O senador José Serra, em artigo publicado hoje no Estadão, acusa a decisão do governo de liberar o FGTS de populista e heterodoxa, mesmo vindo de uma equipe econômica ortodoxa. Para Serra, um dos tucanos mais esquerdistas, isso significa sacrificar poupança e investimento em prol do consumo, e poderá afetar negativamente o trabalhador:
É preciso lembrar que os saques são realizados pelos trabalhadores mais em razão de demissões sem justa causa e de aposentadoria. E 84% dos cotistas do FGTS têm saldo acumulado de até um salário mínimo. Criar uma modalidade permanente de saques das contas do FGTS é uma medida populista que compromete investimentos subsidiados pelo fundo e deixará a maioria dos trabalhadores sem recursos na demissão e na aposentadoria.
Serra defende o uso atual dos recursos, basicamente para subsidiar investimentos habitacionais, e banca o advogado de defesa dos empresários que se organizaram para reclamar com o governo, fazendo lobby pela manutenção do fundo: “Expande-se a demanda das pessoas por bens e serviços à custa do encolhimento potencial das operações de investimentos subsidiadas pelo fundo. Não é por menos que porta-vozes das empresas de construção habitacional assumiram atitude crítica diante do anúncio”.
O senador tem razão? De forma bem simples e direta, não. Ele tem até um ponto: liberar o FGTS pode estimular consumo mesmo, mas isso só se as famílias resolverem gastar dessa forma os recursos, que são seus! E eis o ponto essencial aqui: a premissa por trás da mentalidade de Serra é que o indivíduo gasta mal seu próprio dinheiro, e que o governo deve decidir por ele, criando uma “poupança forçada”.
Esse ato de reter de forma compulsória o recurso do trabalhador e decidir como usar é visto por Serra como louvável e positivo, enquanto para os liberais é claramente um ato de confisco e ineficiente. O FGTS historicamente rende muito pouco e o resultado é esse: grandes empresários influentes pressionam o governo para que gaste os recursos de forma subsidiada em seus setores, em empreendimentos imobiliários que muitas vezes sequer fazem sentido econômico.
Ou seja, o trabalhador pobre sustenta o empresário rico, e o esquerdista Serra aplaude. A medida, segundo a equipe econômica, tem cunho justamente liberal, ou seja, devolver os recursos aos próprios trabalhadores. Adolfo Sachsida, secretário de Economia do governo Bolsonaro, enviou uma apresentação nesta quarta com vários dados e argumentos que sustentam a decisão, e fica claro o objetivo liberal de longo prazo, mais do que o estímulo “populista” de curto prazo (que existe).
Efeitos imediatos:
- 81% das contas tem valor inferior a R$ 500
- 54,7 milhões de trabalhadores têm menos de R$ 500,00 na soma de suas contas
- 37,3% das pessoas que estão com nome negativado tem dívidas inferiores a R$ 500
- 23 milhões de pessoas poderão quitar sua dívida
- Trabalhadores têm R$ 419 bilhões nas suas contas do FGTS.
- Ao mesmo tempo as regras de saque são muito restritas impedindo seu uso pelas famílias.
- O endividamento das famílias está muito elevado (63,2 milhões de pessoas com dívida atrasadas, dados da Serasa Experian), e num patamar crescente.
- Atualmente, 3,8 milhões de famílias nas capitais estão com contas em atraso, e 1,6 milhão não tem condição de pagar as dívidas atrasadas.
- Além disso, os recursos dos trabalhadores rendem historicamente abaixo da inflação no FGTS. Assim, quando os trabalhadores conseguem sacar os valores já estão muito defasados.
Esses são alguns dos dados divulgados. Para a equipe econômica, a regra atual do FGTS contribui para severas distorções no mercado de trabalho. Produz elevada rotatividade, informalidade, baixa produtividade e acaba elevando o desemprego. Os objetivos com as mudanças, portanto, seriam devolver ao trabalhador um recurso que é seu, aumentar a remuneração do trabalhador sem onerar os empregadores, e elevar a produtividade no mercado de trabalho. Não parecem intenções populistas…
Em resumo, é preciso questionar a premissa: ou você concorda com Serra e acha que o trabalhador não merece liberdade para escolher o destino de seu próprio dinheiro, ou concorda com os liberais da equipe econômica e aceita que não cabe ao estado decidir como e onde gastar o dinheiro do trabalhador. Populismo? Não! É liberalismo mesmo, senador!
Rodrigo Constantino
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