Duas falácias são repetidas ad nauseam pela esquerda: que a Crise de 29 foi causada pelo livre mercado, e que o intervencionismo estatal salvou o capitalismo em seguida. Aqui, resgatei um texto para rebater a primeira acusação. Agora, resgato outro para derrubar a segunda. Trata-se de uma resenha do excelente livro de Amity Shlaes sobre o assunto.
Lições da Grande Depressão
“Aqueles que não conseguem se lembrar do passado estão condenados a repeti-lo.” (George Santayna)
Smoot-Hawley Tariff Act. National Credit Corporation. Reconstruction Finance Corporation. Farm Credit Act. Banking Act. National Industry Recovery Act. Farm Mortgage Refinancing Act. Export-Import Bank. Home Owners Loan Act. Securities and Exchange Act. Communications Act. National Housing Act. Emergency Relief Appropriation Act. Works Progress Administration. Rural Electrification Administration. Wagner Act. Fair Labor Standards Act. Social Security Act. Revenue Act.
Essas são apenas algumas medidas adotadas por Roosevelt (à exceção das duas primeiras, de Hoover) durante a Grande Depressão. O New Deal foi um programa de enorme hiperatividade e crescimento do papel do governo na economia. O resultado, ao contrário do que muitos acreditam, foi péssimo.
O livro The Forgotten Man, de Amity Shlaes, relata com detalhes a história dessa complicada fase americana. Durante uma nova crise de proporções assustadoras, resgatar na história os erros do passado pode servir para evitá-los no presente. A arrogância dos políticos em Washington, confiantes de que poderiam resolver a crise com canetadas e aumento de gastos públicos, ajudou muito a postergar a recuperação da economia.
Havia uma sensação bastante disseminada de que somente enormes intervenções estatais poderiam reanimar a economia. No mundo, a Itália de Mussolini e a União Soviética de Stalin conquistavam muitos adeptos do dirigismo estatal, intelectuais e economistas que acreditavam no planejamento central do governo como locomotiva do desenvolvimento. Eles estavam errados, naturalmente.
A retórica de Roosevelt era bastante populista, e seus constantes ataques aos negócios privados geraram um clima de insegurança generalizada. As medidas do New Deal dificultaram a vida das empresas ainda mais do que a crise já fazia. Os impostos aumentaram, o império da lei foi trocado pela arbitrariedade do governo, e as greves e salários maiores, resultados do Wagner Act, aumentaram os custos numa época em que era fundamental reduzi-los para a sobrevivência.
O governo de Roosevelt sistematizou as políticas de grupos de interesse, e a menor minoria de todas – o indivíduo – era o “homem esquecido” que pagaria a conta. Roosevelt focava apenas naquilo que se vê, ignorando tudo aquilo que não se vê, para usar os termos de Bastiat. Os defensores do New Deal, muitos deles simpatizantes do modelo soviético, criaram um clima de hostilidade aos empresários, assim como um ambiente de polarização no país. Os duros ataques aos “ricos” – lembrando que FDR era um homem rico – serviam para alimentar a revolta dos pobres, mas não para reduzir a pobreza.
O protecionismo comercial, sempre tentador para políticos em épocas de crise, jogou a economia americana numa depressão ainda maior. Hoover assinou o Smoot-Hawley Tariff Act, mesmo com mais de mil economistas escrevendo uma carta aberta onde tal medida era duramente condenada. A medida se mostrou catastrófica, e retaliações ocorreram no mundo todo. As importações americanas caíram mais de 40%.
Atualmente, o presidente Obama parece condenar verbalmente a cláusula protecionista do seu pacote multibilionário, mas se não vetar de fato esta medida, poderá estar dando o mesmo tiro no pé que Hoover deu no passado. Fechar-se em um momento de crise apenas agrava a crise.
Outra característica muito presente nos discursos de Roosevelt foi a busca por bodes expiatórios. A depressão, segundo Roosevelt, era o resultado da falta de honra da elite, e a “ganância nacional” era a causa moral dos problemas. Mirar em inimigos de classe como alvos tornou-se a marca registrada de Roosevelt. Era chegada a hora de os ricos dividirem seus recursos com a sociedade. A atenção deixava de ser o crescimento econômico para todos, e passava a ser a distribuição do bolo existente, ou declinante.
Não por acaso os líderes soviéticos foram um dos grupos mais entusiasmados com a vitória de Roosevelt sobre Hoover. O presidente, em sua cadeira de rodas, era visto como o grande salvador da pátria, o homem que iria assumir o controle da economia e fazê-la retomar sua trajetória de crescimento da década de 1920. O sonho não iria se realizar.
