Por João César de Melo, publicado pelo Instituto Liberal
O Partido dos Trabalhadores foi o responsável pela popularização do termo neoliberal, que nada mais é do que uma forma pejorativa de se referir a qualquer pessoa ou partido da esquerda que não tenha viés comunista. Se um governo de esquerda adota algumas medidas liberais, como privatizações, logo o taxam de neoliberal. Se Cristóvão Buarque vier a ser presidente da república e executar as medidas de abertura de mercado e de redução do estado que ele vem defendendo, também será taxado de neoliberal pela extrema-esquerda. Fernando Henrique Cardoso foi tachado de neoliberal por ter privatizado estatais.
Se FHC tivesse realmente alguma relação com o liberalismo, ele não teria quebrado a patente de remédios para criar os famosos genéricos nem criado tantas agências reguladoras de mercado. Como o próprio ex-presidente tucano confessou, as privatizações foram feitas por necessidade, não por convicção. Por ele, teria mantido todas aquelas empresas no colo do governo.
O PT empenhou-se em se comparar ao governo “neoliberal do PSDB” como forma de elogiar a si mesmo. Diminuiu o tom na medida em que os números da economia começaram a se mostrar piores do que os da época dos tucanos. O desmoronamento da narrativa petista pode ser resumido num único dado: A pior recessão da história, 8% de regressão econômica em apenas três anos.
A ironia é que o PT, de acordo com seus próprios critérios, impôs um governo neoliberal. Mais neoliberal do que o do PSDB. O neoliberalismo petista superou o neoliberalismo tucano por ter concedido muito mais dinheiro aos grandes empresários e por ter proporcionado muito mais lucro aos bancos privados.
Nos oito anos de governo tucano, os bancos lucraram R$ 30 bilhões. Com Lula, o lucro saltou para R$ 200 bilhões e com Dilma o lucro foi de quase R$ 180 bilhões. O BNDES emprestou R$ 38 bilhões no ano de 2002. Em 2014, esse valor foi de quase R$ 190 bilhões. Não por acaso, a maior parte desse dinheiro foi destinada às empresas indiciadas na Operação Lava Jato.
Dilma deu um upgrade no neoliberalismo. Privatizou mais. Entregou muito mais “riquezas nacionais” ao grande capital financeiro internacional. As concessões (eufemismo para privatizações) dos blocos do pré-sal, por exemplo, representaram quase o dobro das concessões realizadas desde 1999. Se não fosse o impeachment, Dilma estaria tentado cumprir seu plano de vender nada menos do que 40 empresas subsidiárias da Petrobrás.
No dia 9 de junho de 2015, ou seja, menos de um ano atrás, Dilma anunciou um megapacote de concessão de rodovias, ferrovias, portos e aeroportos sob o mesmo argumento de FHC: Necessidade. Devido a situação política, Dilma só conseguiu levar adiante as concessões de alguns aeroportos, mordendo sua própria língua ao utilizar o mesmo modelo de outorga utilizado por FHC. Dilma privatizou cinco grandes aeroportos e planejava privatizar todos os outros até 2018. Fernando Henrique Cardoso não privatizou nenhum.
Outro bom exemplo do neoliberalismo petista está no setor elétrico. Uma série de usinas hidrelétricas semiprivatizadas por FHC voltaram à mão do governo em 2015, final dos contratos de concessão. O que Dilma fez? Em 25 de novembro do mesmo ano, dia da prisão do senador petista Delcídio do Amaral, foram vendidas nada menos do que 29 dessas hidrelétricas a um grupo chinês.
