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Confesso ter alguma implicância com George Clooney, pois seus filmes costumam colocar os Estados Unidos em maus lençóis, vendendo um antiamericanismo barato mundo afora (e dentro dos Estados Unidos também, pois muitos americanos adoram cuspir em sua nação, o que explica o sucesso de um embusteiro feito Michael Moore). Por isso protelei assistir “The Monuments Men” (“Caçadores de Obras-Primas”), em que Clooney não só atua, como dirige e produz.

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Grande erro. O filme é muito bom. E a mensagem é muito bonita. Mais do que bonita: importante, fundamental. Em meio à guerra com nazistas, os bárbaros, Roosevelt aprova uma expedição de especialistas em arte para tentar preservar o legado da civilização ocidental. Os improváveis soldados partem para o campo de batalha para proteger aquilo que possui valor universal e atemporal em meio aos escombros e bombas. O filme é baseado em fatos reais.

Há um claro dilema em jogo: os sargentos não querem perder uma única vida de um jovem soldado para preservar uma igreja velha qualquer, uma escultura feita séculos atrás. Mas aqueles homens da arte sabem que é esse legado que muitas vezes justifica uma luta até a morte. Como disse Martin Luther King Jr., “Se você não descobre uma causa pela qual valha a pena morrer, é porque você não está pronto para viver”.

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Aqueles bravos soldados da civilização estavam dispostos a morrer pela história ocidental, pelo que transcende o mero aqui e agora, pelas obras de arte eternizadas pelas mãos de gênios clássicos como Michelangelo, Vermeer e tantos outros. Vale a pena arriscar a vida para salvar A Madona de Bruges? A resposta vem do próprio líder da expedição, personagem de George Clooney: sim!

Além disso, o filme, tendo de retratar a realidade, pinta os soviéticos como bárbaros também, pois não tinham o mesmo apreço pela arte e o legado da civilização ocidental. Quando eram eles que encontravam as obras escondidas pelos nazistas, simplesmente as roubavam. Uma cena marcante do filme, com toque bastante patriótico, ocorre quando os nossos heróis conseguem escapar no último minuto de uma mina de carvão com várias obras de arte, deixando para os russos apenas uma bandeira dos Estados Unidos estampada na entrada.

O que os americanos fizeram com toda essa arte e com o ouro recuperado? Devolveram aos seus donos sempre que isso foi possível. Que outro povo possui tal valor enraizado em sua cultura dessa forma? Que outra civilização dá tanto peso assim ao conceito de propriedade privada? Mas ainda temos que aturar os relativistas culturais dizendo que existem culturas “apenas diferentes”, e também gente que ignora a existência de um lado certo e outro errado na Guerra Fria, como se os Estados Unidos não estivessem lutando pela liberdade e os soviéticos pela barbárie, tal como os nazistas antes.

Escrevi um texto que julgo, modéstia às favas, um dos meus melhores, justamente sobre essa luta individual para preservar aquilo que sustenta nossa história, nosso legado, nossa civilização. O problema é que a ameaça nem sempre vem de fora dos portões; muitas vezes os bárbaros estão dentro deles, na própria civilização mais avançada que pretendem destruir. São os niilistas, e suas armas nem sempre precisam ser violentas, ao menos não do ponto de vista de agressão física.

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Basta pensar em boa parte da arte contemporânea e pós-moderna que mais parece uma artilharia pesada contra tudo aquilo que tem verdadeiro valor artístico para a civilização. Alguém consegue imaginar soldados arriscando suas vidas para salvar latas de fezes, tijolos empilhados, rabiscos sem sentido ou bichos em formol? Parece pouco provável. Bem mais realista, como de fato aconteceu, seria alguém jogar fora tais “obras de arte” como se lixo fossem.

Se tudo é arte, então nada é arte. E ao chamar qualquer porcaria de arte, os próprios ocidentais conseguiram aquilo que os nazistas não tiveram sucesso: destruir o legado artístico clássico da civilização. Ao tentar equiparar Michelangelo e Damien Hirst, ao igualar Sandro Botticelli e Roy Lichtenstein, essa gente acabou cuspindo naquilo que era atemporal, pois tentava justamente exprimir o eterno, a beleza, o transcendental, contra tudo que é efêmero, passageiro, temporário.

Precisamos de mais soldados da civilização, como aqueles retratados no filme de George Clooney. Não precisam, desta vez, pegar em armas e matar bárbaros. Basta terem a coragem de lutar no campo das ideias contra todos aqueles relativistas que tentam destruir o legado de nossa civilização.

Rodrigo Constantino