Tenho um texto antigo no GLOBO explicando de forma sucinta a diferença entre o saudável patriotismo e o perigoso nacionalismo. Volto ao tema hoje por dois motivos: estou lendo O poder das ideias, coletânea de discursos de Carlos Lacerda, e passei por uma fala que trata justamente dessa distinção, que julgo fundamental no momento atual para separar o joio do trigo, especialmente quando vemos gente dentro do governo sob a influência de Steve Bannon, um nacionalista populista.
Segue, então, para a reflexão dos leitores, trechos do discurso de Lacerda sobre esse tema, feito em congresso da UDN para tentar definir os principais valores do seu partido:
Direi logo que não sou nacionalista e não creio que o seja a UDN, ou não estaria nesse partido. […] Nem admito que se pretenda trazer para dentro da UDN o dilema que os comunistas procuram armar fora dela, e contra ela, dilema segundo o qual quem não é nacionalista é entreguista, isto é, quem não coloca a Nação acima de tudo coloca-a abaixo de outra nação.
[…] Eu não coloco a Nação acima de tudo. E quero deixar de uma vez por todas bem claro o meu ponto de vista, que penso deva ser o de um partido democrático. Considero o nacionalismo, isto é, a ideologia que visa a colocar a Nação acima de tudo, uma noção totalitária. A Nação está abaixo da Pátria e até esta, abaixo do Homem.
Tudo o que o Homem criou, desde que foi ele próprio criado, destina-se a servir à sua liberdade de escolha, à sua razão, à sua vida natural e, para os crentes, à sobrenatural.
A Nação é uma dessas criações, e não a mais feliz nem definitiva. Não é preciso nos embrenharmos numa análise da origem do nacionalismo, que levaria muito longe embora fosse instrutiva, para afirmar que o nacionalismo é a doença do patriotismo, como “a demagogia é a doença da democracia”.
São pontos relevantes, pois vejo muitos confundindo um patriotismo saudável e útil à causa social com um nacionalismo tribal, xenófobo e ufanista, extremamente prejudicial aos cidadãos. Sei que o próprio presidente Trump se disse um nacionalista, e em parte ele o é mesmo, o que não representa uma qualidade. O “America First”, por outro lado, não tem nada demais: todo patriota pode e deve colocar sua Pátria como prioridade. O que não deve fazer é endeusar a Nação e passar a encarar indivíduos como meios sacrificáveis, peças descartáveis no tabuleiro de xadrez coletivista. É isso que muitos nacionalistas fazem.
Rodrigo Constantino
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