O escritor Olavo de Carvalho foi a estrela da noite no jantar oferecido neste domingo na casa do embaixador brasileiro Sergio Amaral, ao presidente Jair Bolsonaro, em Washington. O presidente pediu um brinde em homenagem ao filósofo autodidata, mentor intelectual da família Bolsonaro e de diversos integrantes do governo. O ministro da Economia, Paulo Guedes, o classificou como “líder da revolução” liberal no Brasil.
— Você é o líder da revolução — disse Guedes, atribuindo a Carvalho um papel importante na divulgação de ideias liberais e na “revolução” liderada por Bolsonaro.
Segundo fontes próximas ao ministro da Economia, a frase de Guedes foi dita em um contexto em que ele contestava declarações feitas por Carvalho no sábado de que o governo Bolsonaro poderia acabar “em seis meses” , se o presidente continuasse “amarrado” por militares “com mentalidade golpista”.
No jantar, Guedes perguntou a Carvalho como ele, que sempre havia apoiado o presidente, pôde disparar contra o líder da revolução que inspirou. O ministro disse ainda aos presentes que considera que a democracia brasileira “está mais sólida do que nunca” por abranger todo o espectro político, com a emergência de uma aliança de centro-direita entre conservadores e liberais.
O que quis com essa fala o ministro Paulo Guedes? Só ele sabe, claro. Mas como alguém que o conhece faz tempo e trabalhou com ele por seis anos, arrisco um palpite. Guedes, da Escola de Chicago, é um pragmático, está de olho nos resultados. E sua prioridade agora é a reforma previdenciária.
Guedes não liga tanto para a “guerra cultural”. Tanto que ele, antes de chegar a Bolsonaro, estava liderando uma possível campanha de Luciano Huck. Para Guedes, Bolsonaro é um instrumento para as mudanças, alguém carismático, popular, que pode capitanear as reformas liberais econômicas.
Por isso ele tem falado tanto em aliança entre liberais e conservadores, unindo a turma de centro-direita em prol dessa agenda. Olavo de Carvalho deve ser visto por Guedes como um guru meio malucão, mas que exerce grande influência, não só no próprio presidente, em especial por meio de seus filhos, como na militância de direita nas redes sociais.
Ora, essa turma tem feito muito barulho contra o governo, acusando vários próximos ao presidente de traidores. Numa ótica tribal de guerra, há inimigos por toda parte, e só os “puristas” resistem na batalha entre o Bem e o Mal, o tudo ou nada.
Arrisco dizer que Guedes, sabendo da vaidade de Olavo, acende uma vela para o “guru” de olho em possível apoio para as reformas. Seria um custo baixo, em sua percepção, chama-lo de “líder da revolução” se isso se revertesse em apoio mais sólido para as reformas.
Pode até ser, mas julgo isso uma estratégia arriscada. É que Paulo Guedes não dá tanta importância para a guerra cultural, só que ela existe, e é preocupante um ícone liberal como ele depositar essa relevância toda em alguém como Olavo, que tem as piores opiniões possíveis sobre os liberais.
Não é baixo o custo de imagem para a direita, em especial a direita liberal, ter em Olavo um representante tão poderoso. O filósofo já deu várias demonstrações de sua visão antiliberal, e vem insuflando uma base jacobina intransigente, autoritária e fanática. A presença de Steve Bannon, o guru do “guru”, no evento expõe o risco em jogo: nem Trump quis manter seu estrategista por perto no poder.
Guedes pode estar de olho no curto prazo, tentando atrair Olavo e olavetes para um esforço maior pela reforma previdenciária. Mas receio que o tiro saia pela culatra. Primeiro, porque essa turma nem liga tanto para a reforma em si e a parte econômica, já que sua missão é “salvar a civilização ocidental dos comunistas”, todos aqueles que não são reacionários. Segundo, porque essa declaração infla mais ainda o ego do filósofo vaidoso, e ajuda a manchar a reputação da direita e dos liberais.
Olavo acha que os liberais são um bando de covardes e idiotas prontos para serem abusados pelos comunistas. O Brasil não precisa de uma revolução, e sim de reformas liberais. E muito menos de uma revolução liderada por um jacobino com perfil controlador e autoritário, que enxerga inimigos mortais por todo canto e lança mão de uma retórica tribal incompatível com a política democrática, aquela necessária para se aprovar as tais reformas liberais.
Foi, portanto, um erro de Paulo Guedes em minha opinião. Não vai ajudar nada na reforma. E vai custar caro à imagem dos liberais.
PS: Após a publicação do texto, o ministro Paulo Guedes esclareceu ao blog de José Fucs o que quis dizer, colocando sua fala dentro de um contexto mais abrangente:
O trecho que vazou para a imprensa dos comentários feitos pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, a respeito do escritor e pensador Olavo de Carvalho, reflete apenas em parte o que foi dito por ele no jantar oferecido ao presidente Jair Bolsonaro neste domingo, 17, em Washington, na casa do embaixador Sérgio Amaral.
“Perguntei porque o apoiador de primeira hora do Bolsonaro atirava no governo que ajudou a formar”, afirmou Guedes ao blog, via WhatsApp. “Eu disse que ele é o líder da revolução conservadora e liberais não são revolucionários. São evolucionistas.” E acrescentou: “Lembre-se de que há uma aliança de centro(liberal democratas) direita (conservadores)”.
Rodrigo Constantino
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