Meus leitores já estão até cansados de saber: expor a hipocrisia da esquerda é um dos meus esportes prediletos. Faço isso quase com a mesma frequência com que a esquerda cai em hipocrisia (mas confesso não ser capaz de acompanhar seu ritmo frenético). Foi esse o tema do meu Esquerda Caviar. Logo, só posso aplaudir a excelente coluna de João Pereira Coutinho na Folha hoje.
Em que pesem nossas diferenças civilizadas sobre Trump, o gajo foi direto na jugular da esquerda que se diz pela “tolerância” e “diversidade”, let alone as “minorias”, mas nada falou em defesa da esposa de Trump boicotada por estilistas misóginos e preconceituosos. É o velho salvo-conduto que só esquerdista tem: pode cobrar dos outros aquilo que não cobra de si mesmo, adotando o duplo padrão moral mais seletivo do planeta.
Melania Trump teve dificuldade para encontrar quem assinasse seu vestido para o dia da posse do maridão. Poucos estavam dispostos a emprestar o nome para a bela mulher. Seu pecado capital, seu crime? Ser casada com um “intolerante”, “preconceituoso”, “machista” e “misógino”. Logo, nada mais certo a fazer do que ser intolerante, preconceituoso, machista e misógino com a pobre coitada. Diz Coutinho:
O caso, que em princípio não deveria merecer dois minutos de atenção, revela três coisas sobre a “inteligência” liberal (no sentido americano do adjetivo) com relevância política.
Em primeiro lugar, registra-se com agrado a forma como a ética da boçalidade é exercida publicamente e aplaudida publicamente. Uma coisa é recusar vestir uma senhora, o que já me parece uma atitude casca grossa. Outra é humilhá-la como se fosse a encarnação da peste.
As mulheres que marcharam contra a misoginia de Donald Trump pelo visto não se incomodaram com a misoginia de Tom Ford e restante trupe. Quando são as mulheres dos nossos inimigos, que se dane a defesa da dignidade feminina. Fogueira com elas! Mas Melania Trump foi humilhada por quê?
Segundo ponto: por “crime de proximidade”. Curioso. Eu julgava que esse tipo de delito era exclusivo de regimes totalitários. O século 20 foi pródigo em processos desse gênero: alguém fugia de uma “democracia popular” e a família era responsabilizada e punida. Em muitos países onde o fanatismo islamita impera, a moda continua.
Melania Trump não é responsável pelas ideias ou ações do marido. Não é conhecida por nenhuma espécie de militância política. E, segundo consta, ficará em Nova York para cuidar do filho. A humilhação pública só revela o nível de violência e fanatismo que define as exatas brigadas que acusam Trump (o Donald) de violência e fanatismo.
Mas existe um terceiro ponto que expõe, de forma mais profunda, a hipocrisia liberal. Melania é imigrante. Da Eslovênia. E nas declarações de aviltamento era impossível não vislumbrar o desprezo, para não dizer a xenofobia, face ao “white trash” do leste europeu. Pelo visto, Donald Trump não detém o exclusivo da xenofobia.
Pois é, meus caros: é muita hipocrisia junta! Todos sabemos que a “tolerância” da esquerda depende da premissa de que todos aceitemos agir e “pensar” exatamente como um esquerdista; que a “diversidade” por ela pregada é aquela em que todos somos como clones, como os Smiths de “Matrix”; que o “amor” presente em seus discursos é aquele demonstrado com xingamentos e rótulos chulos aos adversários.
É assim que uma mulher imigrante acaba vítima do ódio, do preconceito e do boicote de inúmeros homens, mas as feministas nada fazem para defendê-la, preferindo se colocar ao lado dos agressores. Parabéns a Ralph Lauren, a quem tiro meu chapéu – da própria Ralph Lauren. Coutinho pretende continuar comprando na loja as roupas da grife, já que “podemos viver como mendigos mas jamais perder as maneiras”.
Pretendo fazer o mesmo. “Coxinha” com orgulho, dono de um “haras” inteiro de camisas polos com aqueles cavalinhos (prefiro a fase deles bem pequeninos estampados no peito, ao contrário de uma tendência que em breve vai colocar o cavalo maior do que o próprio indivíduo vestindo a camisa).
Nem mesmo o elegante Ralph Lauren ficou imune às tendências espalhafatosas da era moderna, eu sei. Mas o que muitos não sabem é que Ralph Lauren representa o que há de melhor da América, da comunidade judaica que assimilou e ajudou a construir os valores americanos. Sua marca sempre foi o ne plus ultra do estilo WASP. Harold Koda, curador do Costume Institute no Metropolitan Museum of Art, chamou Lauren, nascido Ralph Lifshitz de imigrantes judeus da Bielorússia, de “o grande embaixador do estilo americano”.
Estilo, refinamento, elegância, sofisticação: tudo aquilo que Ralph Lauren sempre prezou, e que Melania Trump tão bem incorporou na cerimônia de posse do marido. Lauren gosta do que é clássico, sempre admirou os Windsor, possui uma coleção de carros raros. Uma parte da esquerda odeia mesmo isso tudo, a própria beleza, aquilo que não é vulgar. Essa ala adoraria ver Miley Cyrus rebolando até o chão numa garrafa em vez de uma primeira-dama discreta e elegante.
A outra parte odeia Trump, e por isso, movida pelo puro ódio ideológico, não viu problema algum em atacar uma mulher imigrante. Ainda bem que temos Ralph Lauren!
Rodrigo Constantino
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