Por João Cesar de Melo, publicado pelo Instituto Liberal
O sucesso do socialismo no Vietnam se deve a uma coisa: NÃO foi aplicado.
Nas ruas das grandes cidades vê-se apenas capitalismo. Comércio. Milhões de pessoas comuns tentando atingir seus objetivos particulares. Milhares de empresas visando ao lucro. Publicidade por todos os lados. Grandes marcas internacionais, shoppings e bancos correlacionando-se com pequenos negócios, criando diversos níveis de renda, que criam diversos padrões de produção e de consumo, que dinamizam e fortalecem a economia como todo, distribuindo legitimamente a renda entre aqueles que trabalham.
Percebe-se até um nível de anarcocapitalismo. Os vietnamitas levam tudo o que se pode imaginar (incluindo a família inteira) na garupa de suas motocicletas e oferecem diversos serviços (de pequenos restaurantes a barbearias) nas calçadas, sem qualquer regulamentação ou repressão. Enquanto a esquerda ocidental cobra sistemas estatais de transporte coletivo, os vietnamitas exigem liberdade para usarem suas motinhos, pois são elas que lhes dão mobilidade a baixo custo.
O Vietnam é formalmente uma “república socialista” e, de fato, uma ditadura. Porém, os comunistas desse país tiveram um pouco de piedade com a população. Viram que se fizessem o que seus companheiros fizeram na União Soviética, na China, na Coreia, em Cuba, e no Camboja, os vietnamitas seriam levados a um sofrimento ainda maior do que o provocado pelas bombas americanas.
Iniciaram, na década de 1980, um amplo programa de liberalização da economia, de reconhecimento de propriedade privada e de privatizações, o que fez com que dezenas de milhões de pessoas, antes dependentes do estado e em estado de extrema miséria, pudessem prosperar por méritos próprios. Ainda que seja um país de economia muito controlada (posição 128° no ranking de liberdade econômica, onde o Brasil está na posição 150°), o Vietnam ilustra muito bem o gráfico que mostra a correlação entre liberdade econômica e prosperidade social. Nenhum governo teria condições de oferecer aos vietnamitas o que o mercado lhes oferece hoje, principalmente o orgulho de saberem que tudo o que consomem vem do trabalho, não do estado. Num país com renda per capita anual de apenas USD 6 mil, vemos pessoas pobres bem vestidas, que se refrescam à noite com ventiladores ou aparelhos de ar-condicionado, que guardam alimentos em geladeiras, que se iluminam com lâmpadas, que cruzam as cidades em motinhos e que levam nos bolsos telefones celulares tão modernos quanto os encontrados no Japão, nos Estados Unidos ou na Europa. São coisas assim – não discursos socialistas − que melhoram as vidas das pessoas. Visitei cidades pequenas e grandes. Cruzei o país de norte a sul de trem. Comi a comida deles nos restaurantes que eles frequentam. Passei dias inteiros andando nas calçadas. Só vi desenvolvimento baseado em comércio, em liberdade para viver, trabalhar e enriquecer.
Vi pobreza em alguns lugares, mas não miséria. Vi um país inteiro trabalhando duro sem qualquer ideologia carimbada na testa. As bandeiras comunistas que pontilham a paisagem das cidades mostram-se como alegorias de um carnaval antigo. A propaganda anti-americana provoca gargalhadas quando olhamos ao redor e vemos os comerciantes preferindo dólares a dongs (moeda local), o McDonald’s lotado de vietnamitas, um grande hotel chamado Times Square, compras sendo pagas com Visa e Master Card, pessoas comuns vestindo Tommy Hilfiger, calçando Nike, bebendo Coca Cola, todas conectadas entre si e com o mundo pelo Facebook e Whatsapp. O grande número de turistas no Vietnam também mostra o valor do capitalismo, pois só o mercado cria uma imensa massa de pessoas comuns, mas com vidas tão confortáveis, que podem simplesmente ficar sem trabalhar por algumas semanas para ficar gastando dinheiro com futilidades noutros países, do outro lado do mundo. Há muito pouco do socialismo que escutamos dos militantes do PSOL e do PT no socialismo vietnamita. Não se promove a ideologia de gênero.
Não se toleram a criminalidade, a vagabundagem, a delinquência e o consumo de drogas. Os valores da “família tradicional” baseada em pai, mãe e filhos obedientes é sagrado nesse país. A polícia e as forças armadas são extremamente respeitadas. Jovens vão para a escola para estudar, não para “conversar” sobre sexo. Apesar das desigualdades econômicas, não existe discurso de “reparação social”. As pessoas são motivadas a trabalhar, não a mendigar ajuda do governo. E a cereja do bolo: os vietnamitas pagam cerca de 14% de impostos, menos da metade do que pagam os brasileiros (34%). O socialismo no Vietnam reduziu-se ao culto à pátria (como qualquer nacionalismo de direita), ao partido comunista (o único existente) e ao líder (como os petistas fazem com Lula); e os socialistas reduziram-se a um pequeno grupo de pessoas que controlam a política e a cultura do país.
Enquanto viajava pelo Vietnam, acompanhei os últimos acontecimentos na Venezuela, onde o verdadeiro socialismo foi aplicado.
Cerca de 90% da população na miséria. Fronteiras fechadas à ajuda humanitária. O governo abrindo fogo contra a população que ele mesmo desarmou. O ditador provocando conflitos com países vizinhos e insistindo na velhíssima narrativa de que é vítima de um golpe promovido pelos capitalistas, de uma conspiração americana etc. Como se fosse pouca tragédia, ainda vemos a esquerda brasileira unida na defesa do ditador Nicolás Maduro.
O socialismo no Brasil é tão extremo que não cita o Vietnam como exemplo de “sucesso” porque, para os militantes, o que importa é a estética das ideias, não o resultado delas. O socialismo imposto na Venezuela é trágico na prática, mas é bonito no papel − e é isso o que vale! O socialismo no Vietnam foi corrompido por ideias “capitalistas burguesas neoliberais”, portanto, deve ser rejeitado – a despeito de promover o progresso social. A conclusão de sempre: o socialismo torna-se bom apenas quando deixa de sê-lo. A má notícia é que em algum momento os socialistas abandonarão definitivamente a agenda do controle econômico para obter do capitalismo todo o dinheiro que precisam para manter total controle em todas as outras áreas, instaurando ditaduras ainda mais fortes do que as que conhecemos hoje.
A China e o Vietnam já entenderam e estão fazendo isso.