O começo do governo Roosevelt ficou conhecido como “os cem dias”, um período frenético de medidas estatais experimentais. Em um ano, algo como 10 mil páginas de leis foram criadas, quase quatro vezes a quantidade que constituía o estatuto federal até então. O governo jogou no lixo o padrão-ouro, e confiscou todo o metal em posse dos cidadãos, tornando ilegal comprar ou exportar ouro. Roosevelt declarou um feriado bancário para resgatar a confiança no setor, mas isso não adiantou. O que importava era passar a imagem de que o governo estava agindo, estava preparado para mudar as coisas.
O primeiro grande projeto foi o National Industry Recovery Act, com a premissa de que os gastos do governo iriam criar empregos e consertar a economia. O que veio em seguida, a criação do National Recovery Administration, faria os projetos anteriores parecerem pequenos. O NRA, com seu emblema da águia azul, representou o passo mais ousado dos Estados Unidos rumo ao socialismo. O governo iria decidir preços, controlar a produção das empresas e fazendas, enfim, em termos econômicos os americanos estavam se aproximando da realidade nazista da Alemanha e comunista da União Soviética. O senador Thomas Gore, do Partido Democrata, chegou a questionar de forma sarcástica sobre as medidas do governo: “Isso não é socialismo?”
O maior empecilho para tais planos eram as instituições mais sólidas nos Estados Unidos, como a Corte Suprema, que declarou vários casos inconstitucionais. Os pequenos empresários eram os que mais sofriam com o excesso de regulação do governo. O NRA representava, como coloca Shlaes, a institucionalização dos cartéis. Foi em 1935 que o famoso jogo Monopólio foi criado. Ciente dos entraves através dos juízes guardiões da Constituição, Roosevelt defendeu com vontade a meta de aumentar o número de juízes, para poder indicar gente sua. Felizmente, para os americanos, essa idéia não foi adiante, sendo barrada no Congresso.
A máquina de gastos públicos estava ligada a todo vapor, mas a economia se negava a melhorar. Os gastos federais em 1935 eram o dobro do patamar de 1930. Mas quase 12 milhões de americanos estavam sem emprego ainda. A centralização era outro ponto grave: pela primeira vez nos Estados Unidos em tempo de paz, o gasto federal ultrapassava o de todos os estados e localidades. A República americana, que preservara até então as liberdades individuais, dava lugar à Democracia de massas, uma espécie de “ditadura da maioria” com o poder concentrado no Executivo.
Roosevelt iria ignorar os alertas dos “pais fundadores” e concorrer a um terceiro mandato. O estrago de Roosevelt às liberdades iria alcançar até mesmo o seu próprio conceito: “liberal” passava a significar, para os americanos, o defensor de mais governo, e não de um governo bastante limitado, como o liberalismo sempre pregou.
No entanto, nada disso parecia melhorar a vida dos americanos, especialmente os mais pobres, os “homens esquecidos”. A renda per capita americana, segundo a The Economist, estava no mesmo nível da inglesa no final dos anos 1930, sendo que havia sido um terço superior no começo da década. O índice de ações Dow Jones só iria retornar ao patamar de 1929 no final de 1954, quase uma década após a morte de Roosevelt. Em 1937, ocorreu outra depressão dentro da Grande Depressão, e o índice chegou a cair mais de 40%. O desemprego em 1938 ainda estava acima de 17%. De qualquer ângulo observado, o New Deal fracassou. Em vez de recuperar a economia, ele criou mais barreiras aos negócios, gerou mais incertezas e afastou investimentos produtivos, postergando a recuperação.
Diante desses fatos, e lembrando que a história muitas vezes rima, parece impossível evitar calafrios com os acontecimentos atuais. Novamente o governo tem sido visto como a grande salvação para os males do mundo, e Obama é o novo profeta que vai gastar de forma alucinada para reativar a economia. O governo vai usar sua “mão benevolente” para ajudar os que precisam. Mas ignora-se que para ele dar alguma coisa, antes precisa tirar, ou então hipotecar o futuro das próximas gerações.
Se com uma mão ele oferece ajuda, com a outra ele tira mais recursos do bolso de cada um. A mesma retórica populista tem sido usada, o mesmo ataque à “ganância”, a busca por bodes expiatórios do setor privado. A iniciativa privada vai sendo tolhida pela crescente intervenção estatal. As lições da história são ignoradas. O preço poderá ser alto demais. Sabemos quem vai ter que pagar a conta: os homens esquecidos.
Rodrigo Constantino
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