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Os pobres como mascotes da elite entediada

Sartre, baba-ovo de tiranos assassinos

Lendo a breve entrevista do documentarista e jornalista francês Christian Siquier no GLOBO, o trecho final chamou minha atenção. Diz ele:

O que, no Brasil, interessa aos estrangeiros?

Até pouco tempo atrás, ninguém queria matar a boa imagem do Brasil e de Lula. Ofereci reportagens sobre o mensalão. Ninguém queria saber. É igual a Cuba no início: a França não criticava Fidel Castro, depois mudou. Você tem que ter um mito, uma esperança, e o Brasil representava isso.

A confissão é muito interessante, pois vem de um francês que vive aqui desde 1994. Retrata muito bem a postura da elite parisiense em particular, e de boa parte das nossas elites também. Esse foi o tema central do meu livro Esquerda Caviar, em que tento dissecar esse fenômeno estranho, porém comum: as elites que vivem no conforto capitalista, mas adoram adorar regimes socialistas autoritários à distância. Escrevi:

Não podemos excluir ainda o puro tédio como imã para a esquerda caviar. Vivendo vidas seguras e confortáveis, fúteis e vazias, a fina flor da esquerda abraça ideias revolucionárias ou exóticas apenas para afastar de si a angústia de suas existências. A sociedade da abundância ajuda a parir os radicais chiques. São os “senhorzinhos satisfeitos” de que falava Ortega y Gasset.

Normalmente incapazes de se enquadrar ao sistema, por considerarem aquelas pessoas de classe média “felizes” com suas distrações burguesas, tais como novelas e futebol, um bando de alienados, esses membros da elite entediada partem para aventuras mais radicais. Eles precisam “cair fora” (drop out) da sociedade, buscar alternativas que ofereçam um novo sentido a suas vidas.

Desde Rousseau existe essa busca por uma fuga romântica. O “bom selvagem” precisa existir, mesmo que tenhamos de fechar os olhos para a realidade. Somente assim vamos manter a chama da esperança com um mundo ideal acesa. Os pobres latino-americanos, os indígenas, os africanos, todos serão cobaias de nossos experimentos sociais em prol do “mundo melhor”, enquanto continuamos no conforto capitalista. Em outro trecho, expliquei:

Dessa forma, a esquerda caviar, vivendo no conforto ocidental, prega as maravilhas da vida selvagem na África, ou os encantos do islã, ou ainda a ligação com a natureza dos índios. Claro, o que deseja é transformar tais bolsões do atraso em mascotes, não percebendo a arrogância em se tratar culturas menos avançadas como animais de estimação. Mas vale tudo para condenar o próprio Ocidente e idealizar o “bom selvagem”.

Os “zoológicos” humanos são defendidos pela esquerda caviar em nome da justiça e da diversidade. Ao condenar índios ao confinamento indígena, a esquerda caviar os impede de conhecer inúmeras inovações que poderiam melhorar absurdamente suas vidas. Os índios já desfrutam de quase 13% do território nacional, mas a esquerda caviar não acha isso suficiente para aliviar seu sentimento de culpa. É preciso mais!

Os franceses arrogantes da elite parisiense sempre gostaram de parir ideologias e utopias do conforto de seus escritórios, cujas cobaias estariam bem longe. Sartre visitou Fidel Castro para ver in loco as “maravilhas” do socialismo, e depois retornou para Paris. Deu aula para Pol-Pot também, o genocida do Khmer Vermelho que exterminou um terço do povo no Camboja.

As celebridades de Hollywood adoram Che e Fidel, mas continuam vivendo em Los Angeles, enquanto o povo cubano “paga o pato” da miséria e escravidão inexoráveis no socialismo. Os nossos atores globais adoram Cuba, os black blocs, o MST, o movimento indígena, as favelas, todas as “minorias” que servem como mascotes para seu tédio, sua alienação, sua culpa, mas não abrem mão daquilo que só o consumismo burguês no regime capitalista tem a oferecer: milionários cachês de publicidade.

No livro, dei a seguinte sugestão a esses membros da elite entediada, que endosso aqui para finalizar:

Muito sangue inocente seria poupado se esses intelectuais canalizassem sua frustração com a realidade de sua sociedade imperfeita para outras esferas além da política. Como alertou Michael Oakeshott em seu ensaio Ser conservador, “a união entre sonhos e governo gera tirania”. Esses sonhadores políticos deveriam anotar as palavras do escritor Mario Vargas Llosa e colocá-las no espelho do banheiro, para lembrar do alerta diariamente:

Devemos buscar a perfeição na criação, na vocação, no amor, no prazer. Mas tudo isso no campo individual. No coletivo, não devemos tentar trazer a felicidade para toda a sociedade. O paraíso não é igual para todos.

Rodrigo Constantino

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