Eis que agora todos aqueles jovens que tomaram as ruas em junho de 2013 não precisam mais anular seu voto. Ou todos aqueles românticos que acreditaram no despertar do gigante e condenam “tudo isso que está aí”, e clamam por uma “nova forma de se fazer política”, sem barganhas ou concessões (ou seja, sem democracia), agora possuem finalmente uma candidata. Marina Silva vem aí!
Mas qual Marina? Será aquela respaldada pelo bom senso e seriedade, ainda que pouca experiência prática, de Eduardo Giannetti da Fonseca? Será aquela que reconheceu recentemente a importância de se preservar o tripé macroeconômico, destruído pelo governo Dilma? Ou será a velha Marina, “sonhática”, idealista, fundamentalista, romântica, ecologicamente correta, aliada do MST? Teremos Giannetti ou Leonardo Boff dando as cartas?
Ninguém sabe dizer. E eis o ponto-chave: Marina é uma incógnita, uma enorme incerteza. Os investidores celebram timidamente e com cautela a pesquisa eleitoral do Datafolha – feita um dia após a morte de Campos – que já a coloca como segunda colocada. Compreensível: nada pode ser pior do que Dilma.
Eu mesmo cheguei a escrever uma carta aberta a Marina pedindo sua candidatura, pois a prioridade é retirar o PT do poder, impedir o golpe bolivariano em curso, cessar com o absurdo aparelhamento da máquina estatal. Daí a crer que Marina representa uma boa alternativa vai uma longa distância! Deixe-me ser mais objetivo: se fosse para votar no Capeta com Lúcifer como vice na chapa para tirar o PT do poder, eu votava!
Mas confesso ao leitor: tenho calafrios com a imagem de um segundo turno entre Dilma e Marina. É uma visão assustadora. Para explicar melhor meus motivos, segue um artigo publicado no GLOBO em março de 2013:
A Rede da demagogia
Há mais um partido na praça. Trata-se da Rede, de Marina Silva, candidata que recebeu 20 milhões de votos nas últimas eleições presidenciais. Tem muita gente cansada da dicotomia entre PT e PSDB, em busca de alguma alternativa. Será que a Rede é a solução?
Confesso ao leitor que ela não me convence. Para começo de conversa, o partido fez como o fisiológico PSD, de Kassab, e alegou não ser de esquerda nem de direita, pró-governo nem oposição. Contudo, quando vamos verificar quem são as pessoas por trás dele, só encontramos gente de esquerda, inclusive da ala mais radical, aquela que ainda sonha com o fracassado socialismo cubano.
Um de seus gurus intelectuais é Leonardo Boff, da Teologia da Libertação, uma mistura tosca entre cristianismo e marxismo. Marina veste literalmente o boné dos invasores de terra do MST. Vários membros do PSOL pretendem migrar para a Rede. E por aí vai.
Alguns ali abraçam a cruzada ecológica, mas tampouco me enganam. São “melancias”: verdes por fora, mas vermelhos por dentro. Seu discurso transforma o meio ambiente em religião antiprogresso, e dá para notar claramente o viés anticapitalista. O planeta será salvo pelo resgate do “bom selvagem”, de uma vida comunitária idealizada, como no filme “Avatar”. Estou fora dessa seita romântica!
Resta a importante questão ética. Uma vez mais, eu não fico tão convencido. Em primeiro lugar, é preciso lembrar que Marina teve quase três décadas de filiação ao PT. E não é novidade alguma o uso de práticas imorais do partido em sua busca implacável pelo poder. Elas chegaram ao auge do absurdo com o mensalão, mas não foram iniciadas ali. Relações com o jogo do bicho, parceria com ditadores comunistas, até mesmo afinidade e aproximação com os guerrilheiros das FARC representam o histórico do PT desde muito tempo. A bandeira da ética sempre foi hipócrita, e está totalmente esgarçada pelas traças do poder.
Esse rompimento tardio de Marina, que foi ministra de Lula, remete ao caso do escritor Saramago, que rompeu com Fidel Castro após uma nova perseguição a três intelectuais cubanos, ignorando os milhares de cadáveres acumulados na mais longa ditadura da América Latina.
Marina Silva resolveu sair do PT apenas quando seu espaço político estava prejudicado. Mas ela fez parte do governo, ainda que não tenha praticado atos ilegais. Quando abandonou o PT, disse que foi preciso coragem para sair de sua “casa política”, à qual ainda nutria profundo respeito. Quem respeita tanto assim o PT perde o meu respeito.
A Rede fez muito barulho com a bandeira ética, tal como o PT de ontem. Mas começou mal, ao recusar dinheiro de empresas de tabaco e cerveja, mas aceitar o de empreiteiras (eu inverteria). Aceitou ainda gente do PSOL envolvida no escândalo do bicheiro Cachoeira. Será que Marina concorda com José Dirceu, para quem a Lei da Ficha Limpa é absurda? Caiu na Rede é peixe?
Em suma, por trás daquela fala mansa e da mensagem messiânica (o próprio Alfredo Sirkis afirmou que se trata mais de um “estado de espírito” do que de prática política), jaz o embrião de mais um partido populista e demagógico, uma espécie de PT revigorado e embalado em alface orgânico. Um projeto personalista da “salvadora da pátria”.
O Brasil, infelizmente, continua com uma hegemonia de esquerda na vida política. Todos os partidos relevantes rezam o mesmo credo socialista envergonhado: intervencionista na economia, coletivista e paternalista no social. Nenhum fala abertamente em privatização, em redução do papel do governo na economia e em nossas vidas. Todos querem assumir o papel de “pai do povo” e controlar 40% do PIB nacional.
O grande nome “novo” é Eduardo Campos, neto de Miguel Arraes e líder de um partido que ainda se diz socialista. Do lado dos tucanos, temos Aécio Neves, que parece o melhor da turma. Mas algo ali não cheira bem. Falta disposição para assumir uma postura efetiva de oposição.
Os milhões de brasileiros cansados da completa falta de ética na política, do viés estatizante de todos esses partidos, continuam órfãos políticos, sem representação partidária. Sei que há partidos demais (legendas, na verdade), mas precisamos de uma alternativa verdadeira, sem medo de assumir sua posição de direita liberal, a favor do livre mercado, da família e da propriedade.
Um partido que não venda ilusões e milagres por meio da pesada mão do Estado, mas sim reformas que devolvam o poder a cada um de nós. Um partido que diga “Basta!” a todos esses privilégios e subsídios estatais. Precisamos de algo realmente NOVO!
PS: Diogo Mainardi disse ontem no Manhattan Conection que Marina Silva ganha de lavada. Acho – e espero – que errará, como errou feio, infelizmente, quando disse que Dilma não ganharia em 2010. Marina tem um teto, mesmo com toda a comoção do cadáver. Conquista o voto de muita gente desiludida, com razão, com nossa política, como se fosse realmente uma alternativa viável a Sarney e companhia. Mas a turma mais pragmática sabe que o buraco é bem mais embaixo. Resta saber quantos “sonháticos” existem no Brasil, e quantos pragmáticos…
Rodrigo Constantino
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