Por acaso vi ontem o último capítulo de “Nada será como antes”, que conta a história do começo da televisão brasileira. Não era minha intenção inicial, pois queria ver mais um capítulo de “Black Mirror” na Netflix, que tenho achado deveras instigante, mas acabei demorando para trocar o canal e fui me interessando pela série da GLOBO. Não por considerá-la realmente boa, e sim por curiosidade antropológica: até onde iria a agenda “progressista” dos autores?
Tinha lido comentários do Facebook sobre a fala de Fátima Bernardes no programa “Encontro” acerca do “triângulo amoroso” da série, que seria “apenas outra forma de amor”. Mesmo para os padrões da GLOBO tive dificuldade em acreditar, uma vez que estamos falando de dois irmãos que não só “se pegam” como dividem a mesma mulher, personagem de Bruna Marquezine. Fui checar e ela disse isso mesmo.
Não seria, segundo Fátima Bernardes, uma coisa fruto do mundo moderno, pois o “amor de todas as formas” houve desde sempre. É verdade que a perversão sempre existiu, e basta ler Sade para ver como nossos autores “revolucionários” são pudicos no fundo. Mas eis a diferença: antes a perversão era tida como… perversão, desvio, doença. Hoje ela é tida como “outra forma de amor”, mesmo quando envolve incesto. Não há mais tabu para os “progressistas”? Será que Fátima ficaria feliz se seus filhos resolvessem se “amar” dessa forma?
E esse é o tema aqui: a própria série conta, pelo personagem de Murilo Benício, qual a estratégia em jogo. Não adianta jogar a cena chocante no ar, pois o choque poderia ser muito grande e gerar reação negativa. É preciso criar um ambiente para torná-la aceitável, quase natural. No caso do beijo entre um negro e uma branca, antes era necessário criar a atmosfera de amor convincente entre ambos, para depois soltar a cena do beijo, que seria amplamente aceito pelo público.
Claro que quando pensamos num simples beijo “interracial” a coisa fica óbvia, até bonita: como rejeitar tal progresso? Mas daí para o que vemos hoje há um verdadeiro salto quântico, e essa é a pegadinha dos “progressistas”. Se você condena as constantes quebras de tabus, então você só pode ser um reacionário, um preconceituoso, alguém que antigamente seria contrário ao simples beijo “interracial”.
Como assim, você não é a favor de cenas explícitas de sexo entre dois homens na novela das oito? Como assim, você acha errado tratar com naturalidade um irmão e uma irmã que transam e ainda incluem uma terceira pessoa no bacanal familiar? Você é um reacionário preconceituoso, por acaso? Você seria contra um beijo de negro com branca antigamente? E assim segue a armadilha “progressista” que não enxerga limite algum para sua “arte”, sua agenda. Ao contrário: o que não chocar bastante não serve. O próprio critério passa a ser esse: é preciso chocar, “causar”.
Como vimos no clip novo de Clarice Falcão, ex-mulher de Gregorio Duviver, lançado hoje e imediatamente banido do YouTube por conter (apenas) imagens de genitálias. Era essa sua intenção, como ela mesma declarou antes. Ela sabia que o vídeo seria suspenso, pois agride as normas do YouTube, e ela queria exatamente isso. Para depois, claro, bancar a vítima de “censura”. O mundo não estaria pronto para sua “arte”. Comentei na minha página:
Clarice Falcão tentou “causar” com nudez explícita em seu novo clip? Mas de que outra forma ela poderia chamar a atenção das pessoas? Com seu “talento”? Não entendo a surpresa das pessoas. E só para lembrar: ela foi casada com Gregorio Duvivier. Com o Greg, for Christ sake! Alguém acha que uma pessoa decente aguentaria um sujeito desses por tanto tempo?
Cazuza e Renato Russo eram homossexuais, mas nunca precisaram apelar para fazer sucesso. Tinham talento, e são lembrados hoje por sua arte, suas músicas, não por terem transformado seu ânus ou seu pênis em instrumento político e ideológico. O apelo desesperado de gente sem talento não é novidade. A novidade está no alcance dessa turma pelas redes sociais e no fato de muitos considerarem suas presepadas como “arte”.
A “arte pós-moderna” permitiu que gente medíocre se vendesse como artista sem criar nada louvável que preste. A subjetividade excessiva e o relativismo moral e estético servem como alavanca para que os piores sejam elevados ao rótulo de artistas. Como no passado verdadeiros artistas, como Picasso, chocaram no começo com seus trabalhos, então se conclui que tudo aquilo que choca hoje é bom, mas ainda não foi reconhecido. Uma falácia de non sequitur evidente.
E por isso é preciso chocar, e chocar, e chocar. Quebrar cada tabu remanescente em nome do “progresso”. Até chegarmos ao ponto em que não haverá mais diferença essencial entre homens e cachorros. Vamos comer a própria mãe, as irmãs e até os irmãos, e cagar em praça pública depois, já que banheiro particular será sinônimo de um pudor ultrapassado, resquício da era burguesa preconceituosa. Seremos mais naturais, como os outros animais. Sim, chegaremos à defesa até da zoofilia um dia, podem apostar.
O Projaquistão, nome impagável que Alexandre Borges cunhou para se referir a esse mundo paralelo dos artistas do Projac, vive numa bolha particular, onde o mais importante é desafiar todos os valores e tradições, quebrar todos os tabus, chocar. Eles sinceramente se enxergam como ungidos que precisam abrir os olhos das pessoas comuns, alienadas, tacanhas. São os guias para um mundo livre de qualquer preconceito, onde todos vão gozar de uma felicidade plena.
Felicidade esta que curiosamente toda a “liberdade sexual” (i.e., libertinagem) promovida desde os anos 1960 ainda não trouxe, inclusive e principalmente para eles mesmos, em troca-troca incessante de parceiros, mergulhados muitas vezes em drogas para fugir da triste realidade, de suas famílias disfuncionais e despedaçadas. Mas, diante de um precipício, eles querem mais. Vamos dar um passo para frente, quebrar mais algum tabu, avançar rumo ao desconhecido, ainda que seja um abismo, pois a vida real é insuportável para eles.
E por isso que nas cenas finais de “Nada será como antes” um gay encontrou uma noiva “esclarecida”, com cabeça bem aberta (a ponto de o cérebro ter caído), que não via problema algum no fato não só do noivo ser bissexual, como na criação de um novo triângulo amoroso. Ela não era “ciumenta”. E a orgia, que sem dúvida existe desde sempre, transforma-se assim em “amor”, pois o “poliamor” é a coisa mais linda e moderninha do mundo, que só mesmo um reacionário obscuro condenaria.
Os ungidos do Projaquistão precisam abrir nossos olhos, romper barreiras morais, quebrar tabus, para que todo mundo faça o que der na telha, dando vazão aos apetites e fetiches sexuais mais “bizarros”, e possam depois chamar isso de “amor”. Nada será como antes. Só não quer dizer que será melhor…
PS1: Se você vê as cenas do “triângulo amoroso” como uma “nova forma de amor” e encara tudo na maior naturalidade, ainda por cima justificando o não-julgamento com base no “liberalismo”, saiba que já foi vítima da lavagem cerebral insidiosa dessa turma e nem se deu conta. Recomendo meu curso “Civilização em Declínio“, em que explico melhor como o liberalismo se transformou, em alguns casos, nesse “liberalismo” que no fundo é apenas libertinagem.
PS2: Sobre o clip de Clarice Falcão, que dominou as redes sociais hoje, recomendo o excelente artigo de Tom Martins no Senso Incomum. Como se diz hoje em dia, ele lacrou!
Rodrigo Constantino