Relendo meu Estrela Cadente, de 2005, chego ao capítulo sobre privatização. Já estava ali o grosso do que se transformaria, depois, em meu livro Privatize Já. E ao reler essas linhas fica claro por que a Petrobras não poderia acabar bem sob o comando petista. Vejam:
Se tem uma palavra que ainda é pecado nas rodas do PT, esta é “privatização”. Se for para empresa estrangeira então, é o caminho do inferno! A mentalidade petista ainda é carregada de um nacionalismo bobo, típico dos que odeiam os outros países mais do que amam o nosso. E deposita no Estado, apesar de suas constantes provas de ineficiência, a administração de empresas as quais estariam atendendo o consumidor muito melhor em um ambiente de competição de mercado, com gestão privada. Somente fatores dogmáticos de ideologias irracionais explicam algo tão sem sentido assim.
Vejamos o caso da Telebrás, onde o PT colocou-se totalmente contrário à privatização. Acusaram o governo FHC de ter vendido a empresa “a preço de banana”. Creio que teria que ser uma floresta de bananeiras, todas em ouro maciço, para tal crítica ter sentido. O leilão das empresas controladas pela Telebrás ocorreu no dia 29 de julho de 1998, e foram vendidos 51,8% das ações votantes que a União detinha, perfazendo uma participação média de 19,3% no capital total. Foram arrecadados aproximadamente R$ 22 bilhões, ou 19 bilhões de dólares na época. Cerca de 7 anos depois, quanto será que valeria esta participação estatal a preços de mercado? Menos de 6 bilhões de dólares! Na verdade, fazendo os ajustes necessários para todos os aumentos de capital que as subsidiárias realizaram, a participação do governo valeria algo em torno de 4 bilhões de dólares. Não me parece um mal negócio ter vendido a empresa por quase 20 bilhões!
O índice de ações da Bovespa valorizou-se, neste período, algo próximo de 20% em dólares, enquanto o valor das empresas do grupo Telebrás caiu quase 80%. Isso deveu-se basicamente às mudanças no setor de telecomunicações no mundo todo, com pesados investimentos em infraestrutura sem a contrapartida no retorno. Portanto, o timing de venda da Telebrás foi excelente, assim como o preço.
Fora isso, podemos destacar o pagamento de impostos das empresas privatizadas, que tiveram um tremendo ganho de eficiência e tamanho vis-à-vis a era estatal. As empresas capitalizadas investiram pesado, e ainda tiveram que cumprir metas rigorosas dos contratos. Somente de impostos sobre vendas, a arrecadação dos governos triplicou de 1998 para 2003, totalizando quase R$ 20 bilhões. Isso é uma montanha de dinheiro nas mãos do governo.
Falar da melhoria na qualidade do serviço então é covardia, para quem lembra do que era a Telebrás estatal. Acabaram as filas gigantescas apenas para conseguir uma linha, esta foi digitalizada, o atendimento ao cliente melhorou exponencialmente, milhares de telefones públicos foram instalados e uma variedade incrível de novos serviços foram ofertados por conta de uma competição maior e foco no lucro. Inúmeras promoções que beneficiam os consumidores apareceram. Temos mais de 65 milhões de celulares atualmente, incluindo diversas pessoas de classes mais baixas.
Em relação à privatização da Telebrás, portanto, não há nada de objetivo que alguém racional pode usar para criticar o governo FHC. Como mostrado acima, o valor arrecadado foi excelente, a qualidade do serviço melhorou de forma absurda e os impostos a mais gerados por termos uma gestão privada entupiram os cofres públicos. A crítica verdadeira pode e deve ser direcionada à questão do destino dado a essa magnitude de dinheiro. Fosse essa quantia utilizada para o abatimento de dívidas públicas, a economia anual poderia ser da ordem de 2 bilhões de dólares, supondo um custo médio de juros na faixa dos 10% ao ano, em dólar. Mas como FHC nunca foi liberal, apesar do rótulo colocado por petistas, ele não usou esse dinheiro para reduzir a dívida do governo, e sim para “gastos sociais”. A privatização em si não foi um erro, como pensam os petistas. Muito pelo contrário. Foi crucial para melhorarmos este setor tão importante para o país. O problema foi o governo não ter seguido na linha liberal depois da venda, não usando o dinheiro para a redução do endividamento público.
