“Nós demandamos regras, padrões, valores – sozinhos e juntos. Nós somos animais de carga, bestas do fardo. Devemos carregar uma carga, justificar nossa existência miserável. Exigimos rotina e tradição. Isso é ordem.” – Jordan Peterson
Peço vênia aos leitores para dar uma pausa no assunto Lula e falar de outra coisa quase tão indecente. No meu círculo de amizades e em minha timeline não há quem acompanhe o Big Brother Brasil, pois procuro dar uma filtrada em que tipo de gente mantenho por perto. Mas o troço não estaria chegando em sua vigésima edição se não tivesse audiência. Logo, e apenas por isso, o que se passa lá é notícia e pode – deve – ser comentado aqui, caso ultrapasse os limites do aceitável, mesmo para os padrões do Projaquistão.
Trata-se, afinal, de um sintoma da sociedade brasileira, ou ao menos da elite “progressista” brasileira. É um termômetro moral da nação, digamos. E se aceitarmos essa premissa, então a conclusão é uma só: somos uma nação doente, desamparada, perdida, mergulhada no caos moral.
Não falo “apenas” das tais cenas chocantes da família Lima, em que o pai dá um “selinho” demorado na filha e depois se esfrega em cima dela, deitados na cama. Falo da própria reação da imprensa e de algumas pessoas, que tentaram justificar aquilo que, para quem não perdeu o juízo, só tem um termo a definir: incesto. Comentei no meu Facebook:
Como se não bastasse, a emenda saiu pior do que o soneto. Numa reportagem publicada no próprio Globo, um amigo da garota foi entrevistado, e procurou justificar a coisa com uma declaração absurda, que deu manchete à matéria: pai e filha possuem uma “relação aberta”. Como assim? Que raio de relação aberta é essa?
Primeiro, a reportagem dá a entender que o caso “dividiu opiniões”, como se fosse uma grande polêmica meio a meio, e não uma imensa maioria chocada com o baixo nível em que o programa chegou. Depois, mostra como o pai é um idiota “adultescente”, querendo bancar o coleguinha da filha e de seus amigos, o cara “prafrentex” que vai para a balada com a garotada.
Por fim, diz que o cara “mesmo assim” tem ciúmes dela. Ora, tem ciúmes, pelo visto, pois confunde o papel de pai com o de namorado! Mas para quem pensa que a tentativa de se quebrar mais esse tabu é novidade, cuidado: você pode estar enganado. Alexandre Borges já comentou outros programas com essa pauta na emissora:
A trama de “Sete Vidas” girou em torno da paixão entre Pedro (Jayme Matarazzo) e Júlia (Isabelle Drummond) que pensavam que eram irmãos. Eles chegam a se beijar para só depois descobrirem que não estavam iniciando um relacionamento incestuoso.
Na conversa que aparece no vídeo, Bernardo (‘Ghilherme Lobo”) pergunta ao protagonista Pedro, que é biólogo, porque “irmão não pode namorar com irmão”, que é exatamente o dilema que Pedro está imerso. Além de biólogo, ele era um ativista e ambientalista.
Em tom professoral, Pedro “explica” a Bernardo que:
– “Existem riscos” de filhos de irmãos nascerem com problemas, mas não é nada tão “matemático” (ou seja, não é lá tão arriscado)
– A biologia e a “natureza” não condenam o incesto, que é um “tabu religioso”
– “Tabu” é uma “proibição” que ninguém ousa contestar
– A “natureza” não sabe que o incesto é proibido, portanto fica implícito que o impedimento não é “natural”, mas uma imposição
– Depois, Pedro discorre sobre a proibição do incesto ser considerado por alguns um pilar da sociedade e que isto provoca sofrimento e dor nos envolvidos.
– Ao ser perguntado se “sempre foi assim” por Bernardo, Pedro cita “Édipo Rei”, a clássica tragédia de Sófocles em que o protagonista se envolve com a mãe sem saber do parentesco.
