tenha vindo da Inglaterra e se tornado a maior paixão popular). Até passeata contra a guitarra elétrica foi realizada pelos nacionalistas de esquerda, os engajados da MPB. Lobão, em Manifesto do nada na terra do nunca, reconhece o dilema:
Ser roqueiro e ser de esquerda chegou a ser um paradoxo, pelo menos nestas plagas, assim como em Cuba. Contudo, no primeiro mundo era uma conduta antiestablishment, antissistema, um comportamento pacifista de hippie e sandinista, de punk. Na verdade, na América, desde o movimento beatnik e a música folk de protesto, havia um sério engajamento de tendência socialista e antigoverno, principalmente depois do assassinato de John Kennedy, eclodindo em todo o seu esplendor na Guerra do Vietnã.
O rock pode ser protesto legítimo, ou pode ser convite às drogas. Um fato, contudo, é inegável: a rebeldia da juventude tem seu valor, mesmo que alimentada por letras e músicas que estimulem um comportamento irresponsável e imediatista. Dosar esse ímpeto rebelde, em busca de tantas certezas, com o equilíbrio da maturidade é uma arte complicada, não livre de inúmeros riscos.
E esses surgem justamente quando as utopias simplistas viram crenças fanáticas, quando os jovens acabam vítimas de oportunistas de plantão, que utilizam o romantismo típico da juventude como massa de manobra para seus objetivos pérfidos. A contracultura pariu inúmeros “gurus” que levaram a juventude ao caminho errado, que influenciaram negativamente toda uma geração. Os jovens são presas mais fáceis desses malucos ou oportunistas.
Dito isso, num mundo cada vez mais chato e politicamente correto, parece inegável que o bom e velho rock & roll tem bastante a colaborar, nem que seja para chacoalhar a turma Nutella, sacudir alguns flocos de neve. Roqueiro que se preza ignora essa chatice toda de ecoterroristas, veganos, desarmamentistas e guerreiros da justiça social. Não por acaso Bene Barbosa tem usado a data para publicar fotos com roqueiros e suas armas. Eis aqui uma delas, com o “conserva” Roger, do Ultraje a Rigor:
Um ícone dessa postura “macho man” associada ao rock é James Hetfield, cantor do Metallica.
Não por acaso ele não suportou continuar na Bay Area da California, que considerava “elitista” demais. Hetfield critica os “liberais” que falam em diversidade o tempo todo, mas não toleram o diferente, e cita como exemplo a reação se alguém aparecer com um animal abatido em caça:
Temos também a figura de Bruce Dickinson, líder do Iron Maiden, que já foi tema desse e desse texto no blog. Temos o Rush, influenciado por Ayn Rand, que culpa os socialistas pela perda de nossas liberdades. Enfim, os exemplos são vários, e a direita tem motivos de sobra para admirar o legado do rock.
Será que tudo isso são águas passadas, porém? Será que estamos condenados a ouvir Justin Bieber agora? O rock morreu? Como diria Mark Twain, parece que as notícias sobre sua morte são um pouco exageradas. O obituário pode ter sido precoce demais. E como prova vou mostrar uma só banda, Greta Van Fleet, da garotada de Detroit, com seus vinte aninhos, tocando rock de verdade, a ponto de a lenda Robert Plant, líder do Led Zeppelin, reconhecer o fenômeno:
Para quem não conhece (e não sabe o que está perdendo), eis a música “Safari” ao vivo:
Há quem diga que o som é pauleira sim, mas plágio demais do “pai” Led Zeppelin, com uma inspiração muito evidente. Pode ser. Mas há outras músicas menos óbvias, e todas são excelentes (recomendo particularmente “Black Smoke Rising”). Quando descobri a banda, confesso que o som deles não saiu dos meus devices por duas semanas seguidas. Termino com essa constatação pura e simples na homenagem ao rock: numa geração que produziu Greta Van Fleet, nem tudo está perdido! Ainda há esperanças…
Rodrigo Constantino
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