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O clã dos Bolsonaro

Uma das características que mais chamam atenção na política da era digital é o recrudescimento do tribalismo, que ameaça os valores republicanos ocidentais, como apontado por Jonah Goldberg em “Suicide of the West”, de 2018. Nos “debates” das redes sociais, esse comportamento se mostra na forma de insultos típicos de torcidas organizadas de futebol. Na política, é o velho e conhecido patrimonialismo.

“O patrimonialismo é a vida privada incrustada na vida pública”, resumiu o escritor Octavio Paz, autor de “O ogro filantrópico”. O estado, sob esta ótica, passa a ser visto como uma extensão da família. A privatização do Estado ocorre por meio das práticas de nepotismo e clientelismo, com isso, as leis deixam de ser impessoais, passando a representar um braço dos privilégios da “grande família”.

A figura do governante se confunde com a própria noção de pátria, levando a um culto à personalidade. Em um estado patrimonialista, não se distingue direito o que é público do que é privado. Todas as funções se reduzem aos interesses da família ou do clã. A troca de favores é o meio para o sucesso. O patrimonialismo é a via que leva ao autoritarismo, por meio de uma crescente concentração de poder.

Ricardo Vélez, ex-ministro da Educação no governo Bolsonaro, é um grande estudioso do tema. Vélez comenta: “A opção neopopulista pela antipolítica, cruzada com a secular tradição patrimonialista ibero-americana que faz da coisa pública negócio a ser tangido pelos donos do poder, como se fosse a sua propriedade privada, transfere para o reino do Estado uma atitude de não profissionalismo e de espírito familístico, que faz com que aquele perca a competitividade necessária nos tempos atuais”.

O embaixador Meira Penna, em “O dinossauro”, também falou sobre o assunto: “A forma política mais comum do romantismo político é o chamado Culto da Personalidade do herói salvador e messiânico”. A vida política pode ser comparada a uma grande família, uma “organização que se mantém necessariamente pela força dos laços afetivos”. Conforme explica o autor, “surge uma vasta tessitura clientelista e familiar que mantém sua coesão pela discriminação privilegiada de seus membros”.

Impossível não identificar traços desse patrimonialismo no governo Bolsonaro, em especial na ala mais ideológica, aonde vimos vários casos suspeitos de ascensão meteórica de gente sem a devida qualificação ou experiência. Em comum, a proximidade com os filhos do presidente, sendo que ambos, Carlos e Eduardo, parecem se esquecer de seus cargos eletivos para assumir funções distintas com base na relação pessoal com o presidente. Nesse ambiente, os oportunistas apelam para a bajulação para fazer parte da patota. Nada republicano.

Artigo originalmente publicado pela revista IstoÉ

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