Participei do IV Fórum Liberdade e Democracia em Vitória nesta segunda, organizado pelo Líderes do Amanhã. O homenageado com o prêmio Liberdade para empresários foi Jayme Garfinkel, da companhia Porto Seguro. Em seu discurso de agradecimento, Jayme falou sobre a era da pós-verdade, termo que tem ganhado cada vez mais espaço nos debates. Lamentava que a hipocrisia fosse banalizada, aceita como parte indissociável da política moderna, citando o caso de Trump como exemplo.
No GLOBO de hoje há um artigo do jornalista Luiz Claudio Latgé exatamente sobre o mesmo assunto, inclusive buscando como fonte para o conceito o respeitado Dicionário de Oxford. Também cita como exemplos o Brexit e a vitória de Trump nas eleições americanas. E conclui:
Pela definição do dicionário, pós-verdade quer dizer “algo que denota circunstâncias nas quais fatos objetivos têm menos influência para definir a opinião pública do que o apelo à emoção ou crenças pessoais”. Em outros termos: a verdade perdeu o valor. Não nos guiamos mais pelos fatos. Mas pelo que escolhemos ou queremos acreditar que é a verdade.
A palavra se tornou recorrente depois da surpresa do Brexit e da eleição “sangrenta” nos Estados Unidos. Mas pode perfeitamente ser aplicada ao nosso momento político. Para o jornalismo, é uma má notícia. Embora seja quase folclórico em nossas redações citar algum dono de jornal (e os nomes variam) que teria por vício repetir diante de alguma noticia que não queria saber dos fatos, mas da versão que o jornal iria publicar.
O terreno da internet tem se revelado fértil para a propagação de mentiras — sempre interessadas —, trincheira dos haters. Levamos tanto tempo para estabelecer uma visão “científica” dos fatos, construir a isenção do jornalista, a independência editorial e, de repente, vemos que o debate político se dá entre “socos e pontapés”. A pós-verdade arrasta a política, o jornalismo, a justiça, a economia, a nossa vida pessoal…
Seria prudente resgatarmos o território da verdade. Substantivo feminino. Simples assim. Expressão dos fatos, e fatos podem ser verificados. Esse é o papel do jornalismo. Ou torcermos para que no ano que a palavra escolhida pelo Dicionário de Oxford não seja parecida com desastre.
O autor reconhece que o fenômeno não é novo, tem pelo menos uma década, mas que tem se manifestado mais recentemente. Talvez. Mas pergunto: só uma década? Então antes o mundo era guiado pela verdade, pelos fatos? O mundo político? Quando, exatamente, foi assim? Não vem desde os gregos o poder da retórica com os sofistas?
Obama, por algum acaso, venceu suas duas eleições focando em fatos e verdades, e não em discursos sensacionalistas e pura retórica? Bill Clinton era alguém honesto, que evitava narrativas falsas? Logo ele, que quase sofreu impeachment por perjúrio…
Entendo que as redes sociais possam potencializar mentiras, paranoias, narrativas fantásticas, pseudo-jornalismo. Tudo isso é verdade, é um fato. Mas não consigo aceitar a premissa de que antes era muito diferente. O que mudou? Arrisco uma resposta que não vai agradar tanto assim esses jornalistas, mas que parece ser… verdadeira.
Reparem que os exemplos mais citados são o Brexit e a vitória de Trump. Ora, justamente os resultados que mais desesperaram a imprensa? E aí começa a pipocar em toda mídia mainstream o papo de “pós-verdade”? Na era de Obama havia, então, só verdade? Claro que não. É simplesmente ridículo pensar isso, ainda mais de alguém que sempre se importou muito mais com a beleza das palavras do que com resultados concretos.
Se Trump criou um personagem para vencer as eleições, se é um hipócrita mesmo, então não seria, nesse aspecto, diferente de Obama ou Hillary Clinton. Esta, então, é tida como uma das mais mentirosas do país! Será que se ela tivesse vencido a imprensa estaria martelando tanto nessa questão de “pós-verdade”? Pouco provável.
Eis, então, minha tese: a elite poderosa e, principalmente, os jornalistas estão atônitos com a perda de sua influência e poder, algo que os fenômenos do Brexit e do Trump ilustram bem. E esse enfraquecimento tem ligação com as redes sociais sim, mas não porque elas mentem enquanto os jornais dizem a verdade, e sim porque a própria imprensa se tornou a maior mentirosa!
Isso ficou muito claro durante a eleição americana. Era pura torcida por Hillary, não jornalismo sério e buscando a isenção e a imparcialidade, os tais fatos e a verdade. Flavio Gordon deu um ótimo exemplo da confissão dessa postura por parte de alguns desses formadores de opinião:
No Manhattan Connection que se seguiu à vitória de Trump, o âncora Lucas Mendes afirmou que, se a eleição de Barack Obama em 2008 havia sido “um dos dias mais felizes” de sua vida – palavras textuais -, a eleição de Trump era “um dos mais tristes”.
Já no comentário à CBN em que prega o assassinato do presidente eleito dos EUA, Arnaldo Jabor afirma que a vitória de Trump o deixou “doente”.
Ora, está claro que esses caras não se comportam como jornalistas, mas como adolescentezinhas suscetíveis. Não falam da realidade, mas de seus estados emocionais histerioformes.
É esse “jornalismo” falso como uma nota de R$ 3 que tem feito com que tanta gente fuja para sites independentes. Claro que, em meio a trabalhos sérios, haverá muito lixo, muita porcaria, mentiras deslavadas, sedutoras teorias da conspiração. Mas por acaso tem sido diferente na imprensa? Por acaso a grande imprensa tem mesmo priorizado os fatos em vez da versão?
Rodrigo Constantino
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