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O judiciário brasileiro contra a livre educação

Por Sergio Renato de Mello, publicado pelo Instituto Liberal

Fico com medo de que meu filho tenha um padrinho não escolhido por mim, que o crie e lhe dê educação fora de meus limites permitidos. Mas, nos dias que correm, o programa de apadrinhamento do judiciário ideologizado pela Organização das Nações Unidas parece desvirtuar a natureza das coisas, impondo padrinhos não escolhidos.

Luis Roberto Barroso é um ideólogo por natureza e essa sua feição, por assim dizer, enviesada, ficou muito bem caracterizada em sua decisão monocrática na Medida Cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 5.537, de origem do Estado de Alagoas. Existem muitas coisas a serem colocadas no papel sobre esse julgamento, principalmente, como no início desse texto, sobre o próprio perfil do ministro referido, sobre a matéria que foi apreciada, que tem a sua grande relevância social e também sobre o julgamento em si mesmo.

O perfil altamente esquerdista e “evoluído” do ministro Luís Roberto Barroso ficou, agora, confirmado por sua decisão monocrática na medida cautelar acima referida, ao ter declarado de forma provisória e liminar a inconstitucionalidade da lei alagoana n. 7.800, de 2016, dispondo sobre diretrizes na educação estadual. Mas, o que é mais importante é sobre a referida decisão em si, porque ela afeta sobremaneira a sociedade e a relação entre pais e filhos. Só para se ter uma ideia, até mesmo um pseudo filósofo foi citado, Leandro Carnal, com seu pensamento de que não existe vida sem ideologia.

A referida ação judicial tem como objeto impugnar o Programa Escola Livre, uma versão por assim dizer regional ou estadual do movimento Escola Sem Partido, idealizado pelo Deputado Miguel Nagib, e que tem como escopo excluir do ensino nas escolas qualquer imposição ou influência de escolhas partidárias, ideológicas ou religiosas particulares do professor, permitindo o livre pensamento ou a livre consciência e de crença. O ministro Barroso deu liminar para suspender essa lei alagoana, entendendo que a referida lei não é eficaz para o efeito a que se pretende e pode discriminar em vez de neutralizar (seu objeto).

O aspecto puramente ideologizado, partidário ou enviesado da decisão do ministro Barroso é flagrante e inconteste. A escola é, ou deve ser, um ambiente de ensino, onde deve predominar o livre pensar, não podendo servir de instrumento de propagação cultural de meios ideais de vida e de convivência. Vou para escola para aprender sobre como posso viver melhor em sociedade e, para tanto, as alternativas de visão de mundo devem estar disponíveis e à minha livre escolha. O que vem acontecendo escancaradamente nas escolas brasileiras é exatamente o contrário. E o ministro Barroso fez questão de ignorar essa realidade em sua decisão, a qual não é menos ideologizada do que alguns livros didáticos e professores assumidamente comunistas. Ou se olha a realidade subjacente do que vem ocorrendo nos meios escolares e se dê uma decisão que extirpe essa praga marxista de uma vez por todas, permitindo-se o livre pensar de todos, ou iremos parar num futuro já conhecido e previsto, com futuras gerações manipuladas e sem direitos individuais de liberdade. Por uma infelicidade geral da nação de jurisdicionados, que esperam que o Judiciário seja isento ou neutro em suas decisões, essa segunda alternativa foi a escolhida pelo ministro Barroso.

O que chama a atenção nessa decisão é que, para rejeitar o projeto, ela valeu-se dos mesmos argumentos que são objeto do Programa Escola Livre e dos movimentos libertários análogos, como o pluralismo de ideias. Tais programas, como o próprio nome já diz, têm como bandeira o livre pensamento escolar dentro de alternativas viáveis de escolha, as quais devem ser pura e simplesmente ensinadas aos alunos, e não impostas ou colocadas como sendo um ideal de vida. Ao contrário do que entendeu a decisão, o verdadeiro pluralismo de idéias é exatamente isso, quando se aprende para se poder escolher. Mas, ao que se vê, a decisão entendeu que o programa e a lei estadual alagoana militam em sentido inverso do que o seu próprio objeto pretende.

Uma coisa é pluralismo de idéias (art. 206, II e III, da Constituição Federal) e outra é doutrinar. A primeira é objeto do programa de escola livre e das leis com esse escopo e a segunda é o que vem ocorrendo, às escâncaras, nas escolas brasileiras. As redes sociais e a própria página do Movimento Escola Sem Partido, além de muitas e muitas divulgações e palestras nacionais, dão conta desse flagrante.

Nas escolas brasileiras há violação do direito à educação com o alcance pleno e emancipatório e supressão de domínios inteiros do saber do universo escolar. A liberdade de ensinar, de aprender e o pluralismo de ideias, conforme artigos 205, 206 e 214 da Constituição Federal, está sendo flagrantemente usurpada. O que se quer é que o indivíduo tenha a liberdade de opção e de escolha, uma certo direito de autodeterminação e de viver sem ideologias, como já escrevi em artigo nesse sentido. Os professores é que perseguem os alunos e lhes impõem a visão de vida particular deles e não o contrário. A lei e o programa não querem implantar uma visão dominante na sociedade. Apenas olham a realidade doutrinária nas escolas com o propósito de aboli-la, homenageando a liberdade de consciência, exatamente o que a decisão do ministro apregoa e não quis reconhecer.

