Em momentos de crise aguda, quando o “perigo vermelho” nos ronda com força total, evitar o “fogo amigo” é uma estratégia prudente. Ainda assim, trouxe aqui as críticas que o conservador Russell Kirk fez aos libertários doutrinários, e agora é o momento de trazer suas críticas aos neoconservadores, feitas logo depois, no capitulo seguinte do livro A política da prudência, publicado agora no Brasil pela É Realizações.
Acho importante para o debate, pois muitas vezes os conservadores que passei a chamar de “boa estirpe” são confundidos com os neoconservadores, com seguidores de George W. Bush ou algo do tipo. Esses não gozavam da estima de Russell Kirk. Abaixo, alguns trechos do capítulo:
Apresento-vos dois exemplos da rejeição aos neoconservadores que vejo hoje em dia, em vários lugares. O primeiro deles foi retirado de uma carta, recentemente recebida de um historiador altamente conceituado: “Cortei relações com a maioria (não todos) dos Konservatives, e especialmente com os neoconservadores, que são radicais e progressistas, egoístas e ignorantes, desejosos de cimentar todo o país e tornar o mundo um lugar seguro para a democracia, muito além dos sonhos de Woodrow Wilson (1856-1924)”, escreve-me. “Nenhum deles tem sentimentos pela pátria, pela sua preservação e pela imperiosa moderação de um patriotismo tradicional (distinto do nacionalismo)”.
O segundo caso do crescente desagrado com os neoconservadores vem de um afamado especialista em literatura: “É significativo que, quando os neocons desejam condenar algum conservador que solicitou um financiamento a uma fundação conservadora, dizem aos gestores da fundação que o tal conservador é um fascista”, afirma. “Acredito que os maiores inimigos do conservadorismo norte-americano não sejam os marxistas, nem os esquerdistas liberais do Partido Democrata, mas os neoconservadores, que têm sabotado o movimento internamente, e o exploram para propósitos egoístas”.
Tais neoconservadores muitas vezes são inteligentes; raramente sábios.
A ideologia, aventuro-me a vos recordar, é fanatismo político: na melhor das hipóteses, é a substituição de um pensamento político genuíno por slogans políticos.
[Michael] Novak reconhece um pouco da importância da religião em seu ensaio – convenientemente ignorando o fato desagradável de que todas as ideologias são antirreligiões, ou religiões invertidas.
Por intermédio da defesa vigorosa do capitalismo democrático e pela adesão doutrinária a essa ideologia, o sr. Novak está efetivamente dizendo que o marxismo será derrotado e será dada ao povo norte-americano a visão da perfeição social. Que caniço frágil para se ter à mão!
Ora, na verdade, nossa sociedade não é absolutamente um “sistema capitalista”, mas sim um complexo arranjo cultural e social, que abarca religião, moral, instituições política recebidas, cultura literária, uma economia competitiva, propriedade privada e muito mais.
Esperar que todo o mundo deva, e seja obrigado, a adotar instituições políticas características dos Estados Unidos – e que muitas vezes não funcionam muito bem mesmo dentro da própria casa – equivale a se permitir ter a mais irrealista das visões; ainda assim, essa parece ser exatamente a esperança e a expectativa de vários neoconservadores.
A palavra “democracia” passou a assemelhar-se a um chapéu velho que todo mundo usa e ninguém respeita. E, muitas vezes, as democracias não foram alianças perversas entre um demagogo de sucesso e uma multidão gananciosa?
A política externa de sucesso, tal como o êxito político em geral, é fruto da arte do possível – não da rigidez ideológica.
Pensara que os neoconservadores se iriam tornar os paladinos da diversidade no mundo; em vez de aspirarem a tornar real um mundo de uniformidade e enfadonha padronização, americanizado, industrializado, democratizado, logicalizado, maçante. Muitos deles são imperialistas culturais e econômicos.
Tais são os talentos dos neoconservadores em Washington, D.C. nos últimos oito anos – criatura inteligentes, comprometidas com uma ideologia, e não muito honestos na conquista dos próprios objetivos.
Rodrigo Constantino
Inteligência americana pode ter colaborado com governo brasileiro em casos de censura no Brasil
Lula encontra brecha na catástrofe gaúcha e mira nas eleições de 2026
Barroso adota “política do pensamento” e reclama de liberdade de expressão na internet
Paulo Pimenta: O Salvador Apolítico das Enchentes no RS