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Terminei de ver nesta quarta tanto “O Mecanismo” como “Casa de Papel”, ambos na Netflix. Gostei dos dois, e recomendo. O foco aqui será a série de José Padilha sobre a Lava-Jato, que tem feito os petistas arrancarem seus cabelos, a ponto de Janete, digo, Dilma fazer até ameaças após constatar que as cenas não correspondem aos fatos (ignorando que a obra é de ficção, inspirada em acontecimentos reais).

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A visão geral? A série é bom entretenimento, bem produzida, com uma trama paralela de amor criada para dar mais liga ao tema central, que é a atuação de alguns poucos heróis da Polícia Federal, do Ministério Público e da Justiça lutando contra um sistema corrompido e poderoso. Selton Mello está bem no papel do policial honesto, revoltado, obcecado com seu colega de escola que se tornou um importante bandido.

Em meio a muitos palavrões e cenas de sexo, o telespectador resgata os principais fatos do começo do estouro dos escândalos revelados pela Lava-Jato. O ponto alto foi a “presidenta” Janete Ruscov, nome sensacional para lembrar do email falso criado por Dilma Rousseff. Só por isso, como disse um amigo, a série já merece um prêmio!

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Não por acaso os petistas ficaram em polvorosa, com José de Abreu e Pablo Vilaça falando em “boicote” (a esquerda pode fazer isso, a direita não, pois vira censura e intolerância). José Padilha reagiu ironizando essa turma, o que merece aplausos. A roubalheira do PT está bem retratada na série, mas há escorregadas. A começar pela menção de que o partido, que chegou com a bandeira da ética, tornou-se “igualzinho aos outros”, o que é falso. O PT é muito pior!

O “mecanismo” é podre mesmo e não foi inventado pelo PT. Na verdade, o PMDB representa muito melhor esse “sistema” patrimonialista e corrupto, que confunde “coisa pública” com “cosa nostra”. Mas o PT não foi “apenas” corrupto, ou o mais corrupto; foi e é também totalitário, socialista, e tentou destruir a democracia de dentro, transformar o Brasil numa Venezuela. Fomos salvos pelo “sistema”, diga-se.

Aécio Neves virou “direita”, o que é inaceitável, e o impeachment de Dilma foi retratado como um golpe arquitetado pelo senador tucano e o vice-presidente Temer, para barrar as investigações. Os milhões de patriotas que tomaram as ruas viraram massa de manobra de dois políticos safados? Outra bola fora! A pegada meio psolista do produtor Padilha está presente em toda a obra, a começar pela culpa do abstrato “mecanismo” pelos atos criminosos e até totalitários do governo petista.

Há uma mensagem um tanto Karnal também, de que a corrupção é um câncer presente em tudo, que vai girando em círculos maiores, reproduzindo-se como os fractais. Se o Seu João leva um por fora para consertar o encanamento que deveria ser consertado pela empresa estatal, então isso explica o PT. Se você já deu uma cerveja para o guarda, então não pode reclamar do conluio entre Odebrecht e PT, pois muda “somente” a escala.

Existe um fundo de verdade na podridão moral que assola o país como um todo, mas me pergunto a quem interessa comparar ladrão de galinha com mafioso que sequestrou a democracia do país… E fica faltando no “mecanismo” desenhado pelo brilhante policial o fator causal do troço: o poder concentrado no estado. Quando o círculo se fecha entre estatal, empreiteira, operador (doleiro) e agente público, fica faltando a conclusão de que é a existência da estatal que alimenta o circuito todo. Elementar, meu caro Watson!

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Privatizar todas as estatais, e lutar para combater a impunidade: essas são as soluções possíveis para mitigar a doença, para evitar a metástase do câncer. Quando o policial diz, então, que não há ideologia, que não tem essa coisa de “direita” ou “esquerda”, ele está reproduzindo o discurso “isentão” do próprio Padilha, ignorando que é a esquerda, ao pregar mais e mais estado, e depois ser suave com marginais, escolhendo “bandidos preferidos”, que permite esse quadro de corrupção. Menos estado e mais punição, com igualdade de todos perante as leis: eis a receita… liberal.

Mas tudo bem: ao contrário de Dilma, podemos entender que se trata de uma obra de ficção, com o intuito principal de entreter. E isso ela faz bem. “Casa de Papel”, que considero ainda melhor, também tem uma visão esquerdista se pensarmos que há alguma glamourização dos assaltantes, apesar de aprenderem duras lições, e que a própria ideia de que roubar a Casa da Moeda não significa tirar nada de ninguém é simplesmente ridícula e absurda, keynesiana ao extremo (o dinheiro não cai do além, e mais dinheiro circulando na economia do nada faz com o que o dinheiro dos outros perca valor).

Não precisamos enxergar tudo pela ótica da política ou da ideologia. As duas séries cumprem bem seu papel, que é prender o telespectador na trama, oferecer algumas horas de diversão. E claro: se ainda der para ver os petistas articulando a maior roubalheira da história com o cartel das empreiteiras, e tudo isso com Lula e Dilma liderando a máfia, melhor ainda! Mais divertido mesmo só na vida real, com os petistas batendo o pezinho e prometendo boicote. Os acionistas da Netflix devem estar desesperados…

Rodrigo Constantino