O ex-blog de Cesar Maia comenta hoje uma matéria da revista Inteligência sobre o avanço da Nova Direita:
1. Na revista INTELIGÊNCIA do primeiro trimestre de 2016, o cientista político Jorge Chaloub do IBMEC e o historiador Fernando Perlatto da Universidade Federal de Juiz de Fora apresentam os resultados de uma exaustiva pesquisa sobre a curva ascendente de uma Nova Direita no Brasil: “A Nova Direita Brasileira: ideias, retórica e prática política”. Realizam um levantamento dos fatos, um diversificado diagnóstico e uma ampla análise, usando as lentes da esquerda orgânica que, aliás, não ocultam.
2. Paradoxalmente, o estudo que realizam serve também como um guia para a própria direita ordenar a sua dinâmica e continuar se expandindo. Para isso –em vez de pensadores e políticos ditos de direita- lerem com preconceito, deveriam desadjetivar certos trechos e até desideologizá-los, e buscar entender os roteiros descritos, neste ciclo –recente- de ascensão e influência das ideia da Nova Direita.
3. Uma razão dessa ascensão –segundo os autores- é a distância do regime militar. O tempo vai diluindo a colagem entre direita e regime militar. Nesse sentido, as vocalizações do deputado Jair Bolsonaro prejudicam o crescimento da Nova Direita, na medida em que reaproximam a direita da ditadura, e mais grave, de seus setores extremados.
4. Outra razão sublinhada por Chaloub e Perlatto é a mudança no Mercado Editorial e no Perfil dos Jornais. Ou seja, na medida em que livros publicados, artigos e textos nos jornais ganham audiência, reforçam a lógica deles de dar mais espaço e publicar mais e mais as ideias da Nova Direita. Eles deveriam se perguntar por quê. Afinal, não é o mercado editorial e o perfil dos jornais que abrem voluntariamente espaços, mas –ao contrário- são esses espaços conquistados pelas ideias da Nova Direita junto à opinião pública, o que faz convergir com a lógica comercial das vendas e das audiências.
5. Outra razão levantada por eles é a forte penetração da Nova Direita nas Redes Sociais. Poder-se-ia até levantar a hipótese que essa penetração e a multiplicação dos acessos nas Redes Sociais levaram naturalmente a ampliar o interesse do Mercado Editorial e do Perfil dos Jornais para ampliar a base de seus leitores. E, claro, o interesse das pessoas. Os autores reforçam essas razões sublinhando que seus (da Nova Direita) argumentos conquistam uma enorme capilaridade em amplos segmentos da opinião pública.
6. Acentuam que essa presença e importância de intelectuais da Nova Direita ocorre porque eles entraram no vácuo político deixado pela oposição partidária, por falta de agenda afirmativa dessa. E listam a vinculação de vários deles a novos Institutos criados, construindo referências organizadas, que formam e multiplicam quadros e opinião.
7. Chaloub e Perlatto separam os pensadores da Nova Direita em Direita Teórica, com ideias e argumentos não contextualizados, e Direita Militante, que são aqueles que agitam seus argumentos e críticas através da imprensa, das redes sociais e de palestras, quase sempre referenciados à conjuntura. O ciclo atual –dos últimos cinco anos- é um exemplo claro disso.
8. Finalmente, destacam o que se poderia se entender como a dialética fundamental que distingue filosoficamente a Nova Direita, da Esquerda: a Superioridade da Moral sobre a Política.
9. Uma leitura imprescindível para ser lida sem paixões pelos que se aproximam da direita e pelos que se aproximam da esquerda, e que –sem paixões- é também imprescindível às Faculdades de Ciências Política e Social, Filosofia, aos editores e a própria imprensa. E, evidentemente, aos políticos.
