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Por Tiago Barreira, publicado pelo Instituto Liberal

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Os brasileiros comemoraram no último domingo a aprovação do processo de impeachment na Câmara dos Deputados. A presidente em exercício, Dilma Vana Rousseff, é a segunda chefe de estado impedida da história da República. A queda do PT e o eventual governo de salvação nacional, liderado pelo pemedebista Michel Temer, simboliza para muitos uma renovação da esperança. Também representa o pontapé inicial para uma série de medidas e reformas que visem a recuperação da credibilidade econômica da nação, como apontado pelo novo programa de reformas do PMDB Ponte para o Futuro.

Desde o advento da Nova República, em 1985, assistimos a hegemonia e revezamento de três partidos no poder: PMDB, PSDB e PT. Embora os três apresentem diferentes colorações ideológicas, alguns mais ou menos estatizantes, todos eles acordaram em construir uma agenda comum em favor do avanço de um welfare state europeu no Brasil. É exemplo notável desse consenso a assinatura da nova Constituição social de 1988. Demonstra-se inequivocamente que o consenso político brasileiro dos últimos 30 anos nunca deixou de ser a favor da ampliação de direitos sociais. Uma ampliação de direitos, ainda que às custas de maiores impostos e encargos e de um estado agigantado. Em 1985, a carga tributária era próxima de 22% do PIB, percentual que se elevaria para perto de 35% em 2015. Em contrapartida, sucessivos governos, seja Sarney, FHC ou Lula, ampliaram o estado de bem estar social, fornecendo uma generosa e cara cobertura de programas assistenciais aos mais pobres e necessitados. Seguro-desemprego, Sistema federal de saúde SUS, Bolsa Família, sistema previdenciário de repartição, política de valorização do salário mínimo, Minha Casa Minha Vida e FIES. Esse é o legado da Nova República.

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O que significa então a presidência de Michel Temer? O pemedebista, doutor em Direito constitucionalista, é autor de inúmeros livros sobre a Constituição social de 1988. Apoiou os governos FHC e Lula, além de ex-aliado de Dilma. Apesar de seu histórico situacionista, sua chegada ao poder simboliza o início de um novo ciclo na história republicana brasileira.

Temer é paulista. Empossado, será o primeiro presidente nascido em São Paulo desde Rodrigues Alves, em 1902. Trata-se de um simbolismo importantíssimo. Não podemos deixar de notar o papel histórico que as elites de São Paulo cumpriram na defesa e disseminação dos ideais liberais no país. Trata-se do estado do santista José Bonifácio de Andrada de Silva, dos presidentes liberais Prudente de Moraes e Campos Sales. A tradicional Faculdade de Direito do Largo de São Francisco (alma mater de Temer) é, desde os tempos do Império, berço histórico de renomados políticos e juristas de orientação liberal. Suas elites exerceram a liderança e hegemonia no país durante as primeiras décadas do século XX, dirigindo-o sob uma constituição liberal. Foram ostracizados do poder pela Revolução de 30, forjado por militares positivistas e oligarquias gaúchas e mineiras. Combateram o intervencionismo de Getúlio na Revolução de 32. O espírito libertário e empreendedor é uma constante nas elites paulistas.

Por sua vez, a ordem republicana antipaulista instaurada por Vargas em 1930 possui um ranço nitidamente antiliberal. O seu projeto de poder, protecionista, intervencionista e de tendências centralizadoras e fascistas, nos legou as atuais mazelas sociais e ineficiências econômicas. Não é de se espantar que esse projeto esteja representado na figura de Dilma Rousseff, uma brizolista convicta saída do PDT, herdeira de um getulismo em sua versão mais radical, trabalhista e sindical.

Em contraposição ao populismo de sua antecessora, Temer conhece mais do que qualquer um do papel central do empresariado no desenvolvimento e recuperação do país. Seu programa econômico, a Ponte para o Futuro, evidencia sua preocupação com os grandes gargalos institucionais enfrentados por aqueles que desejam empreender. Pode-se considerar também que a sua maior proximidade com a Fiesp e associações comerciais é inédita e única. Não se levanta dúvidas do viés pró-livre iniciativa que seu eventual governo assumiria.

Temer possui um grande desafio em sua gestão. Necessitam ser enfrentadas as mazelas econômicas e sociais. Trata-se de mazelas legadas não só pelos descalabros fiscais de seu governo antecessor, como também pelo estado de bem estar social agigantado que a Constituição de 88 estabeleceu. Um desemprego próximo aos 10% exige flexibilização na legislação trabalhista e maior liberdade de negociação entre patrão e empregado. Um estado com trajetória explosiva de crescimento de gastos e dívida necessita ter seu orçamento flexibilizado e desvinculado. Nesse sentido, Temer é um presidente simbólico em sua origem, sendo alheio ao berço varguista da qual grande parte dos políticos atuais são pertencentes. E isso vem sendo sinalizado pelas importantes propostas de reforma que podem destravar o Brasil da crise.

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Tiago Cabral Barreira é economista pela FGV-RJ e consultor.