Às vezes, confesso, bate aquela preguiça. São décadas de lavagem cerebral na mídia, nas universidades, em todo lugar. E claro que isso iria produzir um fenômeno bizarro, uma hegemonia de esquerda, os cinquenta tons de vermelho da nossa política. Um dos efeitos disso é a inexistência da extrema-esquerda. Há apenas “esquerda”. Ao mesmo tempo, qualquer coisa mais à direita já vira logo “ultradireita”.
O novo colunista contratado pelo GLOBO, Bernardo Mello Franco, que antes tinha coluna na Folha, dificilmente poderia ser mais esquerdista. E ele é um dos que chama toda a esquerda, mesmo aquela mais radical, apenas de esquerda, enquanto Bolsonaro é “o capitão da ultradireita”. Radicais são sempre os outros!
Quem embarcou nessa foi o marqueteiro André Torretta, sócio da CA-Ponte, braço brasileiro da Cambridge Analytica, que trabalhou na campanha de Trump nos Estados Unidos. Em entrevista na Folha, André não diz explicitamente porque rejeitou trabalhar para Bolsonaro, mas logo depois deixa no ar a causa: não trabalha para os extremos.
Ele explica, então, que Trump não é um extremista, o que está certo, e que no Brasil ele é sócio e tem voz, dando a entender que talvez recusasse trabalhar para Trump também, se tivesse o poder de decisão. E fecha com essa pérola:
Seu candidato pode ser a vir [sic] Lula ou outro nome do PT?
Sendo da centro-esquerda ou centro-direita, pode ser qualquer um. Você fala assim: “André, você considera o Lula um radical?” Não, não considero. Tanto é que tem a Manuela [Dávila, do PC do B], que é mais para lá, você tem o PSTU, o [Guilherme] Boulos. Não pode considerar o Lula tão radical. Dois: em 2002, ele atrai os cem maiores empresários do Brasil para irem governar com ele. Então, obviamente os ânimos hoje em dia estão acirrados, mas a gente trabalha para quem tiver que trabalhar. Menos os extremos, porque atrapalha os negócios e a alma. Como eu trabalharia para o Alckmin também, que é centro-direita. O [João] Doria já se coloca agora à direita, abraçado pelo MBL [Movimento Brasil Livre]. O Doria é mais radical do que o Lula hoje em dia.
Lula não seria radical, porque trouxe “empresários” para “governar” com ele, mas Doria sim, pois “abraçou” o MBL? Isso parece papo de… gente do PSOL! Aliás, será que o marqueteiro não conhece a estratégia das tesouras? A extrema-esquerda cria os mais caricatos extremistas justamente para que os outros possam posar de moderados, sendo que de moderados não têm absolutamente nada!
O marqueteiro afirma que Lula não é radical, citando como “prova” a existência dos verdadeiros radicais do PCdoB e do PSOL. Faltou só ele explicar que todos eles estão sempre juntos, que Boulos e Manuela defendem Lula e o PT, que Lula e o PT defendem sempre seus braços violentos, os “movimentos sociais” do MST, MTST, UNE e CUT, e que todos, sem exceção, apoiam a ditadura socialista de Maduro na Venezuela. Imagina se fossem radicais!
Radical, para ele, não é Lula, o camarada de Maduro, o fã de Fidel Castro, aquele que confronta a Justiça, que ameaça com guerra civil, que quer controlar a mídia. Radical é Bolsonaro, e o MBL, movimento de jovens liberais que defendem, cruzes!, os modelos bem-sucedidos do capitalismo anglo-saxão, figuras como Thatcher e Reagan: que horror!
Os tucanos Alckmin e Doria seriam a direita já extremista demais para essa gente. E são essas as mentes por trás das campanhas eleitorais no Brasil? É muita falta de noção da realidade, algo que não se sustenta mais com as redes sociais. Se essa turma insistir nesse discurso ultrapassado, vai acabar dando Bolsonaro mesmo…
Rodrigo Constantino