10. Especialmente neste momento que o Brasil atravessa.
Seguem alguns trechos:
Acena cultural e política brasileira tem testemunhado, nos últimos anos, um fenômeno sociológico com características muito peculiares, vinculado ao destaque cada vez mais significativo na esfera pública do país de uma nova fração de intelectuais, portadores de certo tipo de ideário claramente de direita, cujo protagonismo e atuação merecem um esforço de compreensão mais sistemático.1 Intelectuais como Olavo de Carvalho, Reinaldo Azevedo, Luiz Felipe Pondé, Rodrigo Constantino, Guilherme Fiuza, Marco Antonio Villa, Denis Lerrer Rosenfield, Diogo Mainardi, entre outros, vêm ganhando um espaço cada vez mais significativo no debate público do país, e o destaque assumido por eles é indicativo da forte presença de um determinado tipo de reflexão abertamente de direita, que tem assumido protagonismo não apenas na imprensa, mas também do mercado editorial do país.
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Em terceiro lugar, o protagonismo desses intelectuais da “nova direita” está vinculado a transformações que tiveram curso, ao longo das últimas décadas, na própria indústria cultural do país, destacando-se, nesse sentido, mudanças no mercado editorial, no perfil dos jornais de maior circulação – que passaram a dedicar mais espaço a colunistas “ideológicos” – e, sobretudo, à expansão e a popularização da internet, que permitiu a esses intelectuais adquirir uma capilaridade social não imaginada em outros tempos. Muitos desses intelectuais têm colunas nos jornais de grande circulação do país – a exemplo de Rodrigo Constantino e Marco Antonio Villa, n’O Globo, Reinaldo Azevedo e Luiz Felipe Pondé, na Folha de S. Paulo, e Denis Rosenfield, n’O Estado de S. Paulo, embora seu texto também seja publicado em O Globo. A maior parte deles mobiliza principalmente as redes sociais – como Twitter e Facebook – para a difusão de suas ideias. Além disso, alguns desses intelectuais se valem de instrumentos como a rádio para se projetarem publicamente, a exemplo de Rodrigo Constantino, que possui um programa na Rádio Jovem Pan, a qual se transformou – como bem demonstrado em reportagem recente na revista Piauí – em um dos principais veículos de defesa de agendas de “direita”, abrigando jornalistas como Rachel Sheherazade, que, por sua vez, divide parte do programa principal da emissora paulista com Marco Antonio Villa
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Os intelectuais da “nova direita” analisados neste artigo vêm sendo bem-sucedidos ao se aproveitarem dessa “onda”, conquistando espaços cada vez mais significativos no mercado editorial brasileiro. O livro de Olavo de Carvalho, O Mínimo que você Precisa para não ser um Idiota atingiu número alto de vendagens, assim como a obra Esquerda Caviar. A Hipocrisia dos Artistas e Intelectuais no Brasil e no Mundo, de Rodrigo Constantino. Esse autor também publicou outros trabalhos com perspectivas semelhantes, como Privatize Já! Pare de Acreditar em Intrigas Eleitorais e Entenda como a Privatização Fará do Brasil um País Melhor e, mais recentemente, Contra a Maré Vermelha. Um Intelectual sem Medo de Patrulhas, que reúne oitenta crônicas publicadas no jornal O Globo entre 2009 e 2014.
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A isso se soma – e essa é a quarta hipótese que contribui para explicar o protagonismo desses intelectuais – a vinculação e a articulação de muitos desses personagens com institutos como o Instituto Liberal, o Instituto Millenium, o Instituto Ludwig Von Misses, o Instituto Liberdade, o Instituto de Estudos Empresariais, o Estudantes pela Liberdade e o Instituto Ordem Livre. Essas instituições têm ou origem recente – como, por exemplo, o caso do Instituto Millenium, criado em 2005 – ou passaram por grande reformulação recente – como o Instituto Liberal, que, embora fundado em 1983, vem testemunhando mudanças significativas desde a ascensão de Rodrigo Constantino à presidência do Conselho Deliberativo, que substituiu a tradicional ênfase na divulgação de clássicos liberais por uma militância social e virtual mais agressiva. De maneira geral, esses institutos reúnem empresários, economistas, juristas, jornalistas e outros intelectuais, e se comportam como think tanks orientados para a defesa dos valores e das políticas liberais. Além disso, alguns desses institutos se engajam de forma mais direta em movimentos como o chamado “Escola sem Partido”, que procura aprovar um Projeto de Lei contra a “doutrinação” e “contaminação político-ideológica” da esquerda nos espaços escolares. Os fortes vínculos dessas instituições com relevantes grupos empresariais e da mídia são claramente expostos por uma breve análise dos parceiros do Instituto Millenium, que incluem a Editora Abril, a Gerdau, o Bank of America Merry Lynch, o Grupo Suzano, o Grupo Estadão, entre outros. Seus documentos tecem fortes críticas à política brasileira atual, que padeceria da ausência de verdadeiras forças de direita e da escassa presença do liberalismo no país. Esses institutos se vinculam a outras associações e grupos sociais, sendo muito bem- sucedidos no sentido de projetar com mais força as ideias liberais no debate público brasileiro.