Ainda, os artigos 205 e 214 da Constituição Federal asseguram que o indivíduo tem o direito à educação e que esta deve ser capaz de promover o pleno desenvolvimento da pessoa e sua capacitação para a cidadania, o que está sendo impedido pelos professores em sala de aula por meio da visão marxista imposta, até mesmo de uma forma implícita, por eles mesmos em sala de aula e sem o mínimo pudor. O pleno desenvolvimento da pessoa e sua promoção humanística é alvo dos professores marxistas. De acordo com a Constituição Federal, o professor tem que ser livre para ensinar todas as correntes filosóficas, ideológicas e religiosas que existem, não apenas uma delas e como preferência particular sua.

O que mais chama a atenção na decisão é a parte na relação dos pais com os seus filhos. Para o ministro, o Protocolo Adicional de São Salvador, ao reconhecer o direito dos pais de escolher o tipo de educação que deverá ser ministrada a seus filhos, previsto no artigo 12, § 4º da Convenção Americana Sobre Direitos Humanos, “condiciona tal direito à opção por uma educação que esteja de acordo com os demais princípios contemplados no Protocolo e que, por consequência, seja apta ao pleno desenvolvimento da personalidade humana, à participação de uma sociedade democrática, à promoção do pluralismo ideológico e das liberdades fundamentais. E continua dizendo que “A toda evidência, os pais não podem pretender limitar o universo informacional de seus filhos ou impor à escola que não veicule qualquer conteúdo com o qual não estejam de acordo”. Ora, com a devida vênia Senhor Ministro, quem está restringindo o universo informacional dos filhos e alunos são os professores e o Ministério da Educação e não a lei ou os programas que são contra esse tipo de militância convivencial. Por outro lado, isso significa que os pais não podem educar seus filhos sobre uma determinada religião por eles idealizada e já consagrada, um determinado partido ou uma determinada ideologia (ou modo de vida)? Isso quer dizer que os pais perderam o direito de educar os seus filhos? Isso significa que a ONU e os Estados é que têm o poder de impor um determinado modo de vida para nossos filhos?

Simplesmente, essa decisão chega ao absurdo de professar um limite ou até mesmo a supressão do exercício de um direito dos pais, de educar e criar livremente os seus próprios filhos, e dos filhos de terem a sua autonomia e autodeterminação preservadas e livres de ideologias destrutivas.

Essa decisão faz parte do ensino marxista nas escolas, sendo um de seus caminhos de propagação ou um de seus tentáculos destrutivos. Para Karl Marx, no livro A origem da família, da propriedade privada e do Estado, que idealiza um tipo de sociedade diferente da tradicional, as pessoas poderiam viver em liberdade sexual extremada e os filhos não sabiam quem eram seus pais. Essa sociedade era tida como a ideal pela justiça e igualdade que ela assegurava. Daí o Estado assumia o encargo da educação dos filhos.

Em conclusão, vivemos dias em que a escola partidária e o Estado militam contra o indivíduo e sua liberdade de escolha, principalmente substituindo valores éticos e morais tradicionais por novos e não escolhidos. O alvo é a implantação do comunismo por meio de um ensino de uma nova ética. O caminho a percorrer é a transmissão de valores tidos por universais e globais, cujo meio de transmissão é fazer entender que os direitos das crianças não passam senão por meio de violação ao direito da família em criar e educar seus próprios filhos.

“Com efeito, existe atualmente uma enorme exigência, da parte da sociedade, relativamente aos sistemas de educação, a fim de que eles auxiliem mais a juventude a adquirir comportamentos e valores que lhes permitam enfrentar com êxito as dificuldades do mundo moderno. As famílias sentem-se cada vez menos capazes de assumir suas tarefas educativas tradicionais, face à complexidade dos problemas e a uma massa inabarcável de informações; elas de sejam, portanto, que uma maior importância seja dada aos aspectos éticos, morais e cívicos da instrução educativa. Essa evolução na divisão das responsabilidades está ligada ao desejo de uma descentralização e de uma maior participação de todos os atores, dos pais em particular, no funcionamento da instituição. (Unesco, 4ª Conferência dos Ministros da Educação).” (Pascal Bernardin, Maquiável Pedagogo ou o ministério da reforma psicológica, Editora Vide Editorial, p. 41).

São os pais que têm a obrigação de criar e educar os seus filhos. O Estado não tem e não pode ter essa atribuição. Não estamos vivendo em um totalitarismo (ainda!). Cito o artigo 12, item 4, da Convenção Americana sobre Direitos Humanos (CADH), segundo o qual “os pais têm direito a que seus filhos recebam a educação religiosa e moral que esteja de acordo com suas próprias convicções”, a Lei 4.898/65, que considera crime de abuso de autoridade “qualquer atentado à liberdade de consciência e de crença”, o artigo 1.566, inciso IV, do Código Civil, que diz ser dever de ambos os cônjuges o sustento, a guarda e a educação dos filhos, encargo repetido no artigo 1.634, inciso I, do mesmo código. O mesmo dever é repetido por diversas vezes no Código Civil (nas relações de união estável, quanto aos deveres do tutor e do curador, etc.). O artigo 4º do Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei n. 8.069, de 1990) coloca a família em primeiro lugar no encargo de criação e no exercício do direito de educação dos seus filhos. O artigo 22 tem a mesma determinação. Enfim, ao Estado incumbe apenas propiciar os meios indispensáveis para que essa educação seja efetivada. Aos pais cabe o dever de educar e de mostrar as várias visões de mundo e dizer qual delas faz parte da melhor opção de vida.

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