Por Ianker Zimmer, publicado pelo Instituto Liberal
Desde o ano passado, um interessante filme alemão me tem feito refletir sobre um problema dos dias atuais: o totalitarismo. Lançado em agosto de 2009 no Brasil como uma espécie de remake do original de 1981, o longa “A Onda” se baseia em uma escola, na Alemanha. Na trama, o professor Rainer Wenger, interpretado por Jürgen Vogel, recebe a incumbência de ensinar alunos do ensino médio sobre autocracia (regime em que o governante tem poder absoluto e inquestionável). Apesar de sua resistência inicial, ele se vê obrigado a cumprir a ordem da escola e, como estratégia para exemplificar aos pupilos o funcionamento de uma autocracia, o mestre propõe uma dinâmica: formar um sistema autocrático dentro da sala de aula.
Para surpresa do professor, o resultado do experimento foi um (in) sucesso, pois, de maneira espantosa, os alunos apresentaram um comportamento semelhante ao dos seguidores de Adolf Hitler, sendo que, justamente, o motivo da dinâmica era mostrar a eles os perigos de regimes totalitários, como o nazista.
Sem qualquer questionamento à ideia de totalitarismo do docente, os jovens passaram a pensar e a agir de forma coletiva, seguindo e defendendo seu líder como alguém absoluto e se tornando agressivos e violentos. Pertencer ao grupo, defender as ideias do Führer e aniquilar qualquer um que não se sujeitasse ao movimento, denominado como “A Onda”, se tornou obsessão. Vou parar por aqui, para não oferecer spoilers (revelar o conteúdo do filme).
O âmago do filme é a maneira como os alunos, outrora irredutíveis na posição de desprezo pelo nazismo, se deixaram levar pela sedutora proposta totalitária imposta pelo líder (o professor). O sentimento de pertença é inerente ao homem, sabe-se – e essa teoria foi aprofundada em meados do século XX pelo psicólogo americano Abraham Maslov –, mas nos casos de grupos totalitários o pertencimento é obsessão, e é aí que se encontra o perigo!
O problema aumenta se considerarmos que alguns seres humanos tendem a ter submissão absoluta diante de ditadores. Essa característica, encontrada no comportamento da maioria dos grupos totalitários, pode ser explicada cientificamente pelo polêmico experimento do psicólogo Stanley Milgram.
Realizado em 1962 na prestigiada Universidade de Yale, nos Estados Unidos, o experimento de Milgram contou com a participação voluntária de 40 homens com idades entre 20 e 50 anos, com objetivo de testar sua submissão diante da imposição para agir com crueldade.
O experimento, na prática, era realizado com duplas como cobaias, sendo que um dos participantes atuava como “professor”, enquanto o outro fazia o papel de “aluno”. Cada vez que o “aluno” se equivocasse na resposta do proposto exercício de memorização, o “professor” recebia a ordem de aplicar choques, que iniciavam em 15 volts e chegavam (ou não), progressivamente, a 450 volts. Só que há uma curiosidade: o aluno, que ficava dentro de uma cabine sem que o “professor” o pudesse enxergar, era um figurante. Não havia choque, na realidade. Mas o professor (a cobaia real) não sabia disso.
Mesmo com os “alunos” gritando de “dor e de agonia”, apenas 35% dos professores interromperam o experimento. Os outros 65% seguiram até o fim, aplicando o choque de 450 volts. Esse experimento causou muita polêmica no meio científico; no entanto, ajudou a trazer respostas para entender o comportamento de grupos diante de regimes autocráticos, como o nazismo. Em 2015, virou filme, dirigido por Michael Almereyda. Está disponível no Netflix, inclusive.
Em tempos de guerra política e ideológica travada nas redes sociais, é essencial estar atento e identificar líderes autocráticos. Uma característica que todos eles têm em comum é não tolerar questionamentos. Isso, de um lado. De outro, é importante que os indivíduos jamais negociem princípios em troca do pertencimento, pois a internet está infestada de influenciadores picaretas tentando se dar bem em cima de pessoas com essa carência. Do contrário, com oferta e procura dos dois lados (pessoas carentes de pertencer e propensas a obedecer sem questionar e tiranetes totalitários querendo se dar bem em cima desses vulneráveis incautos), unem-se a fome e a vontade de comer e nascem os grupos totalitários.
Para arrematar, caro leitor, sugiro, como ferramenta de reflexão sobre alienação e autocracia, que assista aos dois filmes mencionados no texto.
*Ianker Zimmer é jornalista.
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