Por Percival Puggina
Instalou-se entre nós uma justificada sensação de que os problemas são maiores do que nossa capacidade de os resolver e de que face os males do corpo social e político nacional, os anticorpos institucionais são insuficientes para combater as células malignas que o acometem.
Creiam-me, o Brasil é inocente, totalmente inocente. Inapto a qualquer protagonismo, o país, como tal, é vítima e não culpado dos males de que é acusado. Tudo que costumamos dizer sobre o Brasil, deveríamos transferir, por ação ou omissão, à sociedade brasileira. E esse é um dos aprendizados mais urgentes.
Nossas culpas são muitas e efetivas como nação. Não, não me atolarei no lugar comum de atribuir indiscriminadamente à sociedade o lixo arremessado pela janela do carro, a buzinada no trânsito e a venda sem nota. O que trago é muito mais sério. Refiro-me, entre outros desvios, à infeliz tentativa de criar um humanismo sem Deus porque o “politicamente correto” coíbe toda referência a Ele em espaço público. Refiro-me a uma sociedade que tem o dedo duro para as imperfeições alheias e jamais aponta o próprio peito por considerar mórbido e pernicioso examinar a consciência. Refiro-me a uma sociedade que busca a perfeição nas coisas exteriores, que usa o espelho, os cosméticos e a academia para fazer porcelana do barro de que é moldada, mas teme olhar fundo nos próprios olhos.
Ora, a qualidade que pertença ao todo de um corpo social se faz da qualidade das pessoas que o compõem; em nenhuma organização humana haverá qualidade que não esteja fundada nos atributos de seus membros, em todos os seus níveis. Não há como nem por que ser diferente em relação a uma nação.
Todos desejamos um Congresso Nacional composto por pessoas probas, responsáveis, competentes e dedicadas ao interesse público. Se tal anseio fosse atendido, nossas dificuldades institucionais, sociais e econômicas já estariam resolvidas. No entanto, a maior parte dos cidadãos brasileiros, na hora de escolher um parlamentar, busca alguém para cuidar dos seus interesses. E quanto mais privados forem, melhor. É assim que a alguns se creditam e perpetuam privilégios enquanto a conta segue, inexoravelmente, a débito de todos os demais, incluídas as gerações futuras.
Num viés oposto, salutar, ao escolherem no leque de alternativas proporcionado pelos candidatos a uma determinada cadeira, os eleitores interessados no bem do país deveriam orientar sua opção àquele com cujas opiniões melhor se identifiquem. E não por convergência de interesses pessoais ou corporativos. Para despachante de interesses qualquer um serve.
A inversão na natureza do mandato parlamentar é, também ela, uma forma de corrupção, problema de natureza moral, que atinge a finalidade mesma da política, corroendo a ideia de representação e originando um paradoxal filho da hipocrisia. Refiro-me ao eleitor – e como ele é típico! – que elege alguém para cuidar de si e fica indignado quando percebe seu parlamentar fazendo exatamente a mesma coisa, dedicado a seus próprios negócios ou negociatas.
No dia em que tais compreensões alcançarem parcela expressiva da sociedade brasileira muitos patifes que só causam dano à pátria perderão suas cadeiras.
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