– “Édipo Rei”, é bom lembrar, já inspirou outra novela da Globo nos anos 80 (Mandala, de Dias Gomes), com Vera Fischer no papel de Jocasta e Felipe Camargo como Édipo e Perry Salles como Laio. Ao melhor estilo “a vida imita a arte”, Vera Fischer foi casada na vida real com ambos.
– Pedro fica reflexivo e termina dizendo que “se a proibição foi tão forte [do incesto] é porque “o desejo tinha muita força”.
A “lição” dada pelo personagem (e exibida às seis da tarde em TV aberta) é que a natureza permite o incesto, que o desejo sexual por parentes próximos é algo natural, mas a religião e a sociedade criaram um “tabu” para reprimir o desejo criando infelicidade e frustração.
Para o biólogo ativista com tara pela mulher que ele acreditava ser sua irmã, a igreja é um empecilho que cria um muro entre sua libido e a realização do desejo. Quem escreveu o diálogo não sabe, mas fez um elogio involuntário à moralidade cristã.
Para o espectador médio, fica a impressão de que tudo que seus instintos fisiológicos ditam é “natural”, um termo que tanto pode se referir a algo “da natureza” quanto algo “comum”, como quando se diz “é natural ver aberrações nas novelas”. “Natural” pode ser entendido como algo normal, nada extraordinário ou exótico.
O público é levado a acreditar que o papel da moral e da religião é refrear os instintos fisiológicos, o que em parte é verdade, mas fica implícito que isso é algo ruim, já que a criação de um “tabu” foi necessária porque “o desejo tinha muita força” e a não realização do desejo é algo trágico, causa de sofrimento e dor a quem apenas quer “amar”, o que é coerente com o bordão “toda forma de amar vale a pena”.
Na cabeça de certos progressistas, fazer sexo com o pai, a mãe, os irmãos ou os filhos é respeitar a própria natureza e um ato contra a família burguesa e cristã responsável por todo tipo de frustração amorosa em quem só quer “amar”. Some isso à narrativa mais recente de que a igreja é um antro de pedófilos e pervertidos e a autoridade moral do cristianismo fica indefensável.
Há uma agenda cultural avançando e que busca a volta do homem ao paleolítico inferior, período no qual as primeiras famílias surgiram, e também ao hedonismo mais radical e irrefreável. Neste sentido, é preciso confrontar a “moral cristã” de todas as formas possíveis, especialmente na cultura popular.
O “progresso”, para alguns, levará o homem a agir como um cão. É preciso “quebrar os tabus” para essa turma, pois liberdade, segundo eles, é ausência de qualquer restrição, freio moral, julgamento, controle de apetites. Se tivessem lido Burke ou Freud saberiam que é justamente o contrário: a civilização e a liberdade só chegam quando aprendemos a dominar os instintos, os apetites, os desejos, os impulsos carnais, a “pulsão de morte”.
Estou lendo o novo livro de Jordan Peterson, o professor canadense, psicanalista clínico e pensador conservador popular na internet. Ele apresenta 12 regras para uma vida boa, madura, com sorte feliz (mas essa não pode ser a única meta), contra o caos do niilismo ou do hedonismo irresponsável. É livro para adultos, não para “adultescentes” ou “liberteens”. Recomendo.
Desconfie daqueles que estão “quebrando tabus”, vendendo por aí libertinagem como sinônimo de liberdade, estimulando um comportamento animalesco como se fosse “progresso”. Essa gente deveria estar sentada no divã de um bom psicanalista, espécie cada vez mais rara, quiçá em extinção, pois a maioria foi tomada pela “lacanagem” libertina da esquerda.
Não há “polêmica” alguma nisso tudo. Há, sim, uma agenda imoral, indecente, depravada, de quem permitiu que o caos tomasse conta de suas vidas, e agora quer impor sua deformação moral a todos.
Rodrigo Constantino