Não é tema novo aqui no blog. O ativismo judicial é uma praga que vem se expandindo em nosso país, e o crescimento tem se acelerado nos últimos anos, com a crise entre os poderes e a perda de credibilidade tanto do Legislativo como do Executivo (em suas diferentes esferas). Em vez de fazer cumprir as leis, os juízes têm determinado as leis, o que é algo deveras perigoso. Em um importante editorial hoje, o Estadão coloca o dedo na ferida, usando como pano de fundo a decisão de um juiz de suspender o reajuste das tarifas de trem e metrô do governo Alckmin:
Impensável em outros tempos, tal ousadia judicial vem se tornando rotina nos dias de hoje. Membros do Poder Judiciário fazem vista grossa aos princípios comezinhos do Estado Democrático de Direito – entre eles, a necessária separação dos Poderes – e se julgam legitimados a administrar o Estado, a cidade, a vida dos cidadãos.
O desrespeito à separação dos Poderes não é um descumprimento de uma regra formal, como se fosse uma infração de menor gravidade. Quando um juiz arroga para si competências do Poder Executivo, ele está violando a própria democracia, já que as decisões do Executivo devem ser tomadas por quem a população, pelo voto direto, escolheu.
Ainda que a fundamentação da decisão esteja repleta de boas intenções, é de um autoritarismo vulgar a suspensão do aumento da tarifa simplesmente porque o magistrado não considerou “justo” o reajuste. Ora, a aprovação no concurso público não confere ao juiz a potestade de transformar seus critérios subjetivos em lei. Deve o magistrado cumprir e fazer cumprir a lei, ponto final. Transpor esse limite é manifestação inequívoca de desalinho com sua função institucional.
Como diriam nossos avós, cada macaco no seu galho! Cada poder tem suas funções, e essa mentalidade de que cabe ao juiz decidir com base naquilo que ele considera “justo” é extremamente autoritária e antidemocrática. Temos visto ministros do STF legislando sobre questões delicadas como o aborto ou o casamento gay, atropelando o Congresso, invadindo a seara do Legislativo. Isso não combina nada com uma República federativa.
O Estadão conclui: “Como é evidente, esse tipo de mentalidade não se coaduna com a democracia. Hoje são os juízes que abusam. Amanhã, como alertava Pedro Aleixo, será o guarda da esquina”. Sim, cada um se sentirá no direito de interpretar as leis como quiser, arrogando-se o poder de decidir com base em suas preferências subjetivas. Um dos pilares mais importantes dos países civilizados é justamente o império das leis.
Aristoteles entendia que é melhor ser governado por leis do que por homens, enquanto Platão tinha uma queda pelos “reis-filósofos”. Mas esse é o caminho do totalitarismo, enquanto aquele é o mecanismo adotado por povos livres. Vale a lei, não o que o juiz decide como “justo”, independentemente de suas atribuições legais. Montesquieu deve estar se revirando no túmulo neste momento. Cada macaco no seu galho!
Rodrigo Constantino
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