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Por fim, uma última hipótese que tuais no debate público, inclusive, se valendo dele para a criação de novos partidos, a exemplo do Partido Novo, criado em 2011 com o apoio de Rodrigo Constantino, que teve seu registro aprovado recentemente no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), com o declarado objetivo de defender um liberalismo de fato, que nunca teria sido experimentado no país.
Os intelectuais da nova direita não compõe um todo monolítico, mesmo que, por vezes, pareçam agir como tal, sobretudo em relação a determinadas agendas da conjuntura política brasileira contemporânea. Uma breve análise do seu conjunto revela uma manifesta diversidade de trajetórias, crenças e estilos retóricos, por vezes ofuscados pela coincidência em relação a adversários preferenciais e pautas concretas. A atenção às diferenças em meio às concordâncias, que também serão devidamente destacadas, é fundamental para que se possa compreender com mais clareza as ideias e os movimentos desses atores no cenário político atual. Ainda que reconhecendo as estreitezas e os riscos de simplificações e limitações de quaisquer tipos de classificação, procuraremos, com o intuito analítico, dividir os intelectuais investigados em dois grandes grupos, a saber: direita teórica e direita militante.
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O tema também se faz, de certo modo, presente na “direita militante”, constantemente retomado por Rodrigo Constantino, Diogo Mainardi e Reinaldo Azevedo. Constantino, por exemplo, estabelece um vínculo direto entre esse cenário e a ausência de um verdadeiro liberalismo em terras brasileiras. Em artigo sintomaticamente intitulado “Liberalismo no Brasil Colônia: o que poderíamos ter sido” (CONSTANTINO, 2015), ele retoma um pensador lusitano da Colônia com forte inspiração do iluminismo escocês, José Antônio Gonçalves, para apontar como a história nacional poderia ter sido outra caso os pressupostos liberais tivessem sido plenamente aplicados em terras brasileiras. O raciocínio expõe sua aversão a eventuais relativismos, que ofuscariam a evidência de que apenas o liberalismo propõe fundamentos adequados para a organização social.
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O caráter autocentrado do discurso moral também leva a uma representação do cenário político que destoa bastante da percepção da ampla maioria dos protagonistas desse campo. Para essa nova direita, a esquerda ocupa a quase totalidade dos postos de poder não apenas no Brasil, onde o cenário é especialmente crítico, mas no mundo, onde é evidente, segundo Olavo de Carvalho, a hegemonia esquerdista. Nessa perspectiva, o PSDB, responsável por uma reforma neoliberal do Estado brasileiro, é, para muitos deles, franco representante da esquerda, assim como o restante do quadro partidário brasileiro; Obama é comunista e Luciano Huck pertence ao campo da “esquerda caviar” (CONSTANTINO, 2013, p. 219).
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Se o campo comum nasce do elogio dos conservadores ao liberalismo econômico, ele também decorre da adesão dos liberais econômicos ao conservadorismo moral, fortemente presente, por exemplo, nos diversos ataques do colunista Rodrigo Constantino, presidente do Instituto Liberal, a grupos minoritários.
Opa! Eu não ataco “grupos minoritários”, e sim movimentos que falam em nome das minorias, mas agem com uma agenda totalitária e estatizante. No mais, não tenho programa na Jovem Pan, e sim Reinaldo Azevedo. Mas, em geral, os autores capturaram bem os motores por detrás da ascensão da “nova direita”. E podem se preparar, gente: pois isso é só o começo…
Rodrigo Constantino
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