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Jantar em família é algo de que não abro mão. É neste momento que podemos conversar melhor com os filhos, e eles aprendem também sobre postura diante dos outros, limites de comportamento e a dialogar (escutar além de falar). Nesta quarta o clima foi quente, mas a lição, creio, fundamental. Minha filha adolescente chegou com um discurso em prol do relativismo moral, alegando que não sabe o que faria se fosse pobre, e que talvez seja compreensível esses marginais roubarem por desespero.

Senti, imediatamente, que não era ela falando, mas alguma professora de esquerda. Líquido e certo. Ela confessou que tinha escutado isso da professora naquele dia. A doutrinação começa cedo, cada vez mais cedo, e mesmo em escolas particulares e tradicionais. Todo cuidado é pouco. Iniciei, portanto, o processo de desintoxicação para torná-la mais imune a essa tentativa abjeta de lavagem cerebral.

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Primeiro, expliquei que “furto famélico”, de que ela falava, era coisa muito rara atualmente. Ninguém mais rouba na penúria só para comer, por fome, ainda mais em país em “pleno emprego” e com esmolas estatais para todo lado. Os galalaus roubam por vários outros motivos, não por desespero causado pela falta de comida.

Em segundo lugar, perguntei se ela achava que realmente seria capaz de apontar uma arma para a cabeça de um inocente, pelo motivo que fosse. Conhecendo os valores absorvidos por ela e sua empatia para com o próximo, já sabia a resposta. Após rápida reflexão, ela teve de admitir que não se imaginava fazendo nada disso, mesmo em desespero.

Passei, então, a explicar que há basicamente dois grupos de pessoas: os que têm valores e dignidade, e os que não têm. E não é a conta bancária que os separa! Mostrei como seu discurso era, inclusive, ofensivo para com nossa empregada, que dá um duro danado para se manter com honestidade e dignidade. Lembrei que a maioria dos moradores de favelas é gente trabalhadora, apesar do entorno, e que muitos bandidos são de classe média, alguns até graduados.

A narrativa de vitimização da bandidagem não é algo novo. Desde os anos 1960 que isso começou a ganhar força. Teve até um livro famoso que falava do “crime da punição”, ou seja, o crime verdadeiro era prender o bandido! A tentativa de retirar a responsabilidade individual por seus atos vem de longa data, com a adesão maciça de muitos sociólogos, psicólogos, antropólogos, enfim, a turma das “humanas”. O criminoso, dizem, é uma marionete da biologia, visto como um objeto em vez de sujeito, ou uma esponja do ambiente, incapaz de decidir por conta própria, de escolher seu curso de ação.

Por acaso estava lendo ontem o livro Not With a Bang But a Whimper, do psiquiatra britânico Theodore Dalrymple, que fala justamente disso. Ele viu a Inglaterra deixar de ser um país relativamente pacífico e com uma polícia admirada para se transformar no país com os piores indicadores de criminalidade do Ocidente desenvolvido. Por trás disso está o relativismo moral e o clima de impunidade produzidos pelas elites intelectuais.

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A relação entre crime e pobreza não é direta, tampouco causal – linha de raciocínio “progressista” que é bastante ofensiva aos pobres honestos, em maioria numérica. O crime é uma escolha. O Zeitgeist contribui com as más escolhas, ao eximir o bandido de responsabilidade, ou ao relativizar o que é certo ou errado. O ranço marxista joga mais lenha na fogueira, ao atacar o “sistema” e tratar o criminoso quase como um rebelde legítimo que busca “justiça social”. O roubo, por essa ótica bizarra, passa a ser uma espécie de “política redistributiva”.

Dalrymple trabalhou em prisões e tratou de milhares de criminosos. Conheceu de perto o estrago que tal mentalidade causa nessas pessoas, e como serve de pretexto e álibi para seus atos criminosos. “Não tenho como evitar”, “não consigo me controlar”, “eu apenas roubei, nada mais”, “quem nunca errou?”, e por aí vai. Mas ele mostrava para esses marginais que não eram vítimas, e sim agressores, e que nas prisões sabiam se controlar, sob a ameaça de punições. O comportamento depende do mecanismo de incentivos, assim como dos valores morais.

Há, ainda, aspectos mais prosaicos, como os altos gastos públicos e a tentativa de reduzi-los justamente nas esferas mais necessárias, como as prisões. Ocorre, então, um relaxamento das penas, e muitos bandidos são soltos antes do prazo estipulado. Dalrymple conta casos chocantes, e não são isolados. Marginais que espancaram gente inocente gratuitamente, destruindo suas vidas e de suas famílias, com sequelas eternas, e que foram soltos em poucos meses. Que mensagem isso transmite para os jovens, sabendo-se, ainda por cima, que um curto tempo na prisão é visto até como um “rito de passagem” e motivo de orgulho para muitos deles?

São muitos interesses por trás desse sistema fracassado, porém. O aparato envolvido nisso é gigantesco. A quantidade de “especialistas em criminologia” não para de crescer. Não parece coincidência o enorme crescimento dessas profissões em paralelo à explosão da criminalidade. Será apenas um efeito, ou seria parte da causa?

O fato é que nenhum desses especialistas ganha créditos sugerindo que a punição severa é parte fundamental de uma sociedade civilizada. Tal discurso é visto com asco pelos “ungidos” de esquerda, que demonstram toda a sua compaixão e bondade ao “compreender” os motivos dos criminosos, e ainda acusar os Estados Unidos, com sua grande população carcerária, de o “Gulag das Américas”, como se não houvesse distinção entre a União Soviética e os Estados Unidos. Alguns, como fez Francisco Bosco ontem, colocam tudo na conta do racismo das elites.

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Quando Dalrymple era moleque, roubou um chocolate de uma loja e contou para o irmão mais velho. Era uma tentativa de mostrar “bravura” e conquistar o respeito do irmão. Em uma briga, dedurou algum malfeito do irmão, que, por sua vez, entregou seu crime aos pais. Sua mãe o levou à loja e o obrigou a pedir desculpas ao dono e pagar pelo roubo. Um tanto humilhante. Alguns podem, nos estranhos tempos modernos, considerar tal ato um exagero. Afinal, era “apenas” um chocolate e ele, “apenas” uma criança. Nada mais falso!

É esse tipo de educação que faz tanta falta. Impor limites, demarcar claramente o certo e o errado, com clareza moral. Pegar o que não lhe pertence é roubo, e ponto final. Deve ser punido, visto como inaceitável, e isso não tem nada a ver com a situação financeira das pessoas. Podemos considerar um atenuante o fato de um miserável faminto furtar comida de algum mercado, mas não é disso que se trata a explosão da criminalidade, e tentar pintar o quadro como se fosse é fruto de profunda ignorância ou extrema má-fé.

Marmanjos que roubam e às vezes matam por um par de tênis ou um celular, em busca de poder, de destaque em sua comunidade, não podem jamais ser vistos como vítimas ou coitadinhos desesperados. São bandidos, marginais que optaram pelo caminho errado, e merecem ser punidos por isso, pois a impunidade é o maior convite à reincidência no crime. Espero que minha filha tenha absorvido bem a lição. Sua professora vai ter dificuldade em doutriná-la com o manual relativista dos “progressistas”. Para cima de mim, não!

Rodrigo Constantino