Por Bernardo Santoro, publicado pelo Instituto Liberal
Uma das letras de música mais fortes a ter sido escrita no Brasil é “Resto do Mundo”, do primeiro álbum de Gabriel, o Pensador. A música retrata a realidade cruel e desumana de um mendigo, sempre em primeira pessoa, ou seja, como se o mendigo estivesse cantando. O refrão, bastante chocante, repete a frase “eu queria morar numa favela”, pois, para quem não tem nenhum teto ou dignidade, viver em um lugar com um teto, ainda que apertado, e às vezes insalubre, é uma realidade melhor do que a rua insegura, fria e escura.
Lembrei dessa música ao ler a bizarra chamada do Presidente Barack Obama aos empreendedores cubanos, exortando-os a fazerem de Cuba uma economia pujante, o que é algo absolutamente inviável dentro do regime comunista da ilha. Mas, por incrível que pareça, já foi pior.
Há cerca de seis anos atrás o autoritário governo cubano passou a permitir que algumas atividades autônomas pudessem ser realizadas em modelo privado pelos cidadãos cubanos. Certamente que essa “liberdade” não foi concedida aos cubanos por uma questão de liberalidade ou até misericórdia por parte da alta burocracia do Partido Comunista Cubano, mas porque a economia cubana estava tão destruída que já não havia mais vida no hospedeiro do parasita estatal.
Então, com mínima liberdade, esses empreendedores passaram a conviver diariamente com regulamentos confusos e contraditórios, licenças precárias e de revogação constante, de fiscais que extorquem e, situação mais dramática, estabilização de um mercado negro onde contratos não possuem força para serem cumpridos ou cuja inadimplência é resolvida de maneira violenta.
Passei a buscar na internet relatos desses empreendedores, e alguns me deixaram particularmente comovidos. Frases como “se o governo tomasse só metade do meu lucro estaria ótimo”, ou “não me importaria com os regulamentos confusos desde que quando minha autorização saísse eu pudesse trabalhar em paz”, e a pior de todas, “se o preço de empreender é perder um pouco do lucro pro fiscal”, são ouvidas de maneira mais ou menos corriqueira.
De forma geral, mesmo com reclamações ao atual sistema extorsivo e asfixiante, o crescimento mínimo da economia, criada por essa migalha de liberdade, está gerando grande otimismo e felicidade entre os pobres cubanos.
Em suma, para os cubanos, tão desacostumados com a ideia de liberdade econômica e individual, um sistema de alta carga tributária, regulamentação pesada, burocracia inchada e fiscais corruptos, parece ser um verdadeiro paraíso. De certa forma, Cuba está, pouco a pouco, rumando a um modelo brasileiro de Estado, e as “pessoas-escravo” do sinhozinho Fidel acham isso o máximo.
Por outro lado, para a côrte dos Castro, a “liberdade econômica” brasileira provavelmente se mostrará mais lucrativa que a repressão cubana, como comprova o atual escândalo do petrolão, onde um operador de terceiro nível roubou, só para si, mais de 100 milhões de dólares, o que nos faz perguntar quanto que o alto escalão da república, que agora cai frente à investigação e julgamento dos heróis de Curitiba, efetivamente roubou.
Para que um governante possa roubar, ele deve deixar que a sua vítima crie primeiro o dinheiro a ser roubado, o que não ocorria em Cuba, mas passou a ocorrer. Os Castro devem ter aprendido bem essa lição com seus parceiros tupiniquins de Foro de São Paulo.
Isso não justifica, em absoluto, os abusos cometidos pelo Estado brasileiro contra a sua população em nenhum nível, apenas nos faz refletir ainda mais sobre a necessidade de lutarmos por cada vez menos Estado e mais liberdade na nossa terra.
Se o cubano hoje é o resto do mundo, com o sonho de morar numa “favela” brasileira, isso não muda o fato do nosso sistema legal e econômico continuar, objetivamente, dentro dessa analogia, a ser um lugar inóspito para o pleno desenvolvimento das capacidades e da individualidade humana. Precisamos, urgentemente, tirar tanto o cubano quanto o brasileiro desse inferno esquerdista, ainda que cada um vivencie sua experiência de maneira mais ou menos dura.