Outra coisa que deve ser destacada é a recorrente citação a John Maynard Keynes como fundamentação teórica das políticas econômicas adotadas pelo PT. Líderes e militantes socialistas reverenciam o economista inglês, enfatizando seu prêmio Nobel, porque têm certeza de que a grande maioria das pessoas não sabe o que ele defendia. Em resumo, Keynes dizia que o governo deve ser a mola propulsora da economia através de uma forte política de oferta de crédito a bancos e grandes empresas, para estimular a produção e o consumo. O que ele não previu − e que seus seguidores não reconhecem − é que isso gera bolhas econômicas, concentração de renda, inflação e ineficiência/dependência dos setores beneficiados. A crise econômica de 2009, nos Estados Unidos, foi causada por essa política. Outro economista muito citado pelos socialistas é Paul Krugman, seguidor das ideias de Keynes, também laureado com um Nobel e que em 2014 disse, durante uma palestra, que a economia brasileira estava ótima.
Entre a ironia e a demagogia: Os socialistas estão sempre criticando as grandes corporações, mas defendem que os governos injetem dinheiro na economia, o que significa injetar dinheiro nas grandes corporações, quase sempre criando os “campões nacionais”, que não são nada menos do que megaempresas que crescem à custa de dinheiro público, vide Ambev e Friboi.
Há também a falácia dos avanços sociais petistas em contraponto ao “massacre da classe trabalhadora” promovido pelo PSDB. Uma falácia absorvida apenas por aqueles que acreditam que Bolsa Família tem um efeito melhor do que um emprego na vida das pessoas. O fato é que o festejado programa social do PT teve um aumento real de apenas 15% desde sua origem, e o aumento real do salário mínimo foi anulado pela diminuição da renda média do trabalhador, que caiu 5% apenas nos últimos 12 meses. A última correção da tabela de isentos do imposto de renda, anunciada pelo governo dias atrás, fará com que pessoas de classe média-baixa paguem mais impostos.
O PT também aumentou a carga tributária sobre medicamentos e alimentos, o que pesa proporcionalmente mais no bolso dos mais pobres.
O neoliberalismo petista é claramente visto no preço dos combustíveis. Pessoas mais pobres andam de ônibus, ou seja, estão sujeitas indiretamente ao preço do diesel, que em 2002 custava o equivalente a 39% do valor da gasolina e que em 2016 custa 70%. Isso significa que as pessoas mais ricas, que se deslocam em carros movidos a gasolina, pagam menos impostos.
As desgraças do neoliberalismo também recaem sobre os pequenos empresários, que sofrem proporcionalmente mais com a burocracia, com as leis trabalhistas, com a falta de segurança e com outros absurdos, como não ter direito de abater no IRPJ os gastos com vale-refeição dos funcionários, o que é permitido apenas às grandes empresas.
Mais: O programa Minha Casa Minha Vida é financiado em sua maior parte pelos recursos do FGTS, que são uma espécie de poupança compulsória com rendimento abaixo da inflação. Considerando que o FGTS retira proporcionalmente mais renda do trabalhador mais pobre, pergunto: Onde está a benevolência do governo?
Não podemos nos esquecer da mais ardilosa maquiagem estatística do PT, que alterou e congelou os valores dos critérios de identificação de classes sociais para, na medida em que o valor do salário mínimo fosse reajustado, se passasse a impressão de que dezenas de milhões de brasileiros alçaram milagrosamente da miséria para a classe média. Uma falsa impressão que durou até 2014, quando Rodolfo Hoffmann, da Esalq-USP, apresentou pesquisa que indica que a miséria vem aumentando, com mais de 2,3 milhões de brasileiros se declarando sem qualquer renda.
Conclusão: A utilização do termo neoliberal contra quem quer que seja deprecia os próprios governos do PT, pois os correlaciona aos governos de FHC e sob muitos aspectos à todos os anteriores.
Se tivesse havido um governo liberal nesse rebolante paraíso tropical, não haveria empresas estatais para serem espoliadas pelos políticos, nem agências reguladoras para formalizar cartéis, nem BNDES para enriquecer grandes empresários, nem políticas fiscais seletivas para tornar setores econômicos dependentes do governo.
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