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Fiquei sabendo, por terceiros, que um grupo de direita fez até abaixo assinado para tentar impedir a palestra de uma conhecida feminista no Brasil. Não sei dos detalhes, quem forma tal grupo, se é mesmo de direita. Só sei que isso não é uma atitude liberal, e que deve ser condenada por liberais. Apesar do excesso retórico, a frase que define o liberalismo sobre isso é aquela atribuída a Voltaire: “Não concordo com uma palavra do que dizes, mas defenderei até a morte teu direito de dizê-las”.

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É a esquerda que coloca máscaras e impede, na porrada, palestras de conservadores em universidades. É a esquerda que persegue, que intimida, que usa o ostracismo e pune quem pensa diferente, para evitar o contraditório, o confronto de ideias (para que vença a melhor, ou para que saia uma síntese melhor ainda do que ambas as originais). Isso não é, portanto, uma postura liberal, e nem mesmo a guerra cultural em curso justifica apelar para as táticas esquerdistas: os “nobres fins” justificam quaisquer meios. O liberal se importa com os meios!

Gustavo Nogy, portanto, está certo ao criticar essa campanha que tentava calar a moça:

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Judith Butler, intelectual americana, é uma das principais teóricas do feminismo, da teoria de gênero e das questões éticas respectivas. Ela foi convidada para falar no seminário internacional “Os Fins da Democracia”, que será realizado no Sesc Pompeia, em São Paulo, entre os dias 7 e 9 de novembro de 2017. Não sou leitor de Judith Butler. Sou leitor de Camille Paglia. Não me comovem muitas das questões que comovem Judith Butler. Porém, se ela disser bobagens, que diga bobagens. Pois não há outro meio de proteger o meu direito de dizer bobagens, e eu adoro dizer bobagens, senão protegendo o direito alheio. Esse arranjo pode não ser o ideal, mas é o arranjo possível. A ideia de impedir que a palestra aconteça é só mais uma ponta do grande iceberg de estupidez e criancice em que está se transformando esse afã, aspas, conservador no Brasil. Numa petição online, há quem garanta que a presença de Judith “não é desejada pela esmagadora maioria da população nacional”. Aposto que a esmagadora maioria da população nacional nem sabe, nem saberia, da existência da pensadora. Saberá agora, com publicidade gratuita. E invocar a “esmagadora maioria” é conjurar o Leviatã: nunca deu muito certo. A verdade é que, no Brasil, mais do que em qualquer outro planeta, direitista e esquerdista foram feitos um para o outro – caso tórrido de amor. Haverá petição para que eu seja proibido de dizer isso? “A esmagadora maioria da população nacional” que tome providências.

De fato, há uma ala “direitista” que, no fundo, gosta das mesmas táticas do “lado de lá”, e muitos inclusive vieram do lado de lá, admiravam o socialismo no passado, votaram em Lula e no PT. A direita que mais parece a esquerda com sinal trocado não representa a verdadeira direita, liberal e/ou conservadora, sem aspas. O liberalismo prega a pluralidade de ideias e a liberdade individual, e impedir uma palestra não combina com isso. Mesmo numa guerra cultural!

E antes que alguns mais afoitos acusem Olavo de Carvalho de fomentar essa postura, o filósofo veio justamente atacar a ideia burra de tentar calar a feminista na marra:

Olavo tem razão. Vamos competir no mercado de ideias, preservando a ampla liberdade de expressão. Caso contrário, a censura vai recair sobre nós também, como já acontece, mas não teremos moral para condená-la. Impedir palestras, repito, é coisa de esquerdista. Quem faz isso e se diz liberal ou conservador precisa urgentemente rever seus conceitos, e estudar tais doutrinas. Ou alguém consegue imaginar um Isaiah Berlin ou um Michael Oakeshott assinando petição contra um palestrante num evento?

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Sem nossos princípios, não somos tão diferentes assim desses esquerdistas. O abismo que nos separa é justamente o apreço pelos valores da liberdade, mesmo – ou principalmente – quando ela é usada por aqueles de quem discordamos veementemente. Eis aí o verdadeiro teste!

Rodrigo Constantino