Por Juliano Rafael Teixeira Enamoto, publicado pelo Instituto Liberal
Caros leitores, apoiadores e patrocinadores do Instituto Liberal, escrevo este artigo para alertar a todos nós, entusiastas da liberdade, em quaisquer das suas inúmeras dimensões (políticas, econômicas, sociais, etc), que um dos maiores marcos civis que entusiasmou a todos nós corre severo risco de cair.
Sim, infelizmente estou me referindo à Medida Provisória nº881/2019, tão carinhosamente conhecida como MP da Liberdade Econômica, algo que deixou em êxtase dos amantes e estudiosos antigos nesta Terra de Santa Cruz aos neófitos liberais e conservadores que emergiram nos últimos anos.
Um anseio de muitos empreendedores, que almejam uma fresta de liberdade para empreender, trabalhar e lucrar! Esta Declaração Fundamental de Direitos da Liberdade Econômica, que impôs uma simbólica vitória da Liberdade, corre sério risco de perder a validade.
Insta registrar que a primeira votação que ocorreu na Câmara dos Deputados contou com hercúleo trabalho de deputados alinhados com a pauta liberal, ficando o registro (que é histórico) da habilidade do Relator em conciliar inúmeras demandas, apaziguar ânimos de deputados não alinhados com a pauta liberal e ainda vocalizar em seu relatório o “Espírito da Liberdade” que tomou recentemente um “Zeitgeist”.
Conforme consta na Constituição Federal em seu artigo 62§3º, o prazo de validade da Medida Provisória é de 60 (sessenta) dias, prorrogável por mais 60(sessenta)dias[1]. A supramencionada Medida Provisória, foi editada no dia 30/04/2019, sendo que o Ato nº40/2019 da Presidência da Mesa do Congresso Nacional, de 24/06/2019, de autoria do Excelentíssimo Senhor Presidente da Mesa do Congresso Nacional, Senador Davi Alcolumbre, prorrogou por mais 60(sessenta)dias.
A dilatação do prazo não foi suficiente para discussão e a votação no Senado Federal. Atribuir a uma causa única a razão de tamanha letargia seria por demais irresponsável, mas inúmeros fatores contribuem para o atraso. Além da notória inabilidade de articulação política do Governo, há nuances obscuros e de uma zona cinzenta da política, seja em aumento de poder de senadores desprestigiados na distribuição de cargos ou atendimento de demandas regionais; há ainda em curso a iminente indicação do Deputado Federal Eduardo Bolsonaro (o qual necessita da sabatina do Senado Federal, conforme dispõe o artigo 52 inciso II, alínea “f[2]” da Constituição Federal, bem como artigo 39 da Lei Federal11.440/2006[3]), futura aprovação do Procurador Geral da República (conforme dispõe o artigo 52 inciso II, alínea “e” da Constituição Federal), ou seja, há um balcão de negociação entre as demandas do Governo e anseios de senadores. Afirmar qual dos lados deste balcão contém a virtude seria prematuro. Conforme afirmei há uma área cinzenta nesta política. A melhor definição deste quadro é diagnosticada por Shakespeare na obra Hamlet em seu ato I Cena V: “ Há mais coisas entre o céu e a terra, Horácio, do que sonha nossa vã filosofia”.
Some-se ao fato que houve (para novidade dos juristas) a judicialização do tema, por parte de alguns parlamentares, o que adiciona mais instabilidade jurídica no ambiente de negócios e na expectativa da votação e derradeira conversão da Medida Provisória 881/19 em Lei.
O quadro é perigoso e de certo desalento, conforme reportagem do dia 04/09/2019 ao site O Antagonista[4]. Há um claro tom de perigo quanto à votação no Senado Federal, explicitado pelo deputado federal Jerônimo Goergen: “Estes movimentos do Congresso põem em risco a MP. Estou em contato com o governo para que o texto seja logo sancionado. Se demorar, vai ser muito difícil que a Câmara vote a proposta até a próxima terça-feira.”
A relatoria da MP no Senado Federal ficou à cargo da senadora Soraya Thronicke do PSL/MS. Meus caros, acompanhando a tramitação no Senado Federal[5], realmente é preocupante: houve alteração substancial no texto, desnutrindo inúmeras propostas apresentadas e aprovadas pelos Deputados Federais, e por esta razão a matéria deveria ter voltado para a Câmara dos Deputados para nova votação (ou então não deveria ter ocorrido a alteração, que incorre na obrigação do retorno da matéria para a “Casa Iniciadora”). Alia-se isso ao estranho comportamento do presidente do Senado Federal em remeter o texto com alterações para a Presidência da República e não à Câmara dos Deputados.
O perigo legislativo ocorre porque a perda de validade de uma Medida Provisória acaba por impedir a sua reedição na mesma sessão legislativa[6], ou seja, todas essas vitórias desapareceriam, como diria o icônico personagem Roy Batty: “Todos esses momentos se perderão no tempo, como lágrimas na chuva. Hora de Morrer”.
Atualmente, conforme é possível verificar no site do Senado Federal, a matéria foi enviada para sanção do Presidente da República (segundo consta no sítio oficial do Planalto, a Medida Provisória está em tramitação, ou seja, não foi convertida em lei, estando em um estado intermediário, gerando insegurança jurídica), mesmo em flagrante desacordo com o que dispõe a matéria, seja no aspecto regimental ou constitucional, que torna cogente o retorno da matéria à Câmara dos Deputados. Tal ato incorre em trazer vício imaculável, que pode tornar a Medida Provisória passível de judicialização. Neste caso, há jurisprudência específica que afirma que o prazo para deliberação de matéria seria de 6 (seis) dias. Contudo, não há tempo hábil e tudo que tínhamos para comemorar em uma matéria importante do ponto de vista liberal está prestes a ruir diante de inúmeros atos do Senado Federal, pondo a perder a Medida Provisória 881/2019.
[1] Art. 62. Em caso de relevância e urgência, o Presidente da República poderá adotar medidas provisórias, com força de lei, devendo submetê-las de imediato ao Congresso Nacional.
- 3º As medidas provisórias, ressalvado o disposto nos §§ 11 e 12 perderão eficácia, desde a edição, se não forem convertidas em lei no prazo de sessenta dias, prorrogável, nos termos do § 7º, uma vez por igual período, devendo o Congresso Nacional disciplinar, por decreto legislativo, as relações jurídicas delas decorrentes. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 32, de 2001)
[2] Art. 52. Compete privativamente ao Senado Federal:
I – aprovar previamente, por voto secreto, após argüição pública, a escolha de:
- f) titulares de outros cargos que a lei determinar;
[3] Art. 39. Mediante aprovação prévia do Senado Federal, os Chefes de Missão Diplomática Permanente e de Missão ou Delegação Permanente junto a organismo internacional serão nomeados pelo Presidente da República com o título de Embaixador.
[4] <https://www.oantagonista.com/brasil/mp-da-liberdade-economica-sob-risco/>Acesso no dia 05/09/2019
[5] <https://www.congressonacional.leg.br/materias/medidas-provisorias/-/mpv/136531> Acesso no dia 05/09/2019 as 10:20hs
Art. 62. Em caso de relevância e urgência, o Presidente da República poderá adotar medidas provisórias, com força de lei, devendo submetê-las de imediato ao Congresso Nacional.
- 10. É vedada a reedição, na mesma sessão legislativa, de medida provisória que tenha sido rejeitada ou que tenha perdido sua eficácia por decurso de prazo.
*Juliano Rafael Teixeira Enamoto é católico e servidor público municipal.