Outro exemplo claro que como a privatização foi importante para o país pode ser encontrado nas ferrovias. O primeiro trecho ferroviário que surgiu no Brasil partiu de uma iniciativa privada, de Irineu Evangelista de Souza, o Barão de Mauá. Em 1854, ele conseguiu uma concessão de Dom Pedro II para a construção e exploração de um trecho de interligação ferroviária do país. Mas os grandes problemas do setor começaram na era Vargas, que decretou medidas intervencionistas, como o controle de tarifas e a taxação da importação de trilhos. Para piorar a situação, o Plano Nacional de Viação, de 1944, lançava as ferrovias em uma concorrência desleal e artificial, bancada pelo Estado, que apostava pesado no transporte rodoviário, bem menos eficiente. Parece-me justo o título de “pai dos pobres” para Vargas, tamanha a quantidade de pobres que seu populismo pariu.
A malha ferroviária nacional foi reduzida de 37 mil para 29 mil quilômetros, tendo sido concedidos quase a totalidade deles, por meio de leilões realizados a partir de 1996, para concessão à iniciativa privada. Aparecia uma luz no fim do túnel. A melhora foi então dramática. Os acidentes caíram cerca de 60% desde então, enquanto o volume de carga transportada cresceu 34% de 1997 até 2003. A performance das empresas ferroviárias gerou uma arrecadação de R$ 2 bilhões para o Governo Federal no mesmo período, enquanto nos 10 anos que antecederam a desestatização, o setor acumulou um déficit para os cofres públicos de quase R$ 4 bilhões. Foram investidos cerca de R$ 6 bilhões desde 1997, e as perspectivas futuras são ainda melhores. Tudo graças à privatização que o PT tanto condena.
As estradas rodoviárias brasileiras estão caóticas, em um estado deplorável. Trechos estão literalmente caindo aos pedaços. Novamente, a privatização é a solução. No Brasil, apenas uns 10% da malha rodoviária são pavimentados, e destes, somente 6% estão nas mãos privadas. A lógica do setor privado é maximizar lucros, e isso exige um atendimento decente ao consumidor. A qualidade do serviço é que garante sua sobrevivência ao longo do tempo, diferente das estatais. E como são diretamente responsabilizadas pelos erros, são mais interessados na segurança do usuário. O governo arrecada uma verdadeira fortuna em IPVA, e vemos que isso não é transformado em boas estradas. Metade do valor arrecadado por este imposto vai para o Governo Federal, e a cidade de São Paulo sozinha arrecadou R$ 857 milhões apenas em janeiro de 2005. Essa montanha de dinheiro perde-se de alguma forma, enquanto os buracos nas estradas crescem sem parar, como um queijo suiço.
Já as estradas transferidas para o setor privado estão impecáveis. Muitos reclamam do preço do pedágio, mas esquecem a mudança na qualidade das estradas. E deveriam, na verdade, reclamar do IPVA pago, a fundo perdido, em vez do pedágio, que pode ser avaliado diretamente pela qualidade da estrada em questão. A CCR, empresa privada dona de algumas concessões, tem feito um bom trabalho em suas rodovias, sempre em busca do lucro. A empresa, que faturou R$ 1,5 bilhão em 2004, tem no seu controle o grupo português Brisa, assim como construtoras nacionais. Um terço do capital está nas mãos de acionistas minoritários. Todos buscando o lucro. E é essa lógica capitalista que faz com que a qualidade dessas estradas esteja infinitamente acima das estatais. Com tanta evidência assim, até o governo Lula, que sempre criticou privatizações, vai levar a leilão novos trechos rodoviários. O PT nunca gostou de privatizações, mas quando se é governo, a lógica acaba pesando mais que o discurso ideológico. E os “companheiros” de antiga caminhada política ficam perplexos, sem entender a mudança do governo Lula, que esquece seus discursos passados.
Por fim, vamos falar da Petrobrás, ícone dos “nacionalistas” que dispensam a lógica em nome da ideologia. A “Petrossauro” é tida como menina dos olhos pelos pseudo-nacionalistas. Embalados pela propaganda enganosa de “o petróleo é nosso”, consideram absurda a idéia de privatização da empresa. A mentalidade de que os recursos naturais garantem a riqueza do povo ajuda, ignorando o fato de um Japão ser super rico enquanto uma Nigéria é miserável. Aliás, a Venezuela produz mais de 3 milhões de barris diários do outro negro, que cotados a uns 50 dólares, geram uma receita em torno de 150 milhões de dólares por dia! Será que o povo miserável do país de Hugo Chavez deve comemorar que o “petróleo é deles”? Roberto Campos já dizia que “mais importante que as riquezas naturais são as riquezas artificiais da educação e tencologia”. Mas a palavra mágica que desperta fortes emoções é “estratégico”, considerando o petréleo como vital para o país.
Ora, claro que o petróleo é vital, mas sob hipótese alguma é necessário que ele seja explorado por uma estatal, ainda mais monopolista! Nada mais vital que a alimentação. Sem comida, morremos, e creio que ninguém consiga obter calorias degustando um “saboroso” galão de querosene. Entretanto, temos acesso fácil a diversos tipos de alimentos, sem que o governo tenha que controlar empresas do setor. Na verdade, é o contrário: quanto mais o governo controla, maior o risco de problemas. Cuba está aí para provar, com um setor de eletricidade caótico, obsoleto, deixando a população na completa escuridão. E a União Soviética de Stalin matou de fome milhões de pessoas quando o governo era monopolista no setor de alimentos, inclusive negando, por motivos ideológicos, ajuda oferecida pelos Estados Unidos.
A indústria de petróleo foi desenvolvida pelo setor privado, desde a primeira prospecção de Edwin Drake em 1859, na Pensilvânia. O rápido avanço deveu-se às forças ocultas da competição, a mão invisível do mercado. Enormes avanços rumo ao maior conforto do homem foram possíveis pelo progresso do setor. E no país onde este avanço foi maior, a empresa líder era privada. A Standard Oil americana acabou sendo dividida entre empresas menores, e dali surgiram Exxon, Mobil, Chevron, Amoco e Conoco. Os americanos são responsáveis por mais de 30% do consumo mundial de petróleo, e ninguém mais que eles pode então considerá-lo “estratégico”. Porém, temos lá um mercado privado competitivo, justamente por isso eficiente, bem diferente do caso de uma PDVSA na Venezuela, que é utilizada para fins políticos do populista Chavez.
A ausência de um controle privado acaba gerando mais corrupção, dado que os processos de contratação de serviços e compras de produtos ficam longe da escrutinação de sócios preocupados com o lucro. As amarras das leis para estatais, como a 8.666 de licitações, tiram a agilidade fundamental para a eficiência das empresas. O seu uso para fins políticos é a garantia de que a meritocracia será solapada, fato evidente quando analisamos o currículo do presidente da Petrobrás, nitidamente apontado para o cargo por objetivos partidários do PT. Não há um único argumento racional contra a privatização da Petrobrás, restando apenas a retórica do nacionalismo como desculpa para se perpetuar as mamatas das estatais. Sob o manto dos “interesses nacionais”, poucos políticos e empresários corruptos exploram o interesse verdadeiro dos cidadãos. Afinal, interesse nacional nada mais é que o somatório de interesses de cada indivíduo da nação. E para a grande maioria do povo, o que importa não é a nacionalidade do dono da empresa, mas sim a qualidade dos serviços prestados em relação ao preço pago. E isto é possível somente através da competição no livre mercado.
O “nosso” petróleo jorra rios de dinheiro, sendo que este percorre um longo caminho até chegar aos destinos certos. Claro que em cada esquina deixa um polpudo pedágio, conquistando uma legião de fiéis adoradores, que defendem com unhas e dentes a idéia de postergação ad infinitum da Petrobrás como empresa estatal. O fundo de pensão agradece, recebendo quantias relativas aos dividendos dos acionistas jamais vistas na esfera privada. Os membros poderosos dos sindicatos agradecem, protegendo seus empregos da livre competição. Os empresários corruptos agradecem, podendo fechar ótimos negócios com o “elefante” graças ao suborno, e não à eficiência dos serviços prestados. Artistas que cedem à doutrinação ideológica comandada pelo governo também agradecem, pois recebem contribuições impressionantes para o “avanço cultural” sem qualquer critério de mercado. Os políticos regozijam-se, podendo usar uma empresa de expressivo tamanho para leilão de cargos e votos.
Toda uma cadeia da felicidade é alimentada pela “Petrossauro”, cujas tetas sustentam inúmeros oportunistas. O único que perde mesmo, pagando elevados impostos perdidos nessa cadeia, e tendo ainda serviços piores com preços maiores, é o povo. Mas quem liga para o povo?
Rodrigo